ANTES DE LER É BOM SABER...

Contato (Whatsapp) 84.99903.6081 - e-mail: luiscarlosfreire.freire@yahoo.com. Ou pelo formulário no próprio blog. Este blog, criado em 2009, é um espaço intelectual, dedicado à reflexão e à divulgação de estudos sobre Nísia Floresta Brasileira Augusta, sem caráter jornalístico. Luís Carlos Freire é bisneto de Maria Clara de Magalhães Peixoto Fontoura (*1861 +1950 ), bisneta de Francisca Clara Freire do Revoredo (1760–1840), irmã da mãe de Nísia Floresta (1810-1885, Antônia Clara Freire do Revoredo - 1780-1855). Por meio desta linha de descendência, Luís Carlos Freire mantém um vínculo sanguíneo direto com a família de Nísia Floresta, reforçando seu compromisso pessoal e intelectual com a memória da escritora. (Fonte: "Os Troncos de Goianinha", de Ormuz Barbalho, diretor do IHGRN; disponível no Museu Nísia Floresta, RN.) Luís Carlos Freire é estudioso da obra de Nísia Floresta e membro de importantes instituições culturais e científicas, como a Comissão Norte-Riograndense de Folclore, a Sociedade Científica de Estudos da Arte e a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência. Os textos também têm cunho etnográfico, etnológico e filológico, estudos lexicográficos e históricos, pesquisas sobre cultura popular, linguística regional e literatura, muitos deles publicados em congressos, anais acadêmicos e neste blog. O blog reúne estudos inéditos e pesquisas aprofundadas sobre Nísia Floresta, o município homônimo, lendas, tradições, crônicas, poesias, fotografias e documentos históricos, tornando-se uma referência confiável para o conhecimento cultural e histórico do Rio Grande do Norte. Proteção de direitos autorais: Os conteúdos são de propriedade exclusiva do autor. Não é permitida a reprodução integral ou parcial sem autorização prévia, exceto com citação da fonte. A violação de direitos autorais estará sujeita às penalidades previstas em lei. Observação: comentários só serão publicados se contiverem nome completo, e-mail e telefone.

terça-feira, 2 de dezembro de 2025

EMPATIA E ALTRUÍSMO ENJAULADOS ANTE O ÓDIO SOLTO...


O caso traumático do jovem Gerson de Melo Machado, de 19 anos, apelidado de “Vaqueirinho de Mangabeira” – que invadiu a área de uma leoa, foi atacado e morto por ela no último domingo – impactou o Brasil. As redes sociais ainda estão sob os efeitos disso. Mas o que me faz escrever é a perplexidade diante dos comentários assustadores que tenho lido no Facebook e no Instagram sobre essa fatalidade. Não sei como há tanta gente má no nosso país. Antes, eu pensava que a pandemia da Covid-19 tornaria as pessoas mais humanizadas, mas me enganei. Não sei o que houve, pois, se o demônio é tudo isso que dizem, ele encontrou incontáveis clones no nosso país. Haja gente má.

Esse rapaz era esquizofrênico e tinha deficiência mental. Funcionários públicos que lidavam com ele são unânimes em dizer que ele era uma criança de cinco anos em um corpo de dezenove. A mãe e a avó são esquizofrênicas. Gerson nasceu em um lar de extrema pobreza, vivia entre a rua e o seu barraco, passou muita fome, apanhou muito na rua e em casa.

É certo que, uma semana antes de sua morte, ele havia sido preso duas vezes em menos de uma hora: a primeira por tentar danificar dois caixas eletrônicos de um banco; a segunda, por arremessar um paralelepípedo e quebrar o vidro de uma viatura da polícia. Também há registro de que, em janeiro de 2025, ele danificou o portão de um centro de ressocialização juvenil (um antigo espaço em que esteve internado), o que resultou em intervenção policial. O diretor de uma penitenciária local declarou à imprensa que “Vaqueirinho não conheceu outra vida senão a prisão”, com dez apreensões na adolescência e seis na maioridade - o que soma as “16 passagens”.

Particularmente, acho que todo marginal deve ser julgado e punido na forma da legislação vigente, mas não há como classificar como marginal uma pessoa cuja mente, segundo as próprias autoridades, equivalia à cognição de uma criança de cinco anos. Quem, em sã consciência, atiraria um paralelepípedo em um caixa eletrônico e outro no carro da polícia? Na verdade, Gerson foi aquela criança que nasceu e cresceu ouvindo da mãe e dos parentes as frases típicas desses lares miseráveis, como: “ele é doente”, “ele é doido”, “ele tem problemas mentais”, “ele não sabe nada”, “ele não aprende”, “ele não evolui”, entre outras sentenças afins. Gerson não foi provocado a evoluir cognitivamente; foi provocado a pensar que era burro, que não aprendia, que era doido e tudo mais.

João Pessoa inteira conhecia o “Vaqueirinho de Mangabeira”. Era uma figura popular. Para muitos, era um brinquedo, uma diversão, objeto de chacota. Obviamente, havia meia dúzia de pessoas que, por empatia e altruísmo, o tratavam bem, o alimentavam, conversavam com respeito, davam conselhos e o ajudavam. Mas a maioria o via como os reis viam os bobos da corte: um brinquedo que servia de mangação (como diz o povo nordestino).

Esse rapaz vivia atormentado pelo lar desajustado, pela falta de alimentação adequada e, pior, pelas reações da esquizofrenia. É quase certo que ele foi a esse encontro com a leoa tomado pelas vozes da própria doença. Ele dizia que seu sonho era ir para a Àfrica domar leões.

Uma funcionária pública do Conselho Tutelar - uma das poucas pessoas que eram seu porto seguro - declarou que, desde criança, sua vida foi pautada por desajustes e crises decorrentes da esquizofrenia. Sua realidade era tão conhecida que há vídeos dele na internet, registrados em situações diversas e pitorescas nas ruas de João Pessoa, inclusive quando ainda criança. Todos sabiam da realidade do Vaqueirinho de Mangabeira, mas ele era invisível quando o assunto era tratamento médico, socialização e respeito por parte das pessoas comuns. Agora me recordo de quando Michael Jackson gravou um clipe no Rio de Janeiro e ouviu de uma moradora a frase providencial que roubou a cena: “Michael, eles não ligam pra gente!”. E Michael deixou a frase no clipe. Isso é um clássico. Quem “ligou” para o Vaqueirinho da Mangabeira? NINGUÉM!

Num país em que homens que ocupam respeitáveis postos roubam milhões em joias e fazem rachadinhas milionárias, num país em que depredam o patrimônio histórico da Capital Federal, como chamar de bandido uma criatura que tem a mente igual à de uma criança de cinco anos? O que o Vaqueirinho roubou? NADA! Como comparar a destruição de Brasília com a avaria causada em um carro da polícia e em um caixa eletrônico por uma mente infantil, cujos “crimes” se deram por desajustes mentais e jamais por má índole ou instinto criminoso?

Ora! O que vejo é falta de empatia e altruísmo. Quase todos preocupados com a leoa, aplaudindo a morte de um ser humano - quase uma criança - como faziam no Coliseu, onde pessoas eram atiradas aos leões como entretenimento. Se esse jovem estivesse normal, não faria tamanha insanidade. O animal merece cuidado, sim; afinal, nasceu ali, era o seu habitat. Ela matou o Vaqueirinho por instinto. Estrangulou, não o predou. Mas só se viam execrações por parte de seres humanos cujos feitos não os diferenciam do que sabemos sobre o demônio. Aquele menino poderia ser seu filho, seu irmão, seu parente... e aí? E se fosse? Você aplaudiria?

Qualquer pessoa pode nascer com esquizofrenia ou com deficiência mental. Esse rapaz não teve culpa de nada - nem dos “crimes” que praticou, nem da invasão ao espaço da leoa. Sua morte foi a culminância de uma longa história: um Estado omisso, moroso e burocrático, e uma sociedade má, que zomba dos outros, que não se coloca no lugar dos outros e que não é capaz de - mesmo podendo - ajudar alguém. Essas pessoas são más. São hipócritas. Não têm nada de cristãs, pois um cristão tem compaixão, piedade, respeito e amor ao próximo.

Enfim, para mim, essa fatalidade - por incrível que pareça, quase no Natal - convida os desumanos e insensíveis a sentirem EMPATIA e a agir com ALTRUÍSMO. Olhem ao seu redor. Há muita gente precisando de um pão, um remédio, uma fralda, um saco de carvão; uma orientação, um esclarecimento, uma visita ao abrigo, enfim, daquilo que temos em abundância em nós e nossas casas. Há muita gente precisando de calor humano, amor, respeito, acolhida, diálogo, uma simples conversa... Há pessoas que se sentem bem com um simples “bom dia”.

Perdão, mas, se você se diz cristão e atira pedras num rapaz como o Vaqueirinho, você não está precisando de igreja e tampouco de uma Bíblia. Você está precisando de uma jaula...

segunda-feira, 24 de novembro de 2025

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LENDA DA LAGOA PAPARY...

 


A lenda da lagoa Papary faz parte da cultura popular do município de Nísia Floresta, que se chamava Papary até 1948, quando mudaram o nome para Nísia Floresta.

Contava-se em Papary /A lenda de uma sereia/Era a história de Jacy/Jovem tapuia da aldeia/ Jaci formosa e catita/Filha do chefe Aribó/Era a índia mais bonita/Do Vale do Capió/Amava com amor ardente/Guaracy jovem guerreiro/Cujo peito igualmente/Nasceu um afeto primeiro/Sozinho na solidão/Guaracy vagava à toa/Ora ao redor da Caiçara/Ora ao redor da lagoa/Certa vez quando pescava/Tentando esquecer as mágoas/Ouviu que perto cantava/A voz de Jaci nas águas/A delirar, Guaracy/Na lagoa mergulhou/Seguiu a voz de Jaci/E à tona não mais voltou/Hoje essa lenda triste/Quem se dispõe a cantar/Vê quanto mistério existe/Entre a lagoa e o mar. “A lenda fala sobre Jaci, uma jovem tapuia, e Guaracy, um guerreiro, que se amam intensamente. Guaracy, consumido pela solidão, acaba mergulhando na lagoa atraído pela voz de Jaci, e nunca mais retorna à superfície. Essa trágica história simboliza o amor que ultrapassa barreiras, mas também as consequências do desejo e da busca pelo que é inalcançável. Temas Principais: 1) Amor e Desejo: O amor entre Jaci e Guaracy é forte e puro, mas também marcado por tragédias e desafios. 2) Solidão: Guaracy representa a solidão do ser humano em busca de conexão, algo que muitos podem sentir. 3) Misticismo: A presença da lagoa e da sereia insere um elemento mágico e misterioso, refletindo a relação das culturas indígenas com a natureza e o sobrenatural. 4) Cultura e Tradição: A lenda é uma forma de preservar a cultura e as histórias dos povos indígenas, ressaltando a importância de narrativas orais”.

Apresentada no Teatro Alberto Maranhão, em Natal, Rio Grande do Norte.

Maestros: Lúcia Tabita Marques de Lima e Lailson Toscano de Medeiros

Pesquisa: Luís Carlos Freire (1992)

ALZIRA SORIANO, CELINA GUIMARÃES E MARIA DO CÉU FERNANDES - "POLÍTICAS" -

 


RECORTE DO ESPETÁCULO "NÍSIA FLORESTA BRASILEIRAS AUGUSTAS" - 13 de dezembro de 2024. Texto,/Cenário e Direção Geral: Luís Carlos Freire - Direção Artística: Marx Bruno.

Este balé encena a poderosa jornada da emancipação feminina. Cada movimento traduz a transformação da mulher que, inspirada pelas pioneiras - Alzira Soriano, Celina Guimarães e Maria do Céu Fernandes - despertou de sua letargia e lançou-se à luta. No palco da vida, ela conquistou as ciências, desvendou horizontes e compreendeu que não havia barreiras entre ser dona de casa e ser presidente da república, médica, cientista, militar, senadora — ou o que mais sua vontade ousasse almejar. É a celebração da mulher que rompeu os grilhões invisíveis que a prendiam, que ergueu a voz e declarou com convicção: "Eu posso". Nesta dança, vibra a essência de sua liberdade e a força de sua determinação, iluminando o caminho para as gerações futuras.

LENDA DA LAGOA PAPARY - CORAL...

 


LENDA DA LAGOA PAPARY - AUTOR DESCONHECIDO - CORAL – RECORTE DO ESPETÁCULO "NÍSIA FLORESTA BRASILEIRAS AUGUSTAS - DIREÇÃO GERAL/TEXTO E CENÁRIO: LUÍS CARLOS FREIRE - DIREÇÃO ARTÍSTICO-COREOGRÁFICA: MARX BRUNO. Contava-se em Papary /A lenda de uma sereia/Era a história de Jacy/Jovem tapuia da aldeia/ Jaci formosa e catita/Filha do chefe Aribó/Era a índia mais bonita/Do Vale do Capió/Amava com amor ardente/Guaracy jovem guerreiro/Cujo peito igualmente/Nasceu um afeto primeiro/Sozinho na solidão/Guaracy vagava à toa/Ora ao redor da Caiçara/Ora ao redor da lagoa/Certa vez quando pescava/Tentando esquecer as mágoas/Ouviu que perto cantava/A voz de Jaci nas águas/A delirar, Guaracy/Na lagoa mergulhou/Seguiu a voz de Jaci/E à tona não mais voltou/Hoje essa lenda triste/Quem se dispõe a cantar/Vê quanto mistério existe/Entre a lagoa e o mar. “A lenda fala sobre Jaci, uma jovem tapuia, e Guaracy, um guerreiro, que se amam intensamente. Guaracy, consumido pela solidão, acaba mergulhando na lagoa atraído pela voz de Jaci, e nunca mais retorna à superfície. Essa trágica história simboliza o amor que ultrapassa barreiras, mas também as consequências do desejo e da busca pelo que é inalcançável. Temas Principais: 1) Amor e Desejo: O amor entre Jaci e Guaracy é forte e puro, mas também marcado por tragédias e desafios. 2) Solidão: Guaracy representa a solidão do ser humano em busca de conexão, algo que muitos podem sentir. 3) Misticismo: A presença da lagoa e da sereia insere um elemento mágico e misterioso, refletindo a relação das culturas indígenas com a natureza e o sobrenatural. 4) Cultura e Tradição: A lenda é uma forma de preservar a cultura e as histórias dos povos indígenas, ressaltando a importância de narrativas orais”. Maestros: Lúcia Tabita Marques de Lima e Lailson Toscano de Medeiros Pesquisa: Luís Carlos Freire (1992)


Hynno do Primeiro Centenário do Nascimento de Nísia Floresta

 


RECORTE DO ESPETÁCULO "NÍSIA FLORESTA BRASILEIRAS AUGUSTAS" - TEXTO/DIREÇÃO GERAL E CENÁRIO: LUÍS CARLOS FREIRE - DIREÇÃO ARTÍSTICO-COREOGRÁFICA: MARX BRUNO - APRESENTADO NO DIA 13 DE DEZEMBRO DE 2024.

Em 1909, o Congresso Literário, responsável pelas celebrações do centenário de nascimento de Nísia Floresta (e supondo que Nísia Floresta havia nascido em 1809), em parceria com o Grupo Escolar que leva seu nome, compôs um tributo singular: o “Hynno do Primeiro Centenário do Nascimento de Nísia Floresta” (na verdade, Nísia Floresta nasceu em 1810). A ocasião reuniu intelectuais vindos de diversas regiões em Papary — hoje chamada Nísia Floresta — para prestar homenagens à ilustre filha da terra. Esse hino, símbolo de reverência e reconhecimento, transcendeu o tempo. Embora criado há mais de um século, sua melodia e versos ainda ecoam, sendo finalmente gravados em estúdio, pela primeira vez, em 2000, sob os cuidados de Luís carlos Freire. A letra, repleta de lirismo e fervor, exalta a grandeza de Nísia Floresta, vejamos: “Salve filha imortal d’esta terra - Terra ardente de ríspidos soes - Que somente beleza encerra - Mãe fecunda de bravos, de heróis (Surge, ressurge, brilha - Oh! Nísia Sublimada - Oh! Sempiterna filha - Da terra bem amada) Tu que às plagas estranhas levaste - O seu nome, o seu nome eternal - O seu nome obscuro encerraste - No esplendor de uma glória imortal - E essa glória é a tua essa glória - Os vindouros melhor guardarão - Hoje emerge do fundo da história - Sob aurora de excelso clarão”. Com essas palavras, o “hynno” enaltece a trajetória de uma mulher que levou o nome de sua terra natal além-fronteiras, transformando sua história local em um legado universal. Maestros: Lúcia Tabita Marques de Lima e Lailson Toscano de Medeiros Arranjos: Maestro Lailson Toscano de Medeiros e Luís Carlos Freire Pesquisa: Luís Carlos Freire (1992)

DISCURSO DE NÍSIA FLORESTA BRASILEIRA AUGUSTA...

 


A mensagem de Nísia Floresta é uma fala forte, uma aula de civilidade que toca o coração de mulheres e homens. Ela aborda a situação da mulher ontem e hoje, exalta as conquistas femininas, encoraja as mulheres a lutar por sua independência e quebrar grilões que impedem a sua cidadania plena. Nísia descortina a situação crítica da violência contra a mulher atualmente no Rio Grande do Norte, ressalvando que o desrespeito e a violência contra as mulheres seguem intactos em pleno século XXI. Ela reitera que somente de braços dados, homens e mulheres podem se dizer habitantes de um país civilizado, pois só assim serão capazes de colaborar na construção de uma sociedade boa para todos. Enfim, encerra lembrando da única fórmula para melhorar o mundo: RESPEITO!

ESPETÁCULO "NÍSIA FLORESTA BRASILEIRAS AUGUSTAS"
DIREÇÃO GERAL/TEXTO E CENÁRIO: LUÍS CARLOS FREIRE - DIREÇÃO ARTÍSTICO-VOREOGRÁFICA: MARX BRUNO

sábado, 22 de novembro de 2025

ESSA FOI A MINHA REDAÇÃO NO ENEM...

"Perspectivas acerca do envelhecimento na sociedade brasileira"

Quando adolescente, mesmo que não tenha sido intencional, mas algo da minha índole, somado ao que aprendi com os meus pais sem que os mesmos fossem pessoas religiosas - os quais respeitavam muito os idosos e os acolhiam sempre - fez com que eu aprendesse a enxergar o envelhecimento como uma dádiva. Enquanto outros meninos preferiam única e exclusivamente brincar na rua ou correr sem rumo, eu também era assim, mas não me privava de buscar as sombras tranquilas das varandas onde os mais velhos gostavam de se sentar.

Sempre enxerguei os velhos: seja no banco da praça, no banco de suas residências, andando nas ruas… onde estivessem, eu os enxergava. Sempre os vi como fontes inesgotáveis de sabedoria, conselheiros atentos, detentores de histórias que pareciam saídas de livros quando eu os interrogava, curioso, ávido por saber o que eles viveram no passado.

Passei horas - dias, meses até - conversando, ouvindo, rindo, admirando, anotando causos, lendas, ensinamentos e lembranças. Sempre gostei de História Oral, certamente influenciado pela mesma sensibilidade de Ecléa Bosi, que passou a vida escrevendo histórias de velhos, assim como também a grandiosa Hildegardes Vianna.

Nesses empreendimentos, eu visitava alguns idosos inúmeras vezes, retornando quantas fossem necessárias, porque alguns estavam mais esquecidos e iam se lembrando aos poucos; e cada visita era uma descoberta.

Esse respeito profundo pelos idosos moldou a minha vida. Aprendi, desde cedo, a enxergar as coisas de forma diferente. Eu os tratava com muito carinho e respeito, porque entendia que suas histórias sintetizavam décadas de existência, e tudo o que diziam era pautado em fatos, o que, para mim, servia de ensinamento. Eram histórias que eu não encontrava em nenhum livro.

Ontem, ao completar 58 anos e estar a dois anos da idade oficialmente considerada idosa, observo que o cenário atual envolvendo jovens e idosos não é o mesmo que eu via no passado. Pois, embora nem todos os meus amigos fossem iguais a mim, era mais comum ver pessoas parecidas comigo, se comparado ao presente. Não vejo mais jovens que se pareçam com o Luís Carlos que um dia fui. Não porque “os tempos são outros” ou porque “os interesses mudaram”, como muitos poderão querer justificar, mas porque a educação - salvas as exceções - tem moldado gerações mais indiferentes, apáticas e, por vezes, hostis.

Somado a essa realidade, temos o aparelho celular que, por mais que também seja um instrumento precioso de comunicação, transformou-se num equipamento que isola a todos. Os jovens vivem mergulhados na tela, incapazes de erguer os olhos para dar atenção a qualquer pessoa, e, quando essa pessoa é idosa, ela é invisível. Tornaram-se ensimesmados; o mundo real, as pessoas de carne e osso foram substituídas por pessoas que talvez nem existam. A inteligência artificial substitui o raciocínio, a emoção, o diálogo, o calor humano. E parece até mais atrativa, criando um mundo paralelo. E nesse mundo fútil não há espaço para idosos; portanto, resta-lhes a indiferença e a naturalização do abandono.

Hoje é muito comum vermos idosos deixados em abrigos, sem visita da família, esquecidos em quartos silenciosos, confinados nos fundos dos quintais, invisíveis ao cotidiano doméstico, como se fossem coisa. Mal os filhos e netos lhes dirigem palavras. Muitos são explorados financeiramente; suas aposentadorias se transformaram em cofres particulares de filhos e netos. A violência física e psicológica, a falta de alimentação adequada, a ausência de medicação e até o encarceramento dentro do próprio lar tornaram-se comuns. Esses fatos, muitas vezes silenciados por vergonha ou medo, revelam não apenas a vulnerabilidade extrema da velhice, mas a fragilidade moral de uma sociedade que deveria proteger seus anciãos.

Acredito que as instituições públicas e privadas devem desenvolver campanhas mais específicas e contínuas sobre o respeito à pessoa idosa. É urgente que as escolas trabalhem, desde cedo, a temática do envelhecimento. As crianças precisam aprender que os idosos não são estorvos, mas pilares; não são inúteis, mas referências; não são fardos, mas ancestrais que nos antecederam e nos sustentam através da memória coletiva. Desde cedo, as crianças precisam compreender que envelhecer é o destino comum a todos nós, e que a forma como tratamos os que chegaram lá antes de nós define o tipo de sociedade que estamos construindo.

Educar as crianças e jovens para o respeito aos idosos não é apenas uma questão ética: é um investimento no próprio futuro. Afinal, o que todos desejamos é que, ao envelhecermos, encontremos cuidado, dignidade e amor, e não um cenário marcado por violência e abandono, como o que está tão comum atualmente.

Hoje estou quase um idoso - segundo o que está disposto no sistema -, e já começo a perceber que não existem mais os Luís Carlos que fui, e fico imaginando o que está acontecendo com o mundo quando eu, que fui essa pessoa tão respeitosa com os idosos, que dei tanto sentido às suas vidas, hoje vejo pouquíssimo sinal desse respeito. Infelizmente.

OBS. Na verdade, eu não participei do ENEM. Apenas me chamou a atenção o tema “Perspectivas acerca do envelhecimento na sociedade brasileira”, pois veio a calhar. É um assunto que venho trabalhando há anos com as pessoas comuns no meu cotidiano. Então aproveitei para escrever essa redação e expressar o que penso. Se o tivesse feito, essa seria a minha redação...

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sexta-feira, 21 de novembro de 2025

AS CARTAS QUE RECEBI DO PAPA JOÃO PAULO II...

  

Quando jovem, eu escrevia cartas com intensidade. Como colecionador de selos e moedas antigas, mantinha contato com uma infinidade de pessoas - também colecionadores - do Brasil e do exterior. À época, eu recebia gratuitamente dos Correios a revista COFI (Correio Filatélico), cuja última página trazia endereços de todo o planeta Terra. Eram filatelistas, cada qual com seu interesse: trocar selos, vender, comprar etc.

João Paulo II (18.5.1920 - 2.4.2005)

Minha mãe escrevia muitas cartas para seus familiares daqui do Rio Grande do Norte, em especial para sua única irmã – de São José de Mipibu - fato que certamente despertou em mim o espírito missivista, pois meu arquivo epistolar era gigantesco.

Sempre fui a pessoa que saltava do quadrado; dessa forma, escrevia para muitas outras pessoas e com outras finalidades, sempre movido por alguma curiosidade ou pela procura de informação. Àquela época não existia fax. A internet engatinhava naqueles recônditos, de maneira que não sabíamos exatamente o que era aquilo. Tudo era no papel, na caneta Bic, no lápis e na borracha. Tudo na base do punho.

Desde os 9 anos eu escrevia. É algo inexplicável, como se um espírito baixasse e despejasse palavras nos papéis que encontrava. Gastava noites incorporando palavras, de modo que, sem perceber, o dia amanhecia. Assim, eu aproveitava todos os papéis possíveis. Sobras dos cadernos escolares se tornaram matéria-prima para a escrita. Sempre gostei de escrever a lápis, costume preservado até hoje. Sempre fiz livrinhos de papel, onde guardava poemas, se assim posso defini-los.

Foi exatamente esse espírito inquieto que despertou em mim o interesse de me comunicar com o Papa e com outras figuras importantes do mundo, como, por exemplo, a rainha Elizabeth II, o presidente do Paraguai e o presidente de Portugal. Havia algo tão esdrúxulo nesse meu espírito missivista que até mesmo com a “Mãe Dinah” eu me comuniquei. Recebi resposta de todos. E vale lembrar que fiz amigos - com idades semelhantes à minha - em países como México, Honduras, Itália, Costa Rica, Paraguai, Alemanha, Canadá e outros. Nesses casos, a afinidade eram os selos, minha paixão. Eu ia ao inferno atrás de selos e moedas...

Hoje, escavacando papéis pessoais muito antigos à procura de um documento, dei-me com essas cartas que recebi do Vaticano. São respostas, obviamente. A primeira me foi enviada no dia 22 de janeiro de 1986. Eu tinha 19 anos. A segunda veio em 29 de agosto de 1986. A terceira, em janeiro de 1987. A quarta, em maio de 1988. E a última chegou no dia 8 de janeiro de 1998, eu já morava nas terras de Câmara Cascudo. Até carta da “Mãe Dinah” encontrei. As demais citadas devem estar em algum lugar da minha papelaria, até porque o meu arquivo epistolar se imiscui com tanta coisa velha que às vezes me pergunto se fui eu mesmo que escrevi para aquelas pessoas ou se foram os espíritos madrugadeiros que me entoavam.

Nossa casa era um endereço conhecidíssimo dos carteiros da cidade, pois havia ali um escritor de cartas que funcionava para onde desse na telha.

Ah! Mas devo contar um pouco sobre o que me instigava a escrever ao Papa, já que, em outra ocasião, mostrarei a resposta da rainha Elizabeth II (quando achar, já que não faço ideia de onde esteja; pode até estar guardada nos velhos baús do Mato Grosso do Sul). Sei que lá está tudo intacto, pois, quando estive de férias ali entre junho e julho, doei dezenas de livros da adolescência para um sobrinho. Doei o móvel e tudo.

Minhas cartas eram movidas por curiosidades sobre coisas da religião, da história do Cristianismo, dos dogmas da Igreja, dos rituais católicos, determinados fatos passados com alguns papas, felicitações por seu aniversário etc. Curiosidade: nunca recebi explicação sobre o que questionava. Eram respostas genéricas, sempre orientando que procurasse um padre próximo para dar tais explicações .... rsss. Também tenho alguns cartões que vinham juntos. Estão guardados em algum lugar.

Um detalhe interessante: eu nunca fiz escarcéu das cartas. Para mim, as cartas do Papa, da Elizabeth II ou do presidente do Paraguai eram tão iguais e importantes quanto as de um menino filatelista mexicano - que residia em Durango Lerdo, no México -, que conheci aos 12 anos. Tenho um monte de fotografias desse amigo e de seus familiares. Eles amavam o Brasil.


Também me recordo de uma curiosidade. Nem minha mãe, nem meu pai, nem meus irmãos faziam caso dessas cartas. E nem de todas eles tomavam conhecimento. Certamente porque nossa casa era uma espécie de extensão dos Correios...

E do mesmo modo como meus familiares não sabiam ou não faziam conta dessas cartas - e creio que nem eu mesmo -, creio que Fídias fará igual, pois, morando na Rússia - e com certeza - vindo ao Brasil apenas de férias e rapidamente - certamante sendo a terra de Stalin a sua segunda pátria -, não fará questão de guardar tantas bugigangas...

João Paulo II no "Papódromo", na Governadoria.


Uma curiosidade: quando cheguei em Natal, no dia 31 de dezembro de 1991, havia completado pouco mais de dois meses que João Paulo II havia estado em Natal, durante o Congresso Eucarístico Nacional, ocorrido no período de 12 e 13 de outubro de 1991. Em 1996 estive no local onde ele ficou hospedado, num imenso prédio pertencente à Arquidiocese de Natal, em Ponta Negra.

Pois bem... eis que hoje, atrás de um documento, dei-me com essas respostas que recebi do Vaticano...

João Paulo II chegando ao papódromo.