No próximo mês, comemoraremos o centenário de nascimento de Clara Charf, uma mulher cuja trajetória representa um exemplo de resistência, coragem e compromisso com a justiça social. Conhecê-la pessoalmente, em 2006, foi uma experiência que marcou profundamente minha vida. Tive a oportunidade de conversar com ela por cerca de uma hora no Palácio do Planalto, momento em que pude testemunhar sua serenidade, sua consciência aguçada do Brasil e seu compromisso inabalável com a luta por um país mais justo. Troquei cartas com Clara, e essa troca de correspondências reforçou ainda mais o orgulho que sinto por ter tido a chance de estabelecer uma conexão com uma mulher de tamanha integridade e dedicação.
Clara Charf foi esposa de Carlos
Marighella, uma figura emblemática na história da resistência brasileira contra
a ditadura militar. Marighella foi político, escritor e guerrilheiro marxista-leninista,
foi um dos principais organizadores da luta armada contra o regime, chegando a
ser considerado o inimigo número um do Estado. Clara foi uma defensora
incansável de seu legado, responsável por divulgar sua memória e preservar sua
história, contribuindo para que suas ações e ideais não fossem esquecidos.
Nascida em 1925 na capital alagoana
e criada no Recife, Clara veio de uma família de origem judaica russa que fugiu
da perseguição antissemita no Leste Europeu. Desde jovem, foi influenciada por
um ambiente de efervescência política, marcado pela vitória soviética e pelo
fim da Segunda Guerra Mundial. Sua militância começou cedo, inicialmente
participando de comícios e propagando ideias comunistas, motivada pela pobreza
e miséria ao seu redor. Aos 21 anos, filiou-se ao Partido Comunista Brasileiro
(PCB), apesar da oposição de seu pai, Gdal Charf, que não acreditava na
sustentabilidade da democracia e desaprovava sua militância.
Durante sua trajetória, Clara
enfrentou inúmeros obstáculos, incluindo prisões, perseguições e exílio. Sua
coragem foi demonstrada ao fugir de casa após o conflito com seu pai,
refugiando-se na casa de uma deputada e, posteriormente, vivendo na
clandestinidade ao lado de Marighella. Sua atuação na militância foi marcada por
dedicação intensa, desde a organização de movimentos femininos até a
participação em missões internacionais, como sua viagem à China e sua atuação
na formação de escolas em Campinas.
A relação de Clara com Marighella
foi marcada por amor, companheirismo e resistência. Apesar das dificuldades,
eles permaneceram juntos por 22 anos, enfrentando a repressão e a
clandestinidade. Sua prisão em Campinas, sua prisão por suspeita de espionagem
e sua subsequente exilação em Cuba, onde trabalhou como tradutora por nove
anos, são testemunhos de sua coragem e determinação.
Ter tido a oportunidade de estabelecer uma relação, ainda que sutil, com essa notável mulher, é algo que considero uma chama que acende em mim uma luz interior, fortalecendo minha coragem e determinação para lutar contra os desafios e as injustiças que permeiam nosso país. A inspiração que Clara Charf representa é um farol que ilumina o caminho de todos aqueles que buscam um Brasil melhor para todos. Nada mágico, mas um Brasil sem diferenças econômicas abismais, onde os pobres tenham dignidade e vivam numa nação verdadeiramente civilizada. Viva Clara Charf! Luís Carlos Freire. 17.05.2025, 11h42
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