ENFERMEIROS: MITOS DE VERDADE
Ontem à tarde Fídias experimentou a sua primeira dose da vacina contra o Novo Coronavírus. O Ginásio Poliesportivo Djalma Maranhão, no centro de Natal, estava lotado. Filas imensas organizadas por cadeiras plásticas. A equipe da Secretaria de Saúde disponível era pequena para a quantidade de pessoas. Um rapaz transitava lá e cá, explicando quais documentos todos deveriam ter em mãos para serem vacinados. Isso para evitar que alguém aguardasse horas e não fosse vacinado por ter esquecido algum documento. Esse rapaz abordava cada pessoa e conferia tudo, calma e educadamente. Algumas pessoas não portavam tudo, e tiveram que voltar para as suas casas, buscar o que faltava e retornar logo em seguida, ou voltar no dia seguinte, afinal passava das 15 horas. Muitos deixavam a fila mastigando palavras não muito apetecíveis. Outros saiam esbravejando, como se a equipe da saúde tivesse cometido um crime inafiançável. Clima meio pesado!
Duas senhoras que atendiam no balcão, preenchiam a caderneta de vacinação, informavam qual a vacina seria aplicada e encaminhavam as pessoas para a fila em pé. Ao chegarmos à fila (eu apenas como acompanhante, pois tomarei a segunda dose no dia 2.9.21), percebemos que tudo estava parado. A enfermeira havia saído e os vacinandos ficaram ali olhando para o telhado.
Houve um princípio de tumulto nessa fila em pé, pois julgando pelo número de pessoas que nem tinham sido atendidas, o avançado das horas, a fila enorme, certamente pensavam “que hora eu vou sair daqui?”. “É um absurdo a gente esperar tanto… cadê a enfermeira?” “deve ter ido tomar um cafezinho”, “não, ela foi buscar vacina, toda hora ela sai um pouco”, “não era para ter uma pessoa aí só para ir buscar as vacinas?”, “ela deve estar lá atrás conversando com as pareceiras dela!”. Toda sorte de julgamentos e sentenças reverberavam da exigente fila.
De repente reaparece a enfermeira. Um andar arrastado de pata, carregando uma caixa plástica azul com as vacinas, calça azul e uma blusinha esquisita de estampa infantil. Lembrava as professoras de escolas infantis. Parecia que atenderia uma porção de criancinhas. Então ela reinicia a vacinação “por favor, todo mundo arregace as mangas acima do ombro, e quem for tirar fotografia, já venha com a pessoa e o celular no ponto; a gente não pode ficar fazendo pose, demorando, e a vacina tem que ser aplicada imediatamente após ser aberta”. Encerrado o longo e belo discurso, algumas pessoas riram “pra quê arregaçar a manga logo daqui do fim da fila, era para arregaçar quando a gente chegando até ela”, “pra que falar tão alto?”, "exigente ela!" Cada um que dizia um enredo. “Já estou cansado de ouvir esse discurso dela desde a hora que cheguei lá nas cadeiras”, “ela nem precisava dessa falação, pois lá da fila a gente já vem ouvindo a sua cantiga de grilo”.
Com certeza aquele figurino infantil e calmante da enfermeira versava magnificamente o seu ofício, pois a fila estava mais para uma fila de merenda escolar, que de vacinação. As faixas etárias eram misturadas,inclusive idosos, mas parecia infanto-juvenil pelo comportamento das pessoas. “Espero que essa danada tenha a mão leve, pois não suporto picada de agulha”, “eu vi, inclusive a hora que ela deu uma agulhada numa mulher que fez uma cara tão feia”, “é, ela deve ter a mão pesada mesmo!”, “eu já acho o contrário, ela parece aplicar com uma leveza incrível”, “pra mim pouco importa se dói ou não, eu quero é vacina no braço”, “essa enfermeira tem uma cara esquisita”, “será que ela é enfermeira mesmo”, “claro! não tá vendo a roupa?”. A novela corria à solta no rabo da fila, mas mal se aproximava da enfermeira, entrava no intervalo. A roupinha de coisinhas infantis, de fato parecia acalmar. As pessoas ficavam olhando os bichinhos desenhados e talvez se sentiam num universo infantil de paz...
Contemplando esse entrecho, ora com ares de um breve sorriso, atestei o sacerdócio dos enfermeiros por esse Brasil afora. Homens e mulheres, de médicos, técnicos de enfermagem a uma infinidade de profissionais da saúde… quanta luta! Quanto trabalho! Chega a ser desumano. Já imaginou quantas milhares de vezes por dia uma enfermeira aplica a vacina? Movimentos repetitivos o dia inteiro. Quantas vão em busca das caixas quando o outro estoque esvazia? Quantas se desgastam com aqueles discursos como o acima mencionado? Quantas se estressam diante de determinados ambientes permeados de confusões, grosserias, mal entendidos, e fingem estar maravilhosas, serenas, calmas? A enfermeira que atendia Fídias estava ali desde manhã. Já imaginou?!
Ultimamente está na moda a palavra MITO. Sabemos que mito é uma coisa irreal. Mas o vocábulo MITO também significa a pessoa excelsa, digna de um panteão, digna de louros, digna de troféus, digna da glória humana e da respeitabilidade de todos. E como essa palavra está sendo pessimamente mal aplicada no caudal dessa moda atual, é importante ressalvar que os mitos do Brasil de hoje, muito embora não reconhecidos, são OS ENFERMEIROS, os MÉDICOS, OS TÉCNICOS DE ENFERMAGEM, e toda a equipe de PROFISSIONAIS DE SAÚDE e afins, os quais tem suado suor e sangue para dar conta de um trabalho colossal, de certo modo desumano para eles que arriscam as suas vidas a cada segundo, e não fogem da raia. Estão a postos honrando a sua formação, o seu dom, a sua missão na Saúde.
Pois então… após um bom tempo assistindo a novela das vacinas e chegando a sua vez de ser atendido, Fídias perguntou “já?!” admirado com a precisão da enfermeira que o vacinou sem que ele sentisse. Me respondam se essas pessoas, de fato, não são mitos!
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OBS. A imagem aqui postada é meramente ilustrativa e de domínio público na internet.
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