O texto abaixo foi publicado na “Revista Papangu - Revista de Humor e Cultura”, ano 4, nº 39, Abril de 2007. A revista é uma publicação de Mossoró, município do Rio Grande do Norte. Não conheço o autor. O artigo foi publicado há 15 anos. A revista tem excelente qualidade de conteúdos, mas sua circulação é incerta. Ficou muito tempo sem circular, retornou e atualmente está parada. Não consegui fotografia do autor e nada sei sobre ele. Na internet há imagens de pessoas diferentes com o mesmo nome dele. Não quis ser irresponsável de publicar uma pessoa por outra, afinal não o conheço e não saberia identificá-lo numa fotografia.
Como expliquei na primeira publicação, com Scragnolle Dória, reservei o mês de abril para postar textos conhecidos, desconhecidos ou inéditos. Uns mais simples, outros mais substanciais. Achei interessante o texto de Polansky, dentre uma infinidade de raridades que trago nos meus arquivos e eventualmente lapido, edito, mexo, remexo para que você fique bem informado. O objetivo desta iniciativa é apenas divulgar o pensamento de pessoas diferentes sobre o legado de Nísia Floresta. Polansky se pautou na obra “Três Anos na Itália seguidos de uma viagem à Grécia".
Segue-o com alguns comentários meus. A "Revista Papangu" traz várias seções e colunas onde encontramos contos, crônicas, quadrinhos, artigos, entrevista com pessoas que trabalham com cultura, críticas, poemas. Há uma página reservada para breves comentários sobre atualidades, nesse caso, vai de críticas às emissoras de TV de Mossoró a política.
O artigo sobre Nísia Floresta está nas
páginas 22 e 23, ocupa uma página e meia. Vamos conhecer o texto; em seguida vem
breves comentários meus:
Nísia Floresta: o olhar de uma
estrangeira
Polansky Silva de Figueiredo
“Três Anos na Itália seguidos de uma viagem à Grécia, de Nísia Floresta,
é um livro de memórias escrito por um espírito ilustrado. Nele são narrados
fatos que a escritora assistiu e participou durante três longos anos, como está
intitulado no livro.
Como se pode perceber, a ideia principal deste impresso é descrever, a
partir de impressões in locu toda beleza daquele país, fazendo parte desse
belo: a Arte, a Geografia, a História, a Política, a Sociologia e, além destes,
índices de sua subjetividade, marca constante na obra.
Diante dos aspectos cotidianos e autobiográficos contidos no livro, o
opúsculo introduz um papel de magistral curiosidade e relevância aos estudiosos
das diversas áreas do conhecimento humano, sejam eles historiográficos ou de qualquer
natureza, como referimos, pois dá uma visão de como a Itália se encontrava
naquele momento depois de séculos de glória.
Além disso, rever a arte tão importante de outrora, demonstra que alguns
valores, na Arte, são atemporais. Com efeito, a Arte produzida por mãos
inquietantes como a de um Miguel Ângelo ou um Rafael perdurou, transcendendo .
Contudo, verifica-se ironicamente como um povo de passado tão glorioso está
destruído, vindo a ser “uma multidão de mendigos”, realidade atestada em uma das
cidades por onde passou a autora.
Em seu percurso, Nísia Floresta mostrou o que havia restado do grandioso
Império Romano naquela nova Itália, principalmente no que tange a Arte, a
História dos grandes déspotas que viveram e sucumbiram naquele ambiente. Esse
foi um dos temas mais tratados e questionados por ela, pois acreditava em um
país de homens instruídos e livres. Mas, o que viu foi uma elite “mascarada” e
uma população marginalizada. Vítima do progresso e do crescimento das cidades.
Entretanto, a Arte se tornou uma peça motivadora à sua jornada nesse ambiente.
Pois foi com esse objetivo que ali chegara. De espírito aberto, visita templos
Cristãos (Basílica de São Pedro) e Pagãos (Panteão), mas é no cristão que
observa a paradoxal riqueza dos “ministros” do Cristo e diz: inaudita e
desenfreada. É curioso observar, como esse livro que é, na verdade, um livro de
viagem, a autora acabou produzindo uma personagem ficcional. Ou seja, uma
mulher que ao lado de sua filha percorreu a Itália e se deslumbrou com
paisagens naturais e monumentos gigantescos criados pelos homens.
Ao adentrar em um castelo, refaz todo um percurso, devaneando, e entra
em suas memórias mais felizes: a terra natal. Isso ocorre quando se depara com
uma laranjeira no castelo. Por isso, o entorno dela sempre é pretexto para o
despertar de lembranças, sentimentos. Melhor dizendo, o sujeito se confunde com
o objeto, numa atitude tipicamente lírica; comprovamos isso através do estilo
da autora, pleno de imagens e metáforas, procedimentos usados mais na poesia.
Além de tentar captar a essência das coisas, Nísia Floresta procura revestir de
beleza a sua escritura.
Seu livro foi publicado em 1861, na França, e escrito em língua francesa
com o título Trois ans en Italie suivi d’un voyage à Gréce. Mas sua produção
textual foi incessante, chegando a publicar inúmeras obras. Entre as quais são
mais conhecidas: Direito das Mulheres, de 1832; Conselhos à minha filha, de
1842; Lágrimas de um Caeté, de 1849, e em 1854, Um passeio ao Aqueduto da Carioca.
Em seu livro de memórias, se observa uma relação direta entre o autor e
o leitor, pois cada passo está marcado ou pelo nome da cidade ou pela data
específica do que ocorreu naquele momento de redescoberta da Itália por um
estrangeiro.
Nísia Floresta, dotada de um arguto
espírito observador, assemelha-se, nesse sentido, ao grande mestre florentino
Leonardo da Vinci, que procurava vislumbrar os transeuntes para chegar próximo
da realidade. Era desse modo que a autora procedia, procurando se desvencilhar
dos objetos materiais a sua vista, para produzir uma análise criteriosa e com o
máximo de distanciamento possível acerca do tema proposto. Caso particular é o
do encontro dela com um padre, no qual este afirmava que o clero e a mulher brasileira
tinham uma conduta duvidosa, mas logo procurou rebater as acusações, reforçando
que na Itália não era tão diferente, com isso ela pode mostrar sua perspicácia
e o seu lado intelectual tão profundo para uma mulher daquela época,
mostrando que a condição humana é uma só, independente do espaço no qual está
inserida. Sendo assim, cabe dizer que essa mulher do século XIX, não foi só um
espírito brilhante além da sua época, mas uma das poucas almas que com o seu
esforço e capacidade procurou colocar o seu nome na história e mostrar esse
ambiente que , apesar de pertencer a Europa, estava muito longe de ser um
espaço digno para aqueles cidadãos, os quais ela tanto mencionou como “menos”
felizes que o seu povo brasileiro”.
BREVES COMENTÁRIOS SOBRE O ARTIGO:
“... Três Anos na Itália seguidos de
uma viagem à Grécia, de Nísia Floresta, é um livro de memórias escrito por um
espírito ilustrado. Nele são narrados fatos que a escritora assistiu e
participou durante três longos anos, como está intitulado no livro”. Essa obra
nisiana foi publicada
na França em 1864. É um livro digno de ser reeditado
na Itália e muito bem estudado devido a vastidão de informações. Como bem
opinou Polansky, o livro traz “...a Arte, a Geografia, a História, a
Política, a Sociologia e, além destes, índices de sua subjetividade, marca
constante na obra”. É uma obra importante para todo o povo italiano, de
fato “... dá uma visão de como a Itália se encontrava naquele
momento depois de séculos de glória”, mas a sua literalidade está anos-luz dessas primeiras impressões. O leitor pode se certificar lendo a obra, disponível
na internet e também encontrada em sebos.
Nem todos os viajantes estrangeiros que
estiveram no Brasil foram honestos em relatar com tanta riqueza e
substancialidade como Nísia Floresta o fez nas cidades italianas em que esteve.
Nessa época ela estava muito amadurecida. Suas impressões e relatos revelam uma
autora muito culta. O primeiro volume foi traduzido por Francisco das Chagas
Pereira e lançado em português. O segundo volume foi traduzido por sua esposa
Selma Pereira. Assim como até hoje são traduzidas algumas obras de viajantes
estrangeiros que descortinaram o Brasil do século XIX, assim o fez Nísia
Floresta, ao escrever o seu Três Anos na Itália seguidos de uma viagem à Grécia,
digno de ter uma nova edição em italiano na terra de Dante Aleghieri.
São duas obras imensas, em cujas
páginas encontramos uma Nísia Floresta jornalista, poeta, socióloga,
historiadora, cientista política e filósofa. Suas reflexões, singulares, são
muito sensatas e coerentes, revelam uma escritora que devorava livros, pois
suas alusões a personagens da história, fatos históricos, inclusive políticos,
e lugares, é feita com tanta propriedade que, embora uma das características da
obra seja de um diário de viagem, ela perpassa por muitos outros estilos. Nísia
é meticulosa, detalhista e precisa nas alusões e comparações. Quando Raquel de
Queiroz opinou que diante das hostilidades e problemas enfrentados por Nísia
Floresta na corte do Rio de Janeiro, foi melhor ela ter ido passear na Europa,
com certeza teria escrito outra opinião se tivesse lido a obra. A obra de Nísia Floresta é um presente para todo italiano.
Uma bela visão de Polansky é constatada
quando, se referindo ao estilo da escrita nisiana ele enxergou que “...
Por isso, o entorno dela sempre é pretexto para o despertar de lembranças,
sentimentos. Melhor dizendo, o sujeito se confunde com o objeto, numa atitude
tipicamente lírica; comprovamos isso através do estilo da autora, pleno de
imagens e metáforas, procedimentos usados mais na poesia. Além de tentar captar
a essência das coisas, Nísia Floresta procura revestir de beleza a sua
escritura”. De fato é assim. Nela sobrava poesia até para ser
historiadora, filósofa, socióloga, cientista política…sem que isso afetasse os
fatos, mas encantasse o leitor, e não era qualquer leitor. Imagine essa mulher
numa sala de aula!
“... Seu livro foi publicado em 1861, na França, e escrito em língua francesa com o título Trois ans
en Italie suivi d’un voyage à Gréce. Mas sua produção textual foi incessante,
chegando a publicar inúmeras obras...”. Aqui Polansky
confundiu o ano da publicação, embora mencionei corretamente acima: 1864.
“... Caso particular é o do encontro
dela com um padre, no qual este afirmava que o clero e a mulher brasileira
tinham uma conduta duvidosa, mas logo procurou rebater as acusações, reforçando
que na Itália não era tão diferente, com isso ela pode mostrar sua perspicácia
e o seu lado intelectual tão profundo para uma mulher daquela época,
mostrando que a condição humana é uma só, independente do espaço no qual está
inserida. Sendo assim, cabe dizer que essa mulher do século XIX, não foi só um
espírito brilhante além da sua época, mas uma das poucas almas que com o seu
esforço e capacidade procurou colocar o seu nome na história e mostrar esse
ambiente que , apesar de pertencer a Europa, estava muito longe de ser um
espaço digno para aqueles cidadãos, os quais ela tanto mencionou como “menos”
felizes que o seu povo brasileiro”.
O trecho acima é um detalhe bastante
curioso da obra. Essa passagem aconteceu em data próxima de sua audiência com o
papa Pio IX. Dentre várias conclusões que podemos tirar do episódio, percebemos
o lado religioso de Nísia Floresta, que, sem sombra de dúvida, era católica.
Interessante também o fato de em outros momentos, e em outras obras dela, encontrarmos
provas substanciais de sua religiosidade, da sua propensão ao catolicismo. Mas
com uma característica: era muito crítica. Não mantinha em segredo a sua
opinião sobre o que discordava em sua igreja, inclusive repudiava a infalibilidade do Papa e condenava a vida nababesca de alguns clérigos. Interessante é a defesa
que ela fez quando ouviu a crítica do sacerdote, o qual não estava errado no
aspecto de sua crítica aos padres – que o digam incontáveis obras sociológicas
respeitáveis disponíveis na atualidade – que retratam o comportamento de boa
parte dos padres daquele tempo, a exemplo de “Devotos e Devassos”, de Cristian
Santos. Mas mesmo assim Nísia o retruca em cima da bucha.
Pois bem, eis mais um texto simples,
mas desconhecido por muitos, e que vale a pena lermos.
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