Quando eu era criança, assim como hoje, se comemorava o dia do índio. Mas eu não compreendia uma contradição. Nasci e fui educado no Mato Grosso do Sul, região onde é possível ver os índios de uma maneira mais real. Eles falam vários dialetos e usam predominantemente o guarani. Transitam na cidade normalmente. Não usei “falavam” porque eles permanecem lá atualmente; estão vivos. Eles fazem artesanatos com elementos naturais, convivem na mata e na cidade, enfim, são diferentes dos índios daqui no que se refere a um complexo de tradições e assessórios que usam com naturalidade.
Os Guaranis-Kaiowás têm um sotaque macarrônico ao falar português. São arredios e mais atraídos pelas matas que pela cidade. Moram nela. As professoras da minha infância diziam “os índios caçavam, pescavam, eram oleiros, faziam flechas, faziam arcos, construíam ocas, preparavam beiju”... Aprendíamos a vê-los como pessoas do passado. O verbo era no passado. Ninguém dizia: “os índios caçam, pescam, fazem armadilhas, lutam...”. Ninguém falava neles com os verbos no presente, tipo "os indígenas estão aqui próximos da cidade, vamos visitá-los"?
Eu estranhava, pois nossa cidade era a extensão da casa dos índios. Eles transitam nas ruas igualmente a nós. A diferença era o comportamento, pois não falam com todos, nem gostam que os observemos falando a línguas deles. Nasci, cresci, fiquei adulto vendo índio ao vivo, mas na escola nos negavam a vê-los. Só depois de muito tempo percebi a imperdoável injustiça. A educação no regime militar preparou os livros didáticos altamente preconceituosos.
Era muito estranho. Nós dividíamos espaço com eles na cidade, respirávamos os mesmos ares, comíamos as mesmas frutas; às vezes até mesmo os caititus (porcos do mato), mas as professoras diziam que eles caçavam, pescavam, faziam flechas... Éramos distanciados deles a partir da escola. O governo federal programou os nossos cérebros, durante anos, para que não enxergássemos os índios como contemporâneos a nós.
Quando observo, por exemplo, o Rio Grande do Norte, local tão distante do Mato Grosso do Sul, terra dos potiguares, entendo com mais clareza o quanto esses povos foram dilapidados, pois, diferente da terra pantaneira, que a preservação das linguagens e tradições é um fato, aqui os dialetos desapareceram junto com grande parte de suas tradições. É recente todo esse contexto de reivindicação de sua condição indígena. Ou seja, eles desapareceram e foram reaparecendo recentemente, diluídos, desconhecendo até mesmo a própria cultura. Quando estive na Baia da Traição, divisa entre RN é PB, reconheci-os pelas fisionomias apenas, mas não falavam sequer uma palavra em seus dialetos e idiomas. Eles estavam tentando aprender artesanato indígena com índios de outros estados, pois não aprenderam com seus antepassados.
Acredito que a educação do passado, comentada acima, ajudou a diluir a vontade que eles sentiam de preservar à sua cultura. O preconceito das pessoas urbanas certamente ajudou também. Por muito tempo foi vergonhoso se dizer índio. O grande trunfo dessa história, principalmente aqui no RN, é que nos últimos tempos o Governo Federal criou uma série de políticas públicas em prol da revitalização das comunidades indígenas desaparecidas. Espero que o projeto continue nesse atual governo.
Lembro que falar sobre os povos indígenas, hoje, é falar também do índio vereador, médico, professor enfim muitos se urbanizaram totalmente e estão por todos os lugares. Não se pode pensar que só é índio se dançar a dança da chuva. Tenho impressão de que esse texto seja interessante para os educadores lerem em sala de aula e refletirem, pois leva os alunos ao pensar.
Os Guaranis-Kaiowás têm um sotaque macarrônico ao falar português. São arredios e mais atraídos pelas matas que pela cidade. Moram nela. As professoras da minha infância diziam “os índios caçavam, pescavam, eram oleiros, faziam flechas, faziam arcos, construíam ocas, preparavam beiju”... Aprendíamos a vê-los como pessoas do passado. O verbo era no passado. Ninguém dizia: “os índios caçam, pescam, fazem armadilhas, lutam...”. Ninguém falava neles com os verbos no presente, tipo "os indígenas estão aqui próximos da cidade, vamos visitá-los"?
Eu estranhava, pois nossa cidade era a extensão da casa dos índios. Eles transitam nas ruas igualmente a nós. A diferença era o comportamento, pois não falam com todos, nem gostam que os observemos falando a línguas deles. Nasci, cresci, fiquei adulto vendo índio ao vivo, mas na escola nos negavam a vê-los. Só depois de muito tempo percebi a imperdoável injustiça. A educação no regime militar preparou os livros didáticos altamente preconceituosos.
Era muito estranho. Nós dividíamos espaço com eles na cidade, respirávamos os mesmos ares, comíamos as mesmas frutas; às vezes até mesmo os caititus (porcos do mato), mas as professoras diziam que eles caçavam, pescavam, faziam flechas... Éramos distanciados deles a partir da escola. O governo federal programou os nossos cérebros, durante anos, para que não enxergássemos os índios como contemporâneos a nós.
Quando observo, por exemplo, o Rio Grande do Norte, local tão distante do Mato Grosso do Sul, terra dos potiguares, entendo com mais clareza o quanto esses povos foram dilapidados, pois, diferente da terra pantaneira, que a preservação das linguagens e tradições é um fato, aqui os dialetos desapareceram junto com grande parte de suas tradições. É recente todo esse contexto de reivindicação de sua condição indígena. Ou seja, eles desapareceram e foram reaparecendo recentemente, diluídos, desconhecendo até mesmo a própria cultura. Quando estive na Baia da Traição, divisa entre RN é PB, reconheci-os pelas fisionomias apenas, mas não falavam sequer uma palavra em seus dialetos e idiomas. Eles estavam tentando aprender artesanato indígena com índios de outros estados, pois não aprenderam com seus antepassados.
Acredito que a educação do passado, comentada acima, ajudou a diluir a vontade que eles sentiam de preservar à sua cultura. O preconceito das pessoas urbanas certamente ajudou também. Por muito tempo foi vergonhoso se dizer índio. O grande trunfo dessa história, principalmente aqui no RN, é que nos últimos tempos o Governo Federal criou uma série de políticas públicas em prol da revitalização das comunidades indígenas desaparecidas. Espero que o projeto continue nesse atual governo.
Lembro que falar sobre os povos indígenas, hoje, é falar também do índio vereador, médico, professor enfim muitos se urbanizaram totalmente e estão por todos os lugares. Não se pode pensar que só é índio se dançar a dança da chuva. Tenho impressão de que esse texto seja interessante para os educadores lerem em sala de aula e refletirem, pois leva os alunos ao pensar.
Nenhum comentário:
Postar um comentário