ANTES DE LER É BOM SABER...

CONTATO: (Whatsapp) 84.99903.6081 - e-mail: luiscarlosfreire.freire@yahoo.com. Este blog - criado em 2008 - não é jornalístico. Fruto de um hobby, é uma compilação de escritos diversos, um trabalho intelectual de cunho etnográfico, etnológico e filológico, estudos lexicográficos e históricos de propriedade exclusiva do autor Luís Carlos Freire. Os conteúdos são protegidos. Não autorizo a veiculação desses conteúdos sem o contato prévio, sem a devida concordância. Desautorizo a transcrição literal e parcial, exceto breves trechos isolados, desde que mencionada a fonte, pois pretendo transformar tais estudos em publicações físicas. A quebra da segurança e plágio de conteúdos implicarão penalidade referentes às leis de Direitos Autorais. Luís Carlos Freire descende do mesmo tronco genealógico da escritora Nísia Floresta. O parentesco ocorre pelas raízes de sua mãe, Maria José Gomes Peixoto Freire, neta de Maria Clara de Magalhães Fontoura, trineta de Maria Jucunda de Magalhães Fontoura, descendente do Capitão-Mor Bento Freire do Revoredo e Mônica da Rocha Bezerra, dos quais descende a mãe de Nísia Floresta, Antonia Clara Freire. Fonte: "Os Troncos de Goianinha", de Ormuz Barbalho, diretor do Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte, um dos maiores genealogistas potiguares. O livro pode ser pesquisado no Museu Nísia Floresta, no centro da cidade de nome homônimo. Luís Carlos Freire é estudioso da obra de Nísia Floresta, membro da Comissão Norte-Riograndense de Folclore, sócio da Sociedade Científica de Estudos da Arte e da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência. Possui trabalhos científicos sobre a intelectual Nísia Floresta Brasileira Augusta, publicados nos anais da SBPC, Semana de Humanidade, Congressos etc. 'A linguagem Regionalista no Rio Grande do Norte', publicados neste blog, dentre inúmeros trabalhos na área de história, lendas, costumes, tradições etc. Uma pequena parte das referidas obras ainda não está concluída, inclusive várias são inéditas, mas o autor entendeu ser útil disponibilizá-las, visando contribuir com o conhecimento, pois certos assuntos não são encontrados em livros ou na internet. Algumas pesquisas são fruto de longos estudos, alguns até extensos e aprofundados, arquivos de Natal, Recife, Salvador e na Biblioteca Nacional no RJ, bem como o A Linguagem Regional no Rio Grande do Norte, fruto de 20 anos de estudos em muitas cidades do RN, predominantemente em Nísia Floresta. O autor estuda a história e a cultura popular da Região Metropolitana do Natal. Há muita informação sobre a intelectual Nísia Floresta Brasileira Augusta, o município homônimo, situado na Região Metropolitana de Natal/RN, lendas, crônicas, artigos, fotos, poesias, etc. OBS. Só publico e respondo comentários que contenham nome completo, e-mail e telefone.

segunda-feira, 31 de julho de 2023

quinta-feira, 27 de julho de 2023

Memória de São José de Mipibu


Num dia de festa na terra do açúcar amargo. Vemos aqui o monsenhor Antônio Barros, pároco de São José de Mipibu, Agnelo Alves (prefeito de Natal), José Pinto Freire, (empresário, ex-prefeito e ex-presidente da Câmara de Natal, irmão do ex-senador Jessé Freire), Sebastião Amorim de Souza (prefeito de Areia Branca, tendo sido vereador e presidente da Câmara Municipal de Areia Branca por diversas legislatura. Foi ainda, diretor do Hospital-Maternidade Sara Kubitschek e comerciante por décadas). 


A imagem, até então inédita, se soma ao acervo regional. Sebastião Amorim de Souza falecido em 1994, aos 94 anos. Monsenhor Antonio Barros faleceu em 2000, aos 86 anos, Agnelo Alves faleceu em 2015, aos 82 anos e José Pinto Freire faleceu em 2016, aos 95 anos de idade. As crianças da imagem não faço a menor ideia sobre quem são. Supostamente estão vivas, hoje. Suponho que um dos demais homens adultos seja o prefeito de São José de Mipibu, mas o destrinçar fica para os universitários... 

quarta-feira, 26 de julho de 2023

domingo, 23 de julho de 2023

Digital literária, artística e outras digitais...

Miró.

 
Escrevendo sobre Literatura, cunhei a expressão “digital literária”. Uso-a para me referir ao modo da escrita de alguns escritores. Dia desses li um breve texto na postagem de uma artista plástica afirmando que um artista não tem uma característica, mas várias características. (obviamente que ela se referia às obras). 

O papa da Literatura Portuguesa, Fernando Pessoa tem heteronônimos como Alberto Caeiro, Ricardo Reis e Álvaro de Campos. Em suas obras encontramos poesias, poemas, mensagens, ensaios, dramaturgias… E cada Fernando Pessoa transmutado em seus pseudônimos carrega uma característica diferente. Como se todos tivessem almas diferentes. Quem conhece com profundidade Fernando Pessoa, e porventura desconhecesse os seus pseudônimos (como se isso fosse possível),  e o lesse sem sabê-lo sê-lo ele (desculpe o quebra língua), perceberia que aquele material é assinado por Fernando Pessoa. Chamo isso de “digital literária”. 

Há pessoas múltiplas. Elas escrevem poesia, contos, romances, crônicas, peças teatrais, pintam telas, são calígrafas, escrevem textos históricos, fazem cenografia e mais meia dúzia de afazeres. Sua “digital” é essa.
 
Kandinsky


Nas Artes Plásticas isso ocorre da mesma forma. A “digital artística” é claramente perceptível nas obras de cada pintor. O pintor abstracionista russo Kandinsky, por exemplo, o homem que inaugurou o abstracionismo no planeta Terra, cujas obras estão todas - pasmem! - no MOMA, Estados Unidos da América, por mais que a maioria sejam “parecidas”, identifica-se facilmente às suas digitais artísticas. Mas ele também pintou realismo (uma dessas obras está na Sérvia). Por incrível que pareça, a Rússia não tem quase nada de Kandinsky. É longa história…

O que quero dizer é que, seja qual for a escola, o estilo, a característica, há uma digital nesses fazeres artísticos. Só há uma digital. É o que chamo de “digital artística”. Isso é visível no escritor/pintor/novelista/teatrólogo/etc. Quem não identifica Guimarães Rosa? Quem bate o olho e não reconhece Flávio Freitas, Doryan Gray (seja tapeçaria,tela etc)? Quem não conhece o estilo de Assis Costa, Levi Bulhões etc? Chagall e Dali são surrealistas. Cada um na sua digital. É possível confundir Miró com Kandinsky? Pessoas inexperientes os confundem, mas eles são completamente diferentes entre si. Mesmo que o artista porventura salte do abstracionismo ou surrealismo para o realismo ou qualquer outro estilo, o metódico observador o detecta, pois captura a digital.

Certa vez precisei encomendar uma perícia grafotécnica na Polícia Federal, em Natal, a partir de duas peças escritas à mão. O resultado comprovou que todos os escritos foram feitos pela mesma pessoa. Isso foi em 1994, mas ainda me recordo do laudo escrito, o qual me impressionou devido às considerações científicas contidas, por exemplo, a expressão “movimentos sinérgico dinâmicos” para se referir ao modo peculiar da pessoa que escreveu, dentre uma infinidade de expressões científicas que não me lembro mais, porém havia dados que simples mortais são incapazes de perceber e que são as pistas que reveladoras de autoria (a pressão da ponta da caneta no papel, a distância entre uma letra e outra, o I parecido com E, o pinguinho no I (que muitos fazem uma bolinha), o T que na verdade é um l cortado como um T, enfim.

Creio que o conjunto de movimentos que se dão quando escrevemos um texto manuscrito é a nossa “digital caligráfica”, algo do tipo. Confesso que esse laudo me impressionou muito. Uso o exemplo da perícia grafotécnica para justificar o ato de pintar. Por exemplo, a nossa mão tem uma expressividade invisível quando está pintando, mas a “digital artística” se revela na pintura, quando o quadro vai para a exposição e o vemos na parede. Quem, por exemplo, não conhece os casarios de Estelo, de Mipibu, ou as feiras extraordinárias de Levi Bulhões, natalense radicado em Parnamirim?

Há pintores que pintam segurando o pincel na ponta do cabo, outros, no meio, outro, na base. Uns intercalam espátula com pincel, palitos, dedos etc, e esse modus operandi significa a sua “digital artística”. Transportando o raciocínio para outra área, entendo que a “digital literária” se formata a partir da “liquidificação” de fatores como: o que o autor leu, o habitat onde vive, sua sexualidade (mulher e homem veem as coisas diferentemente), aspectos filosóficos, a religião praticada, ou o próprio ateísmo etc. Característica não é digital, mas digital é uma série de características. Um detalhe: essa digital está em toda forma de expressão artística (digital teatral, digital coreográfica, o diabo a quatro…

Pois bem, rememorando a afirmação da artista plástica que defende que os artistas têm várias características, entendo diferente. O artista plástico até pode pintar diferente, saltando do realismo para o abstracionismo, dadaísmo, impressionismo… Pode até escrever contos, atuar em teatro etc, mas a sua “digital artística” é única, ou seja, é a sua marca, seja em qual estilo/característica que ele use.  E ele será reconhecido por isso. E, se de fato for bom, será conhecido também…

sexta-feira, 21 de julho de 2023

Exposição "Chão dos Simples" , de Manoel Onofre Jr. Um encontro da Literatura com as Artes visuais potiguares. Amanhã, dia 22 de julho, a partir das 10 horas, abertura da Exposição "Chão dos Simples", de Manoel Onofre Jr. com curadoria de Manoel Onofre Neto e Angela Almeida.




O grande poeta e meu conterrâneo Manoel de Barros declarou em um de seus livros: “Tudo o que eu não invento é falso”. Trazendo o raciocínio para o "Chão dos Simples", creio que esses contos nascidos na imaginação fértil do escritor Manoel Onofre Jr. são as histórias falsas mais verdadeiras que existem. Lendo-as, lemos não apenas o regional, mas o mundo. E pensamos, e filosofamos a partir dos seus personagens e tudo mais que se revela nas páginas. O quintal de Manoel Onofre, lá em Martins, é maior do que o mundo.

Manoel Onofre por vezes nos transporta a Policarpo Feitosa, José Lins do Rego, Cervantes (no seu Dom Quixote) e até Dostoiévski. Não apenas em “Chão dos Simples”, mas no conjunto das suas obras. Porém “Chão dos Simples” tem bem forte as cores desses notáveis, a meu ver. Daqui também me recordei dos escritos de Iaperi Araújo.

A Literatura é uma mágica extraordinária, tem o poder de fazer com que o leitor encontre livros dentro de livros, encontre personagens daquele livro naquele livro. Isso com singularidade, afinal há escritores que conseguem não serem iguais a outros escritores e saem do lugar comum, e mesmo que seu pincel imaginativo respingue matizes parecidas, são diferentes em sua essência, em sua digital literária. Manoel Onofre Neto foi feliz por fazer passear “Chão dos Simples” pelas obras de irretocáveis pintores norte-rio-grandenses. Casamento perfeito. Ideia singular.

A exposição tem um caráter inédito ao promover o encontro das Artes Plásticas desses renomados pintores potiguares com a bela obra literária “Chão dos Simples”. Encontro de excelências.

Manoel Onofre Jr. “pintou” diversos contos nessa obra, inventando uma cidadezinha de ruas de terra batida e casinhas de taipa saída de sua imaginação. Mas no chão potiguar, chão de sua infância, chão que ouviu o seu primeiro choro. Chão cujo povo simples, envolto em cenário bucólico, se tornou matéria prima para contar e recontar – de maneira deliciosa e muito pessoal – as mais diversas histórias.

Seus contos trazem cores hilárias, amargas, pitorescas, tristes... Se em suas histórias são encontrados fatos parecidos com reais, e até acontecidos entre os próprios familiares, mas que são inventados, eis um pintor da vida.

Tendo escrito “Chão dos Simples” em 1983, há 40 anos, ele desnuda pessoas e fatos com a classe de um escritor que nasceu experiente, pronto, assim como pronto nasceu Estelo, um dos artistas plásticos mais singulares do Rio Grande do Norte, dentre tantos. Quantas histórias de Manoel Onofre Jr. saíram dos casarios parecidos aos encontrados nas telas de Estelo e nos cenários dos demais artistas?

Em 1952 o dramaturgo Nelson Rodrigues declarou, numa entrevista que “A literatura está deplorável. Os humoristas, profundos. O mal da literatura brasileira é que nenhum escritor sabe bater um escanteio”.  Isso até pode ser verdade em seu tempo, mas Manoel Onofre conseguiu, sim, bater um escanteio. Nelson, que era um devorador de livros, também disse que “O leitor ideal é o que lê os mesmos vários livros todos os dias”.

Reler Manoel Onofre Jr. é reencontrar novas nuanças em suas histórias, descobrir nova característica nos personagens, reaprender, filosofar, ouvir o mato, o vozerio da feira, o badalar do sino da igrejinha, o fremir dos voejos de arribaçãs, enxergar novos cenários... sem contar a poeticidade e as viagens filosóficas nele contida.





quarta-feira, 19 de julho de 2023

Milan Kundera - “A insustentável leveza do ser”...

 


A cidade em que nasci foi inventada por um homem extraordinário. Ele veio fugido da Tcheco-Eslováquia, hoje República Tcheca, perseguido pelos nazistas. Jan era visionário. Se vivo, ainda estaria anos-luz adiante… Eu tinha 19 anos de idade em 1986, ainda descobria o que era a vida lá pelos sertões do Mato Grosso do Sul, quando soube de um escritor também tcheco-eslovaco. Não sei onde li a informação, mas aquilo me interessou. “Tenho que ler esse livro, é de um escritor da Tchecoslováquia”, como se ser tcheco significasse o máximo. 



 
Mas o meu julgamento ocorria porque eu sempre quis ler os livros de Jan, mas eram todos em eslovaco (era impossível). Então, ler Milan Kundera, em português, me aproximava daquele homem espetacular. “Quero ver como um tcheco escreve”. Foi o primeiro livro para adulto (de autoria de estrangeiro) que li. Antes, conhecia apenas Andersen, Esopo, Os Irmãos Grimm… coisas bem infantis.



 
Milan Kundera me impressionou tanto que escolhi esse livro (o original mesmo, da minha adolescência) para estar guardado comigo até hoje, dentre quase todos os demais de Kundera. Ele morreu, agora, no último dia 11 de julho, caminhando para os 100 anos (contava 94 anos). Vinha adoentado há um bom tempo. Sempre digo que tenho pena quando pessoas geniais morrem porque elas são como os jardins do parque de Keunkenhof em Rijnland, Amsterdã, na Holanda.



 
Sempre gostei de escrever, e Kundera, dentre tantos, me ensinaram muito. Na obra “A insustentável leveza do ser” ele aborda alguns de seus temas preferidos: sexualidade, filosofia, com personagens refletindo sobre a ironia e a insignificância da vida. Era um escritor-filósofo. Ele vivia exilado na França. Deixou a Tchecoslováquia em 1975 e nunca mais retornou à sua cidade natal. Ele se fez conhecido por esquadrinhar a mente humana, seus pensamentos, sentimentos e crenças do indivíduo, assim como sexo e relacionamentos. Em sua obra-prima, A Insustentável Leveza do Ser, Kundera contou a história de um triângulo amoroso tendo como pano de fundo a Primavera de Praga.



 
Hoje lembrei-me dele. “Preciso escrever alguma coisa sobre esse homem fantástico, meu professor”. Meus livros estão numa ordem que só eu sei. Bati o dedo nele e o retirei da prateleira. Ainda não cheira a velho, mas traz o cheiro dos voos imaginários… então peguei dele e pus-me a folheá-lo. É antigo o meu hábito de escrever nos livros, rabiscá-los todo com coisas que acho interessantes, ideias que pululam como insights, fusão de pensamentos, poemas que saltam do nada, tema para uma crônica… só mesmo eu para entender tantos rabiscos.



 
Saindo um pouco da caixa, foi em Milan Kundera que descobri para que serve aqueles camarotes dependurados nas paredes das igrejas antigas. Curiosamente a de Nossa senhora do Ó tem esse design. Parece engraçado, mas esquadrinhando o livro vi dezenas de anotações e essa era uma delas. Na verdade, Kundera me levou ao pensar e não perdoar certas coisas. Ele mesmo não perdoou muitas coisas coisas. E estava certo. Há coisas que não merecem perdão e não me venham com argumentos poéticos ou religiosos… chega!
 


Só sei que reli umas três vezes “A insustentável leveza do ser”. Reler é reaprender. Li quase todos os demais livros dele (ensaios, romances e até uma peça de teatro muito curiosa “Jacques e seu mestre, homenagem a Denis Diderot em três atos”. Mas é assim mesmo. A morte vem para nos igualar. Mas algumas pessoas demoram muito para morrer. Milan levará, creio, uns 500 anos para se demorar por aqui… ele, sim, foi a insustentável leveza... 

 


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domingo, 16 de julho de 2023

Sanderson Negreiros e Tarcísio Medeiros... Invisíveis Visíveis...

Sanderson Negreiros

Ano que vem completará meio século da primeira edição de “Aspectos geopolíticos e antropológicos da História do Rio Grande do Norte”, uma das obras de Tarcísio Medeiros, insigne escritor norte-rio-grandense. Li-a em 1993, então aluno na UFRN, na aula de Cultura Brasileira, por orientação do também ilustre potiguar Sanderson Negreiros.

Sanderson tinha um modo interessante de construir o conhecimento com seus alunos. Lembro-me que certa vez, em sala de aula, quando ele citava Dorian Gray Caldas, disse “querem ir em sua casa, conhecê-lo”. E fomos naquele instante. Assim conheci outro renomado mito da terra de Câmara Cascudo. Aquilo me marcou. 

Tarcísio Medeiros


Outra vez eu havia faltado na semana anterior. NÃO EXISTIA WHATSAPP.  Quando voltei, soube que teríamos que ler alguns livros para, depois, discuti-los. A dinâmica seria assim: a pessoa que leu discorreria sobre a obra. Sanderson Negreiros, o professor, faria possíveis observações, e o restante da turma, que não havia lido aquele livro, ouviria a explanação fazendo perguntas e outras abordagens. Assim, todos saberiam sobre todos os livros.

Como eu havia faltado, sobrou para mim “História da Alimentação no Brasil”, de Câmara Cascudo. Ninguém quis ficar com ele, pois é tão grande que algumas editoras o publicam em dois volumes. No caso, li todo num livro só. As obras eram de Sanderson. Li como uma criança degustando o seu sorvete preferido. É simplesmente fascinante e foi um dos livros que mais me marcaram.

Essas foram duas passagens marcantes com o professor Sanderson, na UFRN...
Eis que chega em minhas mãos, ontem, a obra “Aspectos geopolíticos e antropológicos da História do Rio Grande do Norte”, de autoria de Tarcísio Medeiros. Até aí, nada demais além da importante obra. Mas ela continha esses invisíveis que a mim, pelo menos, impressionam e que acho digno dar-lhes  visibilidade.



O livro, apesar de carregar 49 anos de idade, está intacto, mas o que mais chamou a minha atenção foi um cartão onde está datilografada uma mensagem escrita pelo autor, dirigida a Sanderson Negreiros, além da dedicatória.

O texto traz informações preciosas em que é possível viajar até a Redinha e ver esses dois mitos sentados no alpendre de uma espaçosa varanda jogando conversa fora. Dentre elas as ideias que ele findou escrevendo nessa obra.

O que me encanta é a humildade. Ele fala do livro como se não fosse o tesouro que é. Dá impressão que é um desses livros que você lê, lê e não há o novo, o inédito, o fascinante... só mesmices.

O cartão foi escrito no dia 22 de maio de 1973. Tarcísio tinha 55 anos de idade e Sanderson 34. 21 anos de experiência a mais carregava Tarcísio, e ele acolheu sugestões do jovem Sanderson. Humildade e respeito a um jovem que com certeza muito cedo se revelou genial.




Ele assina o cartão e com a mesma caneta Bic diz “N.B. Releve os erros tipográficos”.Quem daria importância para “erros tipográfico” diante daquele pergaminho de conhecimentos?
O que está ali que foi sugestão de Sanderson? Quais as lacunas dos “grandes mestres” citadas por Tarcísio? São esses invisíveis que nutrem a minha imaginação... Fico pensando o que conversaram esses notáveis.

O clipe estava se desmanchando; deixou nódoas no cartão e na página. Senti-me como os egiptólogos descobrindo câmara em pirâmide ao retirar a peça metálica e imprestável, ali colocada por Tarcísio e retirada por mim. Sanderson foi tão bom que deixou para alguém esse presente.

Tarcísio partiu em  2003, aos 85 anos. Sanderson se encantou em 2017, aos 78 anos. Ambos deixaram obras preciosas para o Rio Grande do Norte e para o Brasil, tanto assinadas por eles quanto contidas em suas bibliotecas.


https://www.facebook.com/reel/7037327389628361?mibextid=6AJuK9&s=chYV2B&fs=e

HONORIS CAUSUS (O PT e a Cidade Alta na visão de um anônimo)

 

Google Maps


Eventualmente tomo um caldo de cana com coxinha de camarão na “Casa da Maçã”, encostada na Delícias do Mate, esquina das ruas Coronel Cascudo com Princesa Isabel, na Cidade Alta. Digo eventualmente porque nos meus 56 anos de idade, não é bom abusar dessas iguarias, então, quando me programo para exercer tal abuso, esqueço o mundo e comporto-me como quem escreve um poema, sem qualquer sentimento de culpa. Talvez como quem fosse morrer amanhã e precisasse levar o gosto desses acepipes maravilhosos para o túmulo…


Eis que sentando-me numa daquelas mesas envoltas em cadeiras, defronte ao estabelecimento, ouço uma voz afirmando que o PT estava acabado com a Cidade Alta. Olho para o lado e dou-me com um grupo sentado à mesa ao lado. Então programo os meus ouvidos no modo “captação total das vozes”. Era um senhor, dois rapazes e uma moça. O senhor alegava que a Cidade Alta, antigo bairro de Natal, estava se acabando, o comércio fechando, o movimento diminuindo, “o PT quase  havia acabado com as Lojas Americanas, mas conseguiu acabar com a Lojas Marisa”…


Dizem que “ouvido não é penico”, mas, confesso, quando estamos na rua, devemos programar as nossas “oiças” no modo “penico”, afinal não podemos andar pelo mundo em constantes desacordos com estranhos, e como eu estava em estado de êxtase alimentar, não quis gastar a minha boca com coisa que não fosse deleitar-me com as delícias que consumia. Gastei apenas os ouvidos. E minha decisão foi sábia, pois imediatamente ouvi um rapaz falando por mim, discordando totalmente daquele homem equivocado. As palavras do jovem pareciam sair de dentro dos meus neurônios. Então passei a comer aquela conversa também.


O rapaz explicou cientificamente que as Lojas Marisa havia fechado porque os donos fizeram o mesmo que os donos das Lojas Americanas, cujo rombo foi de bilhões, que houve incompetência admistrativa etc. E que isso não teve nada a ver com o PT. A moça, ampliando o sabor daquela conversa, reforçou as palavras do rapaz. O outro jovem só ouvia, como quem concordasse com o senhor iniciante da palestra, mas por faltar-lhe argumentos, só assistia o diálogo.


Eis que o senhor, não querendo dar por vencido, listava uma sequência de pequenas lojas fechadas naquelas imediações, reforçando a culpa petista. Logo, o rapaz, que parecia bem enfronhado no bairro, destrinça a situação das casas comerciais fechadas, explicitando cada caso, e no frigir dos ovos, a Pandemia havia gerado aquele fracasso. Nesse ponto, sou testemunha. Vi várias lojas fechando durande a Pandemia. Essa área da Cidade Alta tem uma infinidade de pequenas casas comerciais cujos produtos oferecidos oscilam. Abre um armarinho que funciona durante seis meses e fecha. Depois instala-se no mesmo local uma lanchonete que não chega a um ano de funcionamento. Em seguida vem uma loja de roupas que não esquenta o local. O Google Maps que o diga. É só fazer um passeio digital e constatar a variedade de fachadas com nomes distintos. Creio que seja uma questão de inexperiência em empreendedorismo ou concorrência acirrada. Suponho. Também ouvi dizer que alguns comerciantes iniciantes querem ganhar dinheiro com a cara. Comércio é renúncia. O dono tem que “morar ali” e ter consciência de que um dia está ótimo e o outro, não.


Enfim a conversa se dava nesses conformes, quando sorvi o último gole do açúcar líquido concentrado, também chamado de caldo de cana, e degluti o último pedaço da pomposa coxinha de camarão, também chamada de bola de gordura. Delícias estonteantes que nos acalmam, nos desarmam de brigas com gente desnutrida de visão. Eu ia bem invadir a prosa e brigar com aquele homem! Claro que não. Aqueles jovens falaram por mim…


Depois, conversando com Alysgardênia, disse desse episódio. As pessoas, hoje em dia, salvas as exceções, tem a mania de não gostar de algo, e usar esse algo como culpa das desgraças que vê. Isso é ingênuo e sem noção. De fato a Cidade Alta está numa aparente decadência comercial. Isso não é novidade. Hoje mesmo, 15.7.2023, estive na Rio Branco com Alysgardênia e ela comentou sobre a baixa frequência de pessoas. Recentemente, assisti a uma reportagem na InterTV Cabugi sobre esse mesmo fenômeno, mas no bairro do Alecrim. Os comerciantes reclamavam sobre lojas fechando as portas e público diminuto.


É esquisito afirmar, mas isso tudo é reflexo do próprio progresso. O progresso traz maravilhas, mas arrasta junto a ele muitos estragos em diversos aspectos. Natal deu um salto. A Zona Norte cresceu vertiginosamente. Natal se confunde com Parnamirim, e Parnamirim em breve se confundirá com São José de Mipibu. Em cem anos, essas cidades serão uma só. Sem lugar para enfiar uma casa.


O progresso muda tudo. Supermercados e Armazéns imensos estão dentro de shoppings e nas margens das rodovias. Quantos grandes armazéns e atacadões se espalharam em toda a geografia de Natal? Inúmeros. Há trinta anos tudo isso se resumia ao Alecrim e a Cidade Alta (grandes pontos comerciais). O que segura, de certo modo, hoje, o Alecrim, são alguns armazéns, mas isso também vai mudar (Pelo andar da carruagem). Ressalvando-se que esse fenômeno não é exclusivo de Natal, mas acontece em quase todo o Brasil.


Essa coisa que esse senhor - que eu prefiro chamar de inocente - ao culpar o PT, nada mais é que o progresso acontecendo em novos lugares. Antes, onde tudo era mato, hoje é um gigantesco armazém. Onde era um terreno baldio, hoje é um imenso condomínio habitacional. A geografia muda e com ela mudam os hábitos, o trânsito etc. Os novos bairros, que antes eram apenas residenciais, cujos moradores vinham para o Alecrim e Cidade Alta para fazerem compras, hoje estão permedados de lojas, agências bancárias, feiras, supermercados, lotéricas, praças etc. Tem de tudo na ruam onde moram, ou próximo. Quem vai sair da Zona Norte para comprar grãos se lá tem preço até melhor?


Esse fenômeno de desocupação comercial se estende também à desocupação residencial. Há muitas casas fechadas no centro de Natal. A moda no momento é morar em condomínio. É um fenômeno nacional. As pessoas se sentem mais seguras, dizem que dormem de janelas e portas abertas, e nada contece (diferente de estar numa casa no centro de uma metrópole). O condomínio é outro causador dessa evasão comercial, pois o povo deixa determinados bairros em massa, diminui os clientes e as lojas deixam de vender. Quisera que todos pudessem dormir de portas e janelas abertas no centro de Natal, sentar nas calçadas e ter, de certo modo, aquele antigo costume mais humanizado, mas o progresso traz mazelas com ele. 


As autoridades falam sobre plano diretor, estatuto das cidades, plano de urbanismo,  reurbanização, reocupação de áreas,  são tantas expressões… mas não praticam políticas públicas civilizadas nos locais onde tais problemas se agravam. Tudo está mais no campo dos discursos e de fotografias para constar. Segurança pública e educação vem a calhar como nunca nesse assunto. A Câmara de Dirigentes Lojistas deveria protestar mais, buscar caminhos. Na verdade, esse assunto é muito complexo e envolve muitas causas. 


Pois bem, quando esse senhor, da história lá em cima falava o tempo todo do PT, creio que, na verdade, ele queria dizer sobre os Políticos Tortos (PT). Natal está cheia de Políticos Tortos, satisfeitíssimos com seus altos salários e benesses. É uma pena que apenas esses senhores tenham o poder da caneta. Natal poderia ser pioneira num grande projeto que desse uma virada nesse fenômeno de evasão das áreas nobres da metrópole. Mas isso exige muito compromisso e ação, coisa que não costumamos ver muito em nosso estado. Não tem nada a ver com o PT (partido). Todos são culpados. Temos um povo inerte, que entrou em casa, fechou a porta, que o mundo se exploda. Não importa que saindo de casa, ele mesmo pode ser explodido a qualquer minuto.

Pequi no frango tem cheiro de lembranças inesquecíveis...

 


Os botânicos dizem que o fruto é do reino “plantae”, espécie C. Brasiliense, da família Caryocaraceae, classe Magnoliopsida, ordem Malpighiales, divisão Magnoliophyta. Mas não precisa toda essa latinidade para dizer - a quem não conhece - que “Pequi” é um fruto. Tem formato de um grande cajá ou um embu, cuja polpa é densa e firme. 

 

A cor é essa vista na fotografia. O fruto se forma dentro de uma proteção/cápsula, semelhante a um coco meio deformado, todo verde embranquiçado. É uma capa grossa. Quando maduro a proteção se abre um pouco, permitindo que se retire o fruto que pode ser consumido, que é exatamente o “pequi”. 

 

Cada bola tem até cinco bagos, mas é mais comum trazerem três belos frutos. O cheiro é bastante peculiar. Mata que tem pequiseiro se localiza a árvore pelo olfato. Pequi, para mim, tem cheiro de infância, cheiro inigualável do fogão a lenha e sabor inconfundível das comidas da minha mãe. Quando criança, íamos à mata colher pequi. Minha mãe usava eventualmente no preparo do arroz ou do frango, ao modo dos flagrantes dessas fotografias. 

 

Conservei essa tradição materna até mesmo na panela de ferro. É indescritível o sabor da comida preparada com pequi em panela de ferro. Também se faz licor. O preparo de molho de pimenta com pequi é coisa do outro planeta. Quando Fídias foi ao Mato Grosso do Sul, trouxe dois potes, enviados por uma cunhada, colhido na mata que emoldura a cidade. Trouxe Tubaína e erva de tereré. Para mim é presente sagrado. Então, eventualmente, dou-me a esse regalo como criança degustando guloseimas preferidas.

 

Criança nascida no Mato Grosso do Sul é habituada a uma arte que deveria ser circense: “fazer malabarismo com pequi na boca”. Tarefa tão deliciosa quanto perigosa. E nesse folguedo os dentes vão roendo a polpa como um engenho mecânico, até chegar ao caroço despolpado. 

 

Criança versada no costume faz isso no modo “mecânico”. Quando dá fé, sem perceber, expurga o caroço como fazem os velhos cachimbeiros que cospem tão forte como se a boca fosse catapulta.
Tem um detalhe, menino criado em metrópoles, forrado de caprichos, não deve chegar nem perto de pequi para degustar. 

 

Roer pequi é para os fortes. Seu caroço possui espinhos tão finos como as palmas daqui do Nordeste. É espinho que parece pelo. Finca na língua, na gengiva, no palato e pode até levar à morte. Pequi é para menino-índio, nascido grudado aos Guarani-Kaiowá. 

 

Eis que preparando frango com pequi descortinou-se em minhas lembranças esse fragmento de infância. Pequi, inesquecível pequi, delicioso pequi. Árvore sagrada. 

 


 

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Problemas de feminismo - Por Rachel de Queiroz - 1952

 


Um grupo de amigas - caras amigas - acaba de me fazer um apelo que vá trabalhar ao lado delas em determinada sociedade de mulheres.

Argumentam bonito, explicam que não se trata de feminismo, que nenhuma das consócias tem nada da virago meio masculina celebrizada pela caricatura, que elas não querem entrar em concorrência com os homens, mas mas apenas para lutar pela defesa dos direitos da mulher, ainda hoje espezinhados pela sociedade e pela legislação em vigor.

Ora, minhas flores, mulheres reunidas fazendo discursos, escrevendo manifestos, batalhando pelo progresso do sexo, lutando pelos nossos famosos direitos, que é isso senão feminismo?

Dizem vocês, a certa altura: “Nenhuma de nós gosta do chamado feminismo…” O ponto não é bem esse. O importante, para mim, não é que eu goste ou que não goste; o ponto, comigo, é outro: o importante é que eu não acredito em feminismo. Não creio numa rede de interesses comuns que ligue as mulheres do mundo, separando-as dos homens e dos interesses masculinos. Acho que vai uma distância muito maior entre uma comunista e uma católica, ambas mulheres, do que aquela que separa um homem e uma mulher das mesmas convicções.

Também não acredito na igualdade dos sexos.Afirmar isso, hoje, já é um truísmo. Pois é. E como acontece com quase todos os truísmos, este é também uma verdade. Concordo que a nossa legislação sobre os direitos civis da mulher casada é irritante e injusta, mas soma-se à grand cópia de injustiças que correm mundo sob o nome de leis, e que é mister remediar, não porque sejam especificamente contra as mulheres, mas principalmente porque são injustas.

Continuando a falar com franqueza, chego a confessar que não tenho ideias muito seguras a respeito do papel que a mulher pode e deve desempenhar no mundo moderno. Se, por um lado, somos capazes de aprender muitas das coisas que os homens sabem, e se podemos dar conta da maior parte dos ofícios masculinos (talvez porque a civilização ocidental suavizou de tal modo a tarefa dos homens e a pôs ao alcance das mulheres…), por outro lado a nossa carga - biográfica, digamos - já é de si muito pesada para que procuremos outros encargos além do que a natureza nos reservou.

Nas cartas de vocês há uma que diz uma coisa muito engraçada: “A mulher moderna cansou-se de ser um simples animal reprodutivo”. Infelizmente, meu bem, a natureza não é progressista nem tem ideias modernas; a natureza, com a sua cegueira e a sua característica falta de imaginação, teima em fazer da mulher, moderna ou antiga, um mero animal reprodutor e aleitador. Por mais brilhante, intelectual, artista, ambiciosa que seja a mulher, não deixa por isso de ser - com licença da palavra - a fêmea da espécie, e ter ao seu encargo exclusivo o penoso trabalho de gestação e criação dos filhos. Que os homens, tudo o que eles fazem pela prole é o que se pode chamar de trabalho voluntário e não compulsório, como o nosso…

Nessa teima da natureza nasce o grande conflito da mulher de carreira, da mulher profissional, que pelos seus dotes intelectuais, capacidade de trabalho e agressividade ousa e consegue competir com os homens nos terrenos que até bem pouco eram reserva particular deles. Conflitos com os homens, pode-se dizer que já não existem, que eles já estão vencidos e convencidos.O conflito é com ele própria. A mulher ainda não descobriu uma fórmula que resolva o problema da maternidade quando esta entra em choque com a profissão, o que quase sempre sucede. É sistematicamente obrigada a escolher entre a carreira ou os filhos: ser ou a amazona, ou a mãe de família. Nenhuma das outras soluções experimentadas resolve: porque a melhor delas, que são as “creches”, ou as armas, governantes, etc., não representam uma solução, mas simplesmente uma transferência. Arranja-se uma mãe substituta, mas a necessidade da mãe permanece e tem que ser suprida; e o problema não foi resolvido, foi passado adiante. Há as que tentaram ao mesmo tempo ser uma profissional e dar conta dos filhos: mas isso representa uma sobrecarga pesada demais, acaba sempre resultando no mesmo: o sacrifício de uma das duas tarefas - a família ou a profissão. Com isso quero dizer que os atuais problemas femininos não consistem mais em arrebatarmos dos homens este ou aquele direito - que já o estamos adquirindo sem disputa; os poucos que os coitados ainda retêm são mais simbólicos do que reais e apenas servem para lhes salvar o amor próprio. O nosso conflito básico é com a nossa condição de mulher - e representa em verdade um desses dramas terríveis e insolúveis da natureza humana, como o do amor, por exemplo, e para os quais, aparentemente, não há forma conhecida de solução. O melhor ainda é a gente tentar uma acomodação à inglesa - quero dizer, empregando o velho sistema inglês de compromisso. Se o mundo moderno nos abre maiores horizontes, se nos permite uma porção de profissões, e interesses que nos eram vedados há alguns anos atrás, aproveitemos essas oportunidades nas medidas das nossas possibilidades, mas sem muito arrojo, sem muita soberba. Porque, a menos que reneguemos a nossa própria condição de mulher, faça a gente o que faça, dirija aviões, arengue as massas, dispute na política, ajude a governar o Estado - lá escondida nas nossas entranhas de mulher estará sempre presente a misteriosa máquina, pronta a funcionar sem respeitar cartaz nem coroa, pronta a transformar a valquíria audaciosa que toma o lugar dos homens na simples e eterna mulher que carrega um filho consigo e por isso mesmo se torna fraca e desinteressada do mundo, carecida de proteção e ajuda. Isso, meninas, pode ser uma verdade desagradável, mas é também a verdade nua e crua. E, sendo assim, para que perder tempo com feminismos?
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RACHEL DE QUEIROZ é escritora cearense. Este artigo foi publicado na edição de 26 de julho de 1952 da revista O Cruzeiro. @herdeiros de Rachel de Queiroz
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OBS. Transcrevi este artigo para a minha página por achá-lo um dos mais curiosos de Rachel de Queiroz, na minha opinião. Obviamente que há um contexto o envolvendo, mas preferi não emitir nenhuma opinião sobre o mesmo. Deixei para você que ora lê. O texto fala por si. Raquel era trotskysta, comunista e ateia.

sábado, 15 de julho de 2023

Uma crítica que mais parece demonstração de inveja e preconceito...



Sempre leio as críticas literárias da professora Lígia G. Diniz, doutora em literatura e professora da Universidade Federal de Minas Gerais. Normalmente suas opiniões são implacáveis. Ela é fria e parece não se preocupar em frustrar o autor/escritor, desestimulando-o. Até aí, não a critico. É o estilo dela e o crítico não deve ter receio de opinar tendo como base os critérios estabelecidos. Mas, confesso, o seu texto (gigante) sobre Salvar o Fogo, do escritor baiano Itamar Vieira Jr. é pautado de racismo, preconceito e, por que não, inveja. Os especialistas dizem que os invejosos queriam estar na pele das pessoas que são admiradas por sua inteligência, pelos múltiplos talentos, pelo respeito e admiração que recebem do público, o impacto que ela causa em determinadas circunstâncias, seu potencial criativo etc, e por não conseguirem, frustram-se e tentam destruir o conjunto de valores em torno da pessoa invejada. Ninguém rouba o que está dentro do cérebro alheio, portanto os invejosos morrerão com esse defeito deplorável. Que me perdoe a professora, mas a crítica dela é fruto de inveja pura. Ela demonstra dificuldade para aceitar um escritor negro, nordestino e iniciante, como se o gigantismo desse homem (Itamar Vieira), que escreve como quem tem uma vivência de mil anos como escritor, não fosse nada. A julgar apenas pelo seu texto crítico, eu poderia até estar sendo injusto em minha narrativa, embora na referida crítica, o leitor constata logo de cara preconceito e inveja puros. Mas quando passei a ler e assistir opiniões e calúnias escabrosas que ela passou a dizer depois do tal texto, inclusive no Twiter e em outros canais, confirmei isso. É uma antipatia gratuita. Como se ela acreditasse que a sua condição de crítica literária fosse irreparável e incontestável. Inocente ela. Creio que um crítico deve ser eternamente imparcial. Será que ela não queria estar na pele do escritor Itamar Vieira? Pela gratuidade de suas narrativas injustas... creio que sim. Mas, como disse, ela pode até tentar destruir o sucesso explosivo desse prodígio literário, mas jamais conseguirá roubar o que ela traz, amadurecido no seu cérebro. Invejosa!



 

sexta-feira, 14 de julho de 2023

Restaurar é isso (Residência do médico e deputado Afonso Moreira de Loyola Barata - Cidade Alta - Natal/RN)...

 

Residência do médico e deputado Afonso Moreira de Loyola Barata...

Construído no preâmbulo do século XX, na famosa rua Padre João Manoel, Cidade Alta, era a residência do médico e ex-deputado Afonso Moreira de Loyola Barata. Muito tempo depois, com sua morte, tornou-se o "Hotel Majestic". O tempo passou, entrou em estado de abandono total. Quando já ameaçava ruir, o Tribunal de Justiça do RN comprou o imóvel. Então, a partir de 2007, surgiu o "Memorial do Poder Judiciário Estadual Desembargador Vicente de Lemos". 



 

Acta noturna - Casa de Câmara e Cadeia de São José de Mipibu - Um registro de Mário de Andrade e reflexões afins...

 



Como todos sabem, Mário de Andrade fez um "tour folclórico" pelo Norte e Nordeste do Brasil, encampado pelo "Ministério da Cultura de São Paulo". Isso se deu nos primórdios da etnografia brasileira. Foi um amplo trabalho de registros audio-visuais. Riquíssimo. Em 1928 andou por terras potiguares percorrendo diversos municípios, colhendo as informações mais substanciais sobre o folclore de cada lugar: pessoas de destaque, expressões contidas nas danças, linguística, alimentação, artesanato, enfim hábitos e tradições de toda espécie. Fazia um apanhado da Cultura do povo. A caminho de Goianinha, onde visitaria o mestre "Chico Antonio", (1904-1993), o maior expoente do coco de embolada (tradição sonora da cultura popular nordestina), passou em São José de Mipibu e findou clicando essa bela construção. Mario estava paramentado com as mais avançadas tecnologias daquela época.  

 

Mario de Andrade - 1928

 

O prédio era a Casa de Câmara e Cadeia da localidade. Ficava quase defronte à Igreja Matriz de Santana e São Joaquim, uma das poucas única testemunhas que restaram até hoje. Pena! Seria um dos raros municípios brasileiros a contar com esse tipo de construção. O prédio funcionava como uma conglomerado de serviços: presídio (nesse tempo, eram poucos os "meliantes": só ladrões de galinha e revolucionários), Câmara de Vereadores e Delegacia. Se fosse hoje, estaria abarrotada de gente que é contra o Sistema, todos 'presinhos da Silva', a mando desse Desgoverno Federal.  São José de Mipibu  é um museu a céu aberto. Uma das cidades mais ricas em história, berço de fatos importantíssimos. Mas parece que alguns não dão valor a isso, principalmente algumas autoridades. A derrubada da Casa de Câmara é Cadeia é um dos maiores crimes contra o patrimônio histórico do Rio Grande do Norte. Não era um prédio de herdeiros (já que muitos herdeiros acham normal demolir). 

Chico Antonio

 

Mas nada justifica esse crime contra a História. O prédio estava intacto. A estrutura era de ferro, mas as autoridades da época achavam feio. Ainda bem que o genial Mário de Andrade andou por aqui. Do contrário, não existiria nem a fotografia, já que essa é a única que dá um close na arquitetura. Lastimável esse nosso Brasil de pessoas desmemoriadas e desmioladas. Falta civilidade. É duro saber que - pasmem -  algumas autoridades se ofendem quando um grito de protesto é lançado em defesa do Patrimônio Histórico. É  um problema de Educação e Cultura. Temo pelo que restou. Não vejo muito interesse. Ultimamente está na moda vidro, inox, alumínio, concreto armado. As pessoas sem formação acham bonitinho.

quinta-feira, 13 de julho de 2023

terça-feira, 4 de julho de 2023

Sagu da minha infância…


Quando nasci, dei-me com um habitat onde já havia chegado anteriormente seis Marias, incluindo a minha mãe. Cresci envolvido por cinco irmãs, num tempo em que fazer comidas e doces era uma espécie de exercício para o casamento futuro. “Toda moça deveria estudar para ter uma profissão, mas deveria também saber ser dona de casa”. Era o discurso materno. Desse modo, vendo as irmãs manobrando engenhosamente a cozinha, não havia como não aprender a fazer as coisas.

Creio que em outra vida fui formiga de açúcar, portanto fui seletivo nos aprendizados das Marias; abdiquei-me das comidas salgadas, ditas “comidas de panela”, e, embora maneje várias receitas desse inventário da infância e adolescência, elegi os doces para guardar na memória. Versei-me em todas as receitas que saíram do fogão da minha mãe, e trago esse diploma certificado em mim.

Toda vez que não estou engenhando nada, engenho doce. Entrego-me ao prazer de relembrar algumas guloseimas daquele tempo delicioso, então corro prepará-las, tendo, com nitidez, o caderno de receita em minhas memórias afetivas. Quando arrisco algum prato, volto à cozinha distante e cheia de lembranças inesquecíveis.

Ontem inventei de preparar sagu, um prato tão comum ao Mato Grosso do Sul como o mungunzá  é comum ao povo potiguar. A última vez que estive na minha terra natal, tive o prazer de degustá-lo diversas vezes, sob os préstimos da minha irmã mais velha, que prepara sagu desde que se entendeu por gente. É doce de certo modo demorado e exige cuidados na administração de cada produto. Fazê-los é praticamente um treino mental. Mas a receita ficou tão impregnada que não tive problema. Deu certo.

 A experiência de ser educado entre seis Marias legou-me um aprendizado que trouxe para a vida. Assim como a minha mãe, sou apaixonado por doces caseiros, e sempre que tenho a oportunidade, faço algum prato como quem compõe um poema, como quem retorna ao espaço mais delicioso da casa. Como quem está dentro de um sonho. Como quem agradece por ter se criado entre seis mulheres prendadas, cujas mais velhas tinham quase uma autoridade de mãe.

Foi com essa matriarcado que também aprendi a enxergar o mundo sob as lentes da amorosidade, da caridade, do voluntariado, do amor ao trabalho, e com a sensibilidade que hoje parece meio em extinção... Essas coisas também adoçam o mundo. O mundo carece dessa doçura... (2021)