ANTES DE LER É BOM SABER...

CONTATO: (Whatsapp) 84.99903.6081 - e-mail: luiscarlosfreire.freire@yahoo.com. Este blog - criado em 2008 - não é jornalístico. Fruto de um hobby, é uma compilação de escritos diversos, um trabalho intelectual de cunho etnográfico, etnológico e filológico, estudos lexicográficos e históricos de propriedade exclusiva do autor Luís Carlos Freire. Os conteúdos são protegidos. Não autorizo a veiculação desses conteúdos sem o contato prévio, sem a devida concordância. Desautorizo a transcrição literal e parcial, exceto breves trechos isolados, desde que mencionada a fonte, pois pretendo transformar tais estudos em publicações físicas. A quebra da segurança e plágio de conteúdos implicarão penalidade referentes às leis de Direitos Autorais. Luís Carlos Freire descende do mesmo tronco genealógico da escritora Nísia Floresta. O parentesco ocorre pelas raízes de sua mãe, Maria José Gomes Peixoto Freire, neta de Maria Clara de Magalhães Fontoura, trineta de Maria Jucunda de Magalhães Fontoura, descendente do Capitão-Mor Bento Freire do Revoredo e Mônica da Rocha Bezerra, dos quais descende a mãe de Nísia Floresta, Antonia Clara Freire. Fonte: "Os Troncos de Goianinha", de Ormuz Barbalho, diretor do Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte, um dos maiores genealogistas potiguares. O livro pode ser pesquisado no Museu Nísia Floresta, no centro da cidade de nome homônimo. Luís Carlos Freire é estudioso da obra de Nísia Floresta, membro da Comissão Norte-Riograndense de Folclore, sócio da Sociedade Científica de Estudos da Arte e da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência. Possui trabalhos científicos sobre a intelectual Nísia Floresta Brasileira Augusta, publicados nos anais da SBPC, Semana de Humanidade, Congressos etc. 'A linguagem Regionalista no Rio Grande do Norte', publicados neste blog, dentre inúmeros trabalhos na área de história, lendas, costumes, tradições etc. Uma pequena parte das referidas obras ainda não está concluída, inclusive várias são inéditas, mas o autor entendeu ser útil disponibilizá-las, visando contribuir com o conhecimento, pois certos assuntos não são encontrados em livros ou na internet. Algumas pesquisas são fruto de longos estudos, alguns até extensos e aprofundados, arquivos de Natal, Recife, Salvador e na Biblioteca Nacional no RJ, bem como o A Linguagem Regional no Rio Grande do Norte, fruto de 20 anos de estudos em muitas cidades do RN, predominantemente em Nísia Floresta. O autor estuda a história e a cultura popular da Região Metropolitana do Natal. Há muita informação sobre a intelectual Nísia Floresta Brasileira Augusta, o município homônimo, situado na Região Metropolitana de Natal/RN, lendas, crônicas, artigos, fotos, poesias, etc. OBS. Só publico e respondo comentários que contenham nome completo, e-mail e telefone.

terça-feira, 31 de agosto de 2021

Enfermeiros: mitos de verdade!

 


ENFERMEIROS: MITOS DE VERDADE
 
Ontem à tarde Fídias experimentou a sua primeira dose da vacina contra o Novo Coronavírus. O Ginásio Poliesportivo Djalma Maranhão, no centro de Natal, estava lotado. Filas imensas organizadas por cadeiras plásticas. A equipe da Secretaria de Saúde disponível era pequena para a quantidade de pessoas. Um rapaz transitava lá e cá, explicando quais documentos todos deveriam ter em mãos para serem vacinados. Isso para evitar que alguém aguardasse horas e não fosse vacinado por ter esquecido algum documento. Esse rapaz abordava cada pessoa e conferia tudo, calma e educadamente. Algumas pessoas não portavam tudo, e tiveram que voltar para as suas casas, buscar o que faltava e retornar logo em seguida, ou voltar no dia seguinte, afinal passava das 15 horas. Muitos deixavam a fila mastigando palavras não muito apetecíveis. Outros saiam esbravejando, como se a equipe da saúde tivesse cometido um crime inafiançável. Clima meio pesado!
 
Duas senhoras que atendiam no balcão, preenchiam a caderneta de vacinação, informavam qual a vacina seria aplicada e encaminhavam as pessoas para a fila em pé. Ao chegarmos à fila (eu apenas como acompanhante, pois tomarei a segunda dose no dia 2.9.21), percebemos que tudo estava parado. A enfermeira havia saído e os vacinandos ficaram ali olhando para o telhado.
 
Houve um princípio de tumulto nessa fila em pé, pois julgando pelo número de pessoas que nem tinham sido atendidas, o avançado das horas, a fila enorme, certamente pensavam “que hora eu vou sair daqui?”. “É um absurdo a gente esperar tanto… cadê a enfermeira?” “deve ter ido tomar um cafezinho”, “não, ela foi buscar vacina, toda hora ela sai um pouco”, “não era para ter uma pessoa aí só para ir buscar as vacinas?”, “ela deve estar lá atrás conversando com as pareceiras dela!”. Toda sorte de julgamentos e sentenças reverberavam da exigente fila. 
 
De repente reaparece a enfermeira. Um andar arrastado de pata, carregando uma caixa plástica azul com as vacinas, calça azul e uma blusinha esquisita de estampa infantil. Lembrava as professoras de escolas infantis. Parecia que atenderia uma porção de criancinhas. Então ela reinicia a vacinação “por favor, todo mundo arregace as mangas acima do ombro, e quem for tirar fotografia, já venha com a pessoa e o celular no ponto; a gente não pode ficar fazendo pose, demorando, e a vacina tem que ser aplicada imediatamente após ser aberta”. Encerrado o longo e belo discurso, algumas pessoas riram “pra quê arregaçar a manga logo daqui do fim da fila, era para arregaçar quando a gente chegando até ela”, “pra que falar tão alto?”, "exigente ela!" Cada um que dizia um enredo. “Já estou cansado de ouvir esse discurso dela desde a hora que cheguei lá nas cadeiras”, “ela nem precisava dessa falação, pois lá da fila a gente já vem ouvindo a sua cantiga de grilo”.
 
Com certeza aquele figurino infantil e calmante da enfermeira versava magnificamente o seu ofício, pois a fila estava mais para uma fila de merenda escolar, que de vacinação. As faixas etárias eram misturadas,inclusive idosos, mas parecia infanto-juvenil pelo comportamento das pessoas. “Espero que essa danada tenha a mão leve, pois não suporto picada de agulha”, “eu vi, inclusive a hora que ela deu uma agulhada numa mulher que fez uma cara tão feia”, “é, ela deve ter a mão pesada mesmo!”, “eu já acho o contrário, ela parece aplicar com uma leveza incrível”, “pra mim pouco importa se dói ou não, eu quero é vacina no braço”, “essa enfermeira tem uma cara esquisita”, “será que ela é enfermeira mesmo”, “claro! não tá vendo a roupa?”. A novela corria à solta no rabo da fila, mas mal se aproximava da enfermeira, entrava no intervalo. A roupinha de coisinhas infantis, de fato parecia acalmar. As pessoas ficavam olhando os bichinhos desenhados e talvez se sentiam num universo infantil de paz...
 
Contemplando esse entrecho, ora com ares de um breve sorriso, atestei o sacerdócio dos enfermeiros por esse Brasil afora. Homens e mulheres, de médicos, técnicos de enfermagem a uma infinidade de profissionais da saúde… quanta luta! Quanto trabalho! Chega a ser desumano. Já imaginou quantas milhares de vezes por dia uma enfermeira aplica a vacina? Movimentos repetitivos o dia inteiro. Quantas vão em busca das caixas quando o outro estoque esvazia? Quantas se desgastam com aqueles discursos como o acima mencionado? Quantas se estressam diante de determinados ambientes permeados de confusões, grosserias, mal entendidos, e fingem estar maravilhosas, serenas, calmas? A enfermeira que atendia Fídias estava ali desde manhã. Já imaginou?!
 
Ultimamente está na moda a palavra MITO. Sabemos que mito é uma coisa irreal. Mas o vocábulo MITO também significa a pessoa excelsa, digna de um panteão, digna de louros, digna de troféus, digna da glória humana e da respeitabilidade de todos. E como essa palavra está sendo pessimamente mal aplicada no caudal dessa moda atual, é importante ressalvar que os mitos do Brasil de hoje, muito embora não reconhecidos, são OS ENFERMEIROS, os MÉDICOS, OS TÉCNICOS DE ENFERMAGEM, e toda a equipe de PROFISSIONAIS DE SAÚDE e afins, os quais tem suado suor e sangue para dar conta de um trabalho colossal, de certo modo desumano para eles que arriscam as suas vidas a cada segundo, e não fogem da raia. Estão a postos honrando a sua formação, o seu dom, a sua missão na Saúde.
 
Pois então… após um bom tempo assistindo a novela das vacinas e chegando a sua vez de ser atendido, Fídias perguntou “já?!” admirado com a precisão da enfermeira que o vacinou sem que ele sentisse. Me respondam se essas pessoas, de fato, não são mitos!
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OBS. A imagem aqui postada é meramente ilustrativa e de domínio público na internet.

 

sexta-feira, 20 de agosto de 2021

A eterna mina de ouro do Timbó

 
A ETERNA MINA DE OURO DO TIMBÓ

Padre Tiago Theisen chegou ao Brasil há mais de 50 anos, vindo da Bélgica, onde nasceu. Coincidentemente, desenvolveu trabalhos evangelísticos em Timbó, distrito de Nísia Floresta. Ali, na década de 60, ele deu início a um projeto que marcou a história do povoado, tendo ensinado aos nativos a reconhecer na palha do coqueiro uma fonte de renda, ensinando o artesanato em de fibra de coco, atividade que vigora até hoje na localidade. 

Muitos timboenses são exímios artesãos nesse mister, e sequer sabem quem foi o pioneiro que deixou aquela tradição. Já ouvi quem dissesse que foram as freiras que ensinaram, mas não. Elas desenvolveram um trabalho importanttíssimo na localidade, mas esse trunfo - de fato - pertence ao padre Tiago Theisen. Tendo o sacerdote observado grande pobreza no Timbó, olhou para o alto e enxergou as palhas que salvaram o povoado, oferecendo aos nativos a dignidade de uma fonte de renda vinda do trabalho. Lembrando que foi no Timbó que nasceu a Campanha da Fraternidade no Brasil. Foi ali o primeiro gesto concreto.

 
O que me impressiona nessa história é a visão desse sacerdote. Ele olhou para o Timbó, viu as dificuldades do povo, olhou para um lado, olhou para o outro, buscando uma luz e ele veio do alto dos pés de coqueiro. Até hoje é a matéria prima mais abundante na localidade, e dá de comer a muitas pessoas. Da palha de coqueiro se faz um diversidade de peças ornamentais e utilitárias. São peças leves, bonitas e delicadas, cujo domínio dessa arte se tornou uma característica do distrito de Timbó. Quando alguém se refere ao artesanato de palha de coqueiro, se lembra logo do Timbó. 

Essa história - que me foi contada por ele -, nos ensina o que é a visão de um homem. Ao enxergar a falta do ganha pão do povo, ele encontrou a alternativa que estava ali mesmo, cujo povo só ganharia dinheiro, sem gastar com matéria prima. Essa é uma das histórias mais bela dentre os vários distritos de Nísia Floresta. Foi ali que um padre descobriu uma alternativa econômica para os nativos, e ela se tornou parte da economia da localidade. Na verdade, ele descobriu uma 'mina de ouro' que jamais esgotaria.  Essas imagens registram o momento em que nós, da Comissão Norte-Rio-Grandense de Folclore prestamos homenagem ao sacerdote. 

Neste mesmo blog há vários escritos meus sobre o Timbó, padre Thiagp Theisen e Campanha da Fraternidade.
 

quarta-feira, 18 de agosto de 2021

Vicente Elísio - Bibliotecas vivas...

 
Em 2009 passei três meses entre idas e vindas à residência dos filhos de Vicente Elísio, que foi prefeito de Nísia Floresta na década de 40. Ele era bisneto do Coronel Alexandre de Oliveira, o famoso "Cavaleiro da Rosa", que se encontra sepultado na parede da Igreja Matriz de Nossa Senhora do Ó, em Nísia Floresta, estado do Rio Grande do Norte. 
 
Quase todas as noites e nas tardes de domingo ou sábado, nos reuníamos na sala da casa deles: Onaldo, Lulu e Lourdes. Fui também durante alguns feriados à tarde, pois esses encontros não eram marcados previamente. Eu disse apenas que precisaria escrever sobre o ex-prefeito Vicente Elísio, pai deles, que fora prefeito de Papari na década de 40, e que a gente precisaria ir conversando aos poucos. Eles adoraram a ideia, pois nunca alguém se debruçou sobre o assunto. Esses encontros acabaram sendo como quem garimpa e encontra o que procura, pois salvei uma importante página da História de Papari.
 
Bastava eu me apresentar à porta da casa deles que era muito bem recebido. Em História você não pode se preocupar com diferenças ideológicas, principalmente político-partidárias. Disse isso porque alguns me alertaram que eu não conseguiria jamais pesquisar com eles devido às nossas diferenças ideologicas. Foi o contrário. Eles me disseram os horários que normalmente estavam em casa, e assim, mansa e serenamente, fomos tirando a poeira acumulada na história de Vicente Elísio (e deles próprios, obviamente). Bastava eu chegar, as portas se abriam, e as histórias fluíam como livros de memórias. Nunca conversamos sobre política. Não era esse o objetivo!
 

Acostumado a pesquisar e lidar com História Oral, eu seguia uma linha do tempo, mas sempre eles tinham um ‘insight’, e irrompiam com um assunto novo e fora do contexto, mas precioso. E lá íamos nós por aqueles desvios, recolhendo os fragmentos. Os fatos me eram narrados com riqueza de detalhes, parecendo ter ocorrido no dia anterior. Graças às mentes privilegiadas dos contadores, inclusive Lulu se lembrava de fatos que nem Onaldo, o mais velho, se recordava. Vejam como é interessante as memórias antigas. Um assunto puxava o outro. Eram conversas olho no olho. Onaldo começava um fato, olhava para Lourdes, ela complementava, Lulu jogava um detalhe esquecido, outrora Lourdes lembrava de um episódio despercebido e assim fluia, como gotas, dando origem às estalactites e estalagmites históricas.
 
A cada encontro era uma página nova, buscada naquelas bibliotecas vivas. Acervos preciosos.
Todos colaboravam com uma informação aqui, outra ali. No caudal das conversas, eventualmente surgia um assunto engraçado. Ri muito com eles. Foi uma das entrevistas mais deliciosas e divertidas dentre tantas que fiz em Papari. Interessante é que todos eles, quando me viam na rua, perguntavam se eu iria naquela noite, ou naquela tarde. Nossas conversas adquiriram uma química tão agradável que lembrava o tempo antigo, em que os netos cercavam os avós defronte as casas para ouvir histórias de Trancoso. Só que essas eram reais.
 

Interessante também eram as nuanças da História. Como eles eram filhos de Vicente Elísio, se reportavam a detalhes, como um dia de eleição, o cotidiano do alambique, o fabrico de farinha, e até mesmo de episódios ocorridos quando eram crianças ou jovens, como por exemplo, um dia em que Vicente Elísio quis bater em Onaldo por ele ter descoberto umas garrafas de cachaça escondidas por ele, que iriam beber com alguns amigos pelas cercanias de Papari (coisa de rapaz!). Sobre a eleição, por exemplo, foi muito interessante saber que os eleitores eram buscados em casa pelos candidatos. Vinham em pau-de-arara, carro pequeno, carroça, no lombo de cavalos e jumentos ou a pé. Vicente Elísio mandava matar um boi e servir o almoço dos eleitores em pleno dia de eleição. A casa ficava repleta de gente do raiar do sol ao anoitecer. Coisa impensável nos dias atuais, pois seria cassação no ato.
 
Quando concluí a pesquisa, imprimi-a e fiz questão de entregar um exemplar à família. Nunca me esqueci a fisionomia de felicidade de Onaldo e os demais. Ficou radiante. Agradeceu mais do que devia. Emocionaram-se. Até brinquei, dizendo que aquilo era um filho que geramos naqueles encontros. E o filho havia nascido. Pesquisa é isso!
 
Quando soube que Lulu, e depois Onaldo haviam se encantado, reavivou esse filme na minha mente. Só tenho a agradecer a todos eles por terem se disponibilizado a contar o que sabia sobre a história da gestão de seu pai Vicente Elísio, e tantos outros fatos ocorridos em Papari. Se não tivessem ocorrido esses encontros eu não teria escrito a história do seu pai. Eles teriam levado para o túmulo uma parte da Biblioteca de Papari. Costumo dizer sempre que ainda consegui salvar muita coisa das Biblioteca Viva de Papari, pois tendo chegado ali há 27 anos, empreendi vasta pesquisa junto a idosos de idades entre 70 a quase cem anos. A maior parte dessas pessoas partiram, mas me ajudaram a salvar muita coisa que sem ela jamais as novas gerações nisiaflorestenses saberiam.
 

Às vezes os nativos entram em contato comigo e perguntam: “como é que você sabe disso, se você não é daqui, nem morava daqui nessa época?”. Respondo: “eu não morava, mas falei com aqueles que moravam”. História Oral é isso! Outro detalhe muito curioso diz respeito à nativos que entram em contato comigo para saber coisas que os avós haviam contado, mas que a pessoa não lembrava mais como era em detalhes aquele fato. A Oralidade é preciosa, pois a gente precisa daquele material para confrontar com inúmeros outros e dar cada vez mais cientificidade. E assim, juntando os fragmentos, ia montando a História de maneira cronológica. Talvez por isso eu tenha até hoje facilidade para escrever de memória inúmeras histórias sobre a Papari antiga. Embora tudo isso esteja anotado, ou transformado em textos, ou ainda guardado, o fato de eu ter conversado com muitos velhos, paramentei-me dessa autoridade quando escrevo, valendo-me do que ouvi deles.
 
Aproveito para agradecer à sua família pela grande contribuição, a qual não foi para mim, mas para as gerações futuras, pois nada existia escrito sobre o período de gestão de Vicente Elísio, pelo menos com tantos detalhes se essa família não tivesse aberto a porta de suas casas - e os seus corações. Já agradeci em vida a todos eles. História é assim! Acaba ficando a saudade. Para finalizar: se eu tivesse me preocupado com ideologias políticas, não teria escrito a história de Vicente Elísio. E hoje ninguém saberia! Em pesquisa não podemos aflorar nossas opiniões pessoais ou ideologias pessoais. Assim aprendi. (15.11.2018).

 

segunda-feira, 16 de agosto de 2021

As "loucomotivas" da Great Western


Idos do ano de 1881… Findadas as obras da "Estação Papary", e mais adiante, a "Estação Mipibu", as esdrúxulas locomotivas trilharam os ferros da Great Western. Tais quais "Café Com Pão”, eram barulhentas pra Bandeira! Ao longe, estrondavam, anunciando a aproximação. Discrição nunca lhes foi característica. Pudera! Comiam lenha e arrotavam fumaça! Surgiam em cúmulos-nimbos preto e branco bafejando as matas, impingindo fuligem aos roupões dos passageiros, salvo os que usassem "guarda-pó". Respeite os abastados! Modernas Marias-Fumaça, “lajeslizando” dia inteiro, ligeiras, ora em Guarabira... ora Natal... ora pro nobis: quando vinha o bispo Dom Adauto Miranda Henrique!. Assim restou a História, hoje amarelada em retratos... 
 
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OBS. As fotografias aqui exibidas registram locomotivas inglesas “UFSC”, dos tempos que transitavam os trilhos da Great Western e Sampaio Correia, aqui no Rio Grande do Norte.

  

 

 

Engenhos "Morgado" e São Roque

 


Engenho Morgado (em São José de Mipibu). A casa mais antiga de Mipibu, onde nasceram os meus primos da linhagem Peixoto. Aqui ficou hospedado o homem designado pela província para emancipar São José de Mipibu, em 1762: Miguel Carlos Caldeira de Pina Castelo Branco de Souza Morgado. Em homenagem ao ilustre visitante, a propriedade foi rebatizada com seu nome. Nessa casa morava Lula Maranhão (na verdade, Lula Peixoto - nome de solteira), a qual casou-se com Roque Maranhão, o 2º Intendente da Vila Imperial de Papary (ambos passaram a residir no Engenho São Roque (em Nísia Floresta). Intendente era algo como Prefeito.
 




O cigarro na minha adolescência...



Ontem, lendo um livro datado de 1970, dei-me com essas duas imagens nas principais páginas. Uma fotografia dessa, nos dias de hoje, causa estranhamento. Chega a ser chocante para muitos, afinal é propaganda de cigarro dentro de um livro. As leis mudaram.

A geração atual ficaria perplexa se voltasse no tempo e assistisse propagandas televisivas de homens e mulheres saudáveis, corpos atléticos, pilotando lanchas, carros, cavalgando, sentados em locais bonitos sempre com cigarros nas mãos, bafejando nicotina. O objetivo da propaganda era dizer que fumar era charmoso, saudável e gostoso. 
 
Inegavelmente as carteiras de cigarro eram bonitas. Não sei hoje, pois há décadas que não vejo esse material. Havia um primor no design. As cores, os símbolos etc. O hábito de fumar transmitia a ideia de energia, coragem, saúde, enfim era o máximo! E desse modo o cigarro estava nas revistas, livros, cartazes e - pasmem! - até no patrocínio de esportistas A juventude, estimulada pela energia dos cigarros, corria para os bares para comprar um maço e haja nicotina nos pulmões. As bebidas alcoolicas seguiam o mesmo estilo de propaganda, e seus efeitos eram os mesmos (Impensável aos dias de hoje). Tão impensável que é possível supor que isso não seja verdade. E foi! 
 

 
Nunca fumei nem senti vontade, mas na minha fase de criança e adolescência eu não dava dois passos na rua da cidade sem encontrar “piúbas” de cigarros pelas calçadas e duas a três fumantes passando por mim como se um chaminé andasse. Na escola da minha adolescência - com um pátio do tamanho do mundo - era possível encontrar alguns amigos escondidos nos cantos, fumando, como se cometessem um delito. Mesmo não sendo proibido, obviamente que jamais uma escola admitiria isso. Por outro aspecto o cigarro era essa moda toda apenas para pessoas acima de 18 anos de idade.
 
Estava olhando os estudos sobre os efeitos dessa mudança. Segundo especialistas a campanha de combate ao cigarro (tabaco) surte bons efeitos. Diminuiu muito. De fato raramente vejo alguém fumando. As ilustrações nos próprios maços, mostrando os efeitos do cigarro no corpo, ajudam muito. Associado a isso, o Ministério da Saúde trabalhou muito com outros tipos de campanha… pois bem, eis que, folheando um livro, dei-me com essa imagem que nem lembrava mais, mas que foi forte até a década de 80.

3 passa diante das autoridades que acompanham obras de saneamento, próximos à Estação Ferroviária em Natal.

 
MEMÓRIA -1937...

Deputados estaduais, prefeito, autoridades militares, civis e eclesiásticas acompanham obras de saneamento, próximos à Estação Ferroviária em Natal.
De repente a locomotiva "Catita" número 3 rouba a cena. Surge, barulhenta, bufando seu fumacê, "lageslizando" nos trilhos, rastando vagões de ferro e gente... Uns, descerão na Estações Mipibu, mas as mulheres vendedeiras de mangaba, camarão, grude e pecado maneiro, apearão na Estação Papari.
Até onde houver trilhos, haverá gente cuidando da vida, ganhando a vida... gente de ganho... Apesar de miúda, força de gigante. Catita é potente. Arrasta toneladas de ferro...Desde 1906 cumpre árdua missão.
Fabricada na Inglaterra em 1902, chegou ao Rio Grande do Norte com quatro anos de caixa. Cheirava a London! Nunca mais parou. Parou foi Natal... povo assustado...
"chegou um bicho de ferro, que se move sozinho... É mais forte de que mil cavalos... mas mil cavalos não levam a responsabilidade da Catita.. fim dos tempos... Bem disse mo pai... haverá um dia que a roda grande entrará dentro da rosa pequena..."

Estação Papary: a mina de ouro que gera prejuízo para a História e o Turismo de Nísia Floresta

 

Em 1981 a linha ferroviária para transporte de cargas e passageiros foi desativada no seu trecho até a Estação Papary, permanecendo o transporte de passageiros apenas entre Natal e Parnamirim. O prédio, em desuso, foi invadido por uma família humilde que ali residiu até 1994. Em 1995 fui procurado pelo então prefeito de Nísia Floresta, George Ney Ferreira. Eu não o conhecia. Ele disse-me que tinha intenção de restaurar o referido prédio e transformá-lo num museu, mas queria reunir especialistas para viabilizar a parte tocante à criação da referida instituição, pois as providências pertinentes à reforma e restauração do prédio ele havia providenciado. A partir desse diálogo, ele deu-me carta branca para que eu montasse uma equipe para viabilizar o que dissesse respeito à constituição do museu, e alegou que a reconheceria oficialmente, dando todo o apoio necessário. Fiquei de contactar as pessoas pertinentes, e retornar o contato no momento conveniente.

No curso de quinze dias dediquei-me a pensar em pessoas sérias, em que, juntos, teríamos condições de programar e executar o referido projeto. Convidei Hélio de Oliveira (Museólogo da FJA), Constância Lima Duarte (profunda estudiosa sobre a vida e a obra de Nísia Floresta), Maria das Graças Lucena de Medeiros, hoje falecida, (Presidente do NEPAM-UFRN - onde pesquisei muito), Diva Cunha Pereira de Macedo (escritora), Zélia Mariz (estudiosa de Nísia Floresta, hoje falecida), Françoise Dominique Valéry (Cônsul Honorária da França) e Dr. Diógenes da Cunha Lima (ex-reitor da UFRN, escritor e advogado). Todas essas pessoas se encantaram com a proposta e ficaram admiradas com a atitude do prefeito.
 
Marquei a primeira reunião na sala de estudos e pesquisas, da Base Educação e Sociedade no Centro de Ciências Humanas Letras e Artes/UFRN, onde eu trabalhava como bolsista pelo CNPq, pesquisando o tema “Levantamento e Catalogação das Fontes Primárias e Secundárias da História da Educação no Rio Grande do Norte no Século XIX”. Nesse primeiro encontro estiveram presentes além de mim, Maria das Graças Lucena de Medeiros, Diva Cunha Pereira de Macedo, Zélia Mariz e Françoise Dominique Valéry. À ocasião foram rascunhadas as primeiras ideias de como poderia ser o museu. Na semana seguinte, tivemos uma segunda reunião na Fundação José Augusto. Além de mim, estiveram presentes Hélio de Oliveira, Maria das Graças Lucena de Medeiros, Diva Cunha Pereira de Macedo, Zélia Mariz, e Françoise Dominique Valéry. O Dr Diógenes não pode estar presente nesse terceiro momento, mas sempre acompanhou os resultados dessas atividades. E assim as coisas foram fluindo. 
 
No dia 6 de março de 1995 foi oficialmente constituída a "Comissão de Implantação do Museu da Mulher Norte-Riograndense", através da portaria n. 045/95, assinada pelo gestor George Ney Ferreira (o citado documento segue em anexo). Essa Comissão tinha carta branca para tomar as providências necessárias, cujos custos com o museu seriam divididos entre a UFRN, a Fundação José Augusto e a Prefeitura de Nísia Floresta. A proposta original era evidenciar com maior destaque a imagem de Nísia Floresta, reconstruir um mobiliário de época, servindo-se da compra em antiquários, garantir uma biblioteca com as obras de autoras potiguares, inclusive toda a obra de Nísia Floresta e completar o ambiente com imagens de mulheres norte-riograndenses que se destacaram na história, além de recursos áudio-visuais e elementos interativos aos visitantes. À ocasião todos os integrantes da Comissão passaram a ter uma função na construção da proposta museológica - todos de forma voluntária.
 
E assim - com recursos da Prefeitura Municipal de Nísia Floresta - iniciou-se a restauração do prédio da Estação Papary, que preservou quase todas as suas características inglesas originais. Os trabalhos foram acompanhados pela Fundação José Augusto – FJA, sob os cuidados do arquiteto Paulo Heider Forte Feijó. À época houve polêmica, pois alguns alegavam que a marquise que foi projetada sobre a plataforma de embarque e desembarque de passageiros (uma espécie de “mão francesa") descaracterizava o prédio. Porém os pedreiros afirmavam que sob o reboco retirado ficou evidenciada a sua existência nos dois lados.
 
Aproximando-se o final da reforma e restauração, os contatos com o referido gestor passaram a ficar muito difíceis. Àquela época já existiam os aparelhos celulares. Antes, eu ligava e ele atendia rapidamente, depois ele passou a não atender mais as ligações. Mas logo veio a explicação para essa dificuldade de contato: fomos surpreendidos por comentários de populares, de que o prédio da antiga estação seria entregue a um empresário, o qual já se encontrava montando ali um restaurante especializado em camarão, cuja inauguração configurou um acontecimento político, conforme se percebe nos registros fotográficos de época. Foi praticamente um evento político a referida inauguração. E o povão sempre escanteado.
 
Todos nós, integrantes da Comissão de Criação do Museu, ficamos constrangidos e decepcionados com a mudança súbita da proposta, até porque o Museu era esperado com ansiedade pelo Estado e fora notícia em diversos jornais. Houve muito trabalho para se chegar até ali, e todos aguardavam o desfecho.
 
Enfim, após muita insistência, contatado o prefeito, o mesmo disse - surpreendentemente -, que poderíamos utilizar o espaço da "Bilheteria" do prédio para abrigar o material programado para o Museu, proposta inviável diante do projeto original, idealizado para ocupar todas as dependências. Era impossível acomodar tudo numa minúscula bilheteria. Na realidade, a proposta de um restaurante sempre esteve inclusa, no projeto original mas, e supúnhamos que isso se daria por via de edital. Quando o projeto estava no início, o gestor afirmou que cederia um anexo na lateral da estação para algum comerciante montar um restaurante, e esse espaço foi construído de fato, sem trazer prejuízo para o espaço interior da Estação. O anexo seria uma espécie de "praça da alimentação" do museu. Mas o gestor - e depois os donos do restaurante - deixaram claro que o Museu seria na bilheteria. Resultado: tudo foi abortado, tendo em vista a inviabilidade.
 
Em 2006 fui procurado pela equipe do DN Educação - Diário de Natal, para contribuir com um Caderno Especial sobre a intelectual Nísia Floresta, em parceria com o Projeto Memória. Os jornalistas construíram a matéria de maneira que mesclaram o legado de Nísia Floresta com o patrimônio material do município. Dentre os depoimentos referentes à Estação "PAPARY", fiquei sem entender quando li um depoimento dos proprietários do referido restaurante dizendo que "compraram o prédio". Isso está escrito no jornal.
 
Essa informação esdrúxula só faz engrossar o caldo do desrespeito à nossa História e a nossa Memória, pois trata-se de uma edificação federal, que jamais pode ser vendida, e sim doada a órgãos públicos de natureza cultural ou educacional, mediante um projeto e as políticas públicas pertinentes. 
 
Os nisiaflorestenses até hoje não entendem a patuscada ocorrida na Estação Papary, em que, na realidade, fomos usados para dar seriedade ao projeto, cuja verdadeira intenção do prefeito nunca foi construir o Museu, mas entregar o prédio para o empresário que ali está até hoje.
 
“O FENÔMENO PÓS-REFORMA”
 
Dizem que "o que não é visto não é lembrado". Após a restauração a esquecida e despercebida Estação “PAPARY” adquiriu uma beleza singular, em contraste com a aparência anterior de um casarão mal-assombrado e "invisível". A imponente edificação, em estilo inglês, emoldurada por paisagem rural e um conjunto de casarios simples, personificava uma poesia bucólica. Quem passava por ali era atraído pela suntuosidade do prédio recém-restaurado. Impossível ignorar tanta beleza.
 
O “troféu turístico" que ressurgiu das cinzas tal qual a Fênix - frente ao cenário de ruínas, antes despercebido, deveria, ou melhor, deve muito bem ser usado a favor de sua vocação original, a favor de um projeto que associe História, Memória e Turismo, mas que traiçoeiramente virou restaurante. Aos poucos os empresários que ali conduzem o restaurante emolduraram o edifício com árvores e arbustos frontais, como se quisessem torná-lo imperceptível aos nisiaflorestenses, os quais nunca aprovaram a injustiça feita ao projeto original e à equipe que voluntariamente gastou horas planejando tudo, tendo feito maquetes, desperdiçado tempo, papel, ligações telefônicas e outros gastos em seu planejamento.
 
Em 2003 levando o assunto do museu ao prefeito João Lourenço Neto, o mesmo externou interesse em retomar o prédio para a proposta. Ele também me deu carta branca para montar uma comissão e nomeou-a oficialmente em seguida (veja o documento em anexo). À ocasião, convidei as mesmas pessoas anteriores e mais algumas do município de Nísia Floresta. Mas o projeto emperrou na Câmara Municipal, pois é necessário que, de fato, os vereadores esqueçam um pouco os interesses pessoais e se dediquem ao interesse do povo. E a Estação Papary é de interesse do povo. Falta apenas que os nisiafloresteneses percebam isso.
 
Olhando as partes laterais vê-se em alto relevo o nome ESTAÇÃO “PAPARY”, que é o antigo nome do município, como sabemos. A inscrição “PAPARY”, em letras garrafais, anunciava a parada da Vila de Papari. O trem parava trazendo pessoas, malas, mercadorias e os malotes dos Correios para Papari. Tudo seguia para o centro da vila, sob os lombos dos jumentos, cavalos, nos carros-de-boi e mesmo a pé, tendo em vista a proximidade. Esse prédio é a história viva do município.
 
COMPLEXO HISTÓRICO/CULTURAL - UM OLHAR PARA AS RAÍZES NO SÉCULO XXI (Proposta que fiz em 2009, e sigo na esperança de quem um dia se concretize)
 
O prédio da Estação "PAPARY", que conta hoje com 140 anos de idade, pelo contexto que você está acabando de ler, tem know-how para sediar um complexo histórico/cultural. Poderia-se fazer um projeto arquitetônico com grande valorização para o aspecto paisagístico, levando-se em conta elementos da cultura nordestina típicos de nossa região. Delimitaria-se uma extensa área no entorno do prédio, faria-se os aterros necessários calçando-a com cantaria ou um tipo de pré-moldado combinando com o ambiente. Mandaria-se construir um pequeno trem de passageiros - uma réplica dos velhos trens - e faria-se dois itinerários de viagens com turistas, um até Nova Cruz, outro até Parnamirim. Isso seria uma mina de ouro, pois geraria muitos recursos para o município, e esse dinheiro seria destinado à manutenção do Museu da Estação.
 
Primeiramente construiria-se um portal de entrada logo após a linha férrea, com material metálico, produzido por escultor contratado especialmente para isso. Esse pórtico não poderia tapar a visão da estação Papary. Todas as sugestões seguidas deveriam ser concretizadas sem oferecer dano a visualização do prédio da estação Papary. Plantaria-se dezenas de pau-brasil e outras espécies típica dessa região, equilibrando a vegetação com plantas ornamentais representativas. Faria-se uma réplica de um engenho, numa evocação aos inúmeros engenhos locais. Restauraria-se o poço que existia do lado (inclusive a vertente está em perfeito estado). Faria-se um projeto em parceria com o Governo Federal, restaurando-se uma locomotiva antiga e os trilhos que ficavam do outro lado, deixando o veículo exposto nos trilhos originais, protegida por um galpão feito de forma que se harmonizasse com o contexto. Conseguiria-se um pequeno acervo, junto à Superintendência da RFFSA, tendo um espaço que contaria a história das ferrovias do Rio Grande do Norte.
 
Construiria-se toda uma estrutura imitando casas-de-taipa nas quais alojaria-se artesãos e comerciantes para venda de todo tipo do artesanato nisiaflorestense, além de comidas típicas. Teria-se mulheres rendeiras e labirinteiras produzindo seus trabalhos ‘in loco’. Faria-se uma casa de farinha e um engenho de melado para funcionar apenas no período do veraneio. Isso permitiria ao turista e ao nosso próprio povo - que vê destruída a sua cultura - o resgate das raízes nordestinas. Ali poderia-se adquirir desde iguarias mais primitivas como rapadura, melado, beju, tapioca, grude, pecado-maneiro, farinha, sucos da terra, a uma gastronomia contemporânea à base de camarão, siri, aratu, caranguejo peixes e afins.
 
Esse espaço também seria polo de exibições de artistas locais e de outras regiões - priorizando-se as raízes nordestinas. Manifestações da cultura popular como o Boi-de-reis, o Pastoril, o Coco-de-roda e a reconstituição do Pirão-bem-mole de Nísia Floresta e o Coco-de-roda de São José de Mipibu, tudo dentro de uma política pública organizada, com mestres ensinando as danças e a confecção de roupas e instrumentos musicais utilizados.
 
Construiria-se um complexo semelhante a um balneário e todos os elementos integrantes desse espaço seguiriam uma linha rústica, tendo em vista que há nascentes por ali. Enfim, daria-se a esse espaço uma dignidade visionária. Esse projeto seria feito numa parceria encabeçada entre o poder público de Nísia Floresta, com apoio de instituições especializadas em patrocínio desse tipo de projeto, em nível estadual e federal.
 
O prédio, especificamente, seria uma espécie de museu ou memorial para abrigar as histórias do município de Nísia Floresta, com fotos, livros, ferramentas, instrumentos, acervos e objetos pessoais dos personagens evocados, dando destaque às figuras de Nísia Floresta e do seu povo. Teria-se um anfiteatro com exibições pré-divulgadas de peças teatrais contando a história de Nísia Floresta e outras histórias locais.
 
Mais que direcionar uma visão apenas para um museu, esse complexo seria um pólo que convergeria amplamente a cultura genuína da região, sendo referência para estudos nacionais e internacionais com uma fluente produção audio-visual, fotográfica e oficinas.
O êxito desse projeto implicaria em fortes investimentos no que se refere a divulgação, uma política de turismo contínua e providências. Até porque a poucos metros desse prédio tem uma galeria do esgoto de São José de Mipibu desaguando no rio Mipibu, que por sua vez deságua na lagoa Papari, a qual está seriamente prejudicada.
 
AS AUTORIDADES PRECISAM QUERER
 
A Câmara Municipal de Nísia Floresta tem uma dívida moral com a "ESTAÇÃO PAPARY" e com o patrimônio nisiaflorestense de modo geral. Cabe à mesma a idealização de um projeto que reja a questão de restauração e manutenção do patrimônio tangível e intangível nisiaflorestense de modo geral. Há anos proponho em vão essa medida simples, que é só dizer “vou fazer”. E desde 2009 ela está disponível no meu blog.
 
No tocante à Estação "PAPARY", resta às autoridades devolver ao povo de Nísia Floresta o direito de sediar um ponto de cultura, um museu ou memorial no referido espaço. Até porque trata-se de uma edificação restaurada com recursos oriundos de Nísia Floresta - conforme documentos comprobatórios disponíveis no Ministério Público de Nísia Floresta. Quem tem o direito de usufruir o prédio nessa concepção histórico/cultural é o povo e não uma empresa particular. E, mais que isso, trata-se de um prédio federal que tem 140 anos de idade, que não pode ser vendido nem demolido.
 
 
 
 
 
 

 
 

Grupo Escholar Nysia Floresta em 1927

 

 

A fotografia foi feita em 1927, há 94 anos, mas a escola - denominada “Grupo Escholar”, foi criada doze anos antes, em 1910, pelo então governador Alberto Maranhão, que sucedeu o nisiaflorestense Dr. Antonio de Souza. O Clic registra um dos prédios onde funcionou a primeira escola oficial de Papary. Não há registro informando o local exato onde tal instituição passou a funcionar no ato de sua criação. Suponho (suponho!) que pode até ter sido exatamente nesse prédio, mas não existe nada precisando a minha hipótese. Tendo em vista que a criação dessa primeira escola é de 1910, ou seja, 17 anos depois do "click" desta fotografia, é provável que tenha sido esse o seu primeiro prédio. Isso não quer dizer que Papary passou a ter escolas nesta data. 
 
Na realidade, há registros de professores e professoras em Papary desde a década de 30 do século XIX. As escolas funcionavam em residências particulares, cujos professores eram remunerados pelo Estado e pela Intendência (Prefeitura). As remunerações eram verdadeiras esmolas. A coisa era tão feia que até mesmo a Delegacia funcionava numa casa alugada, pelo governo da Província. Detentos? Uma vez perdida!

Em 1992, a Srª Estelita, bisneta do coronel Alexandre de Oliveira, contou-me que o antigo prédio da Prefeitura abrigou as primeiras atividades escolares de Nísia Floresta. Com certeza, depois que elas deixaram de acontecer nas casas dos velhos mestres. Mas, retomando os comentários sobre o prédio desta fotografia. Veja as letras em alto relevo na parede (contra provas não há argumentos). De fato ali funcionou a primeira escola estadual do município. Esse prédio é o atual Centro Pastoral pertencente à Igreja Matriz de Nossa Senhora do Ó. Seu dono original foi o polêmico Coronel José de Araújo, aliás, ele era dono do quarteirão inteiro. Com certeza é uma das primeiras famílias da região. Suponho que os antepassados do coronel José de Araújo eram portugueses. Depois a família Gondim o adquiriu, doando-o para a Igreja o dito prédio juntamente com a área onde está situada a "Casa das Freiras". 
 
Essa propriedade era a residência do citado coronel, o qual assistia as missas de sua janela, como diziam os antigos de seu tempo. Consistia numa casa de esquina, pois a toponímia era diferente. O muro de sua casa seguia até o muro da “Casa das Freiras” em linha reta, de maneira a valorizar o largo da Igreja Matriz. Mas no final da década de 80 - pasmem! - um engenheiro, que se tornou prefeito (George Ney Ferreira) construiu uma infinidade de casinholas defronte ao casarão, descaracterizando totalmente a formatação portuguesa das raízes de Papary, encolhendo o gigantesco átrio da igreja Matriz.
OBSERVAÇÃO: A letra manuscrita sob a fotografia não é minha.
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Grupo Escolar Nísia Floresta - Memórias de Papary

 

domingo, 8 de agosto de 2021

Sarsa...

 


SARSA...


No Rio Grande do Norte usam a expressão  "tá um sarsero danado na casa de fulano" para designar barulho de festa, farra, muita gente. Ou muita confusão também! Depende!. A ideia é denotar algo exagerado. Isso teria relação com a "Sarsa" que se espraia sem limites pelos terrenos descuidados? É possível.  Trata-se de uma ramagem muito parecida com a de batata doce. Supostamente é parente, mas não produz o delicioso tubérculo. É estéril como pedra. Para alguns é uma praga devido a abundância. Nasce sem que se saiba como. Verdadeiro mistério. Basta terra, calçada frinchada ou beira de rodovia ela se instala para se acontecer. Sepulta muros, cercas, pilhas de tijolos, enfim. Nas beiradas de praia rouba a cena. Deixa os sargaços invisíveis. E como a natureza é perfeita, na praia ela funciona como um imenso lençol bordado e colorido, segurando as areias das dunas. O homem, muito intrometido, sempre chega onde não é chamado, construiu casas na frente do mar e rebolou longe as benfazejas sarsas. O resultado foi terrível. As dunas invadiram as casas e não há quem vença os grãos de areia o dia inteiro dentro de casa. Quase sempre sepulta a estrada. Seu chá mata micoses. Onde a sarsa sobrevive, promove espetáculo tal qual ao das xananas. Meus olhos só conhecem as roxas. Existe outras matizes? Os velhos e exóticos gramofones pediram nelas o seu design. Sarsas podem estar disfarçadas a mato. É invisível para muitos. Mas esbanjam beleza, fazem um sarsero danado com sua cor. São extraordinárias. Burle Marx, que retirou tanto mato da invisibilidade, bordou os jardins de Brasília e de tantos palácios, se esqueceu ou talvez nunca viu a sarsa. Por aqui ainda não a vi em vasos com efeito de ornamentação. Talvez as pessoas ainda não atingiram o meu grau de loucura.

 





sexta-feira, 6 de agosto de 2021

INQUISIÇÃO NA INTERNET

 


O caso do suicídio do filho da cantora Walquíria Santos
 
Natal está perplexa com o suicídio de Lucas (16 anos) filho da artista Walquíria Santos, cantora daqui da região. A que ponto chega a maldade humana. O adolescente deu fim à sua vida por não suportar as piadas e deboches feitas a ele, num vídeo postado pelo mesmo. As imagens mostram Lucas e um amigo fingindo um beijo na boca, o que poderia ser visto como “brincadeira de menino buchudo”, como dizem aqui no Nordeste. Mas a brincadeira revelou os demônios existentes em muita gente que não poupou comentários terríveis. 
 
Vejam o que é a mente humana. Outro garoto da mesma idade ‘tiraria de letra’ os inquisidores da internet. Talvez daria até risada e faria outros vídeos ainda mais ousados. Mas o adolescente Lucas - praticamente uma criança - demonstrou ainda não ter tal maturidade. As críticas funcionaram nele como o cometimento de um erro imperdoável. Ele viu em sua postagem uma brincadeira que assumiu proporções de desonra, quase crime. A coisa foi tão insuportável para ele que somente a morte resolveria.
 
Isso é tão grave e tão assustador que ninguém pode deixar passar despercebido. Normalmente são mais meninos que fazem esse tipo de brincadeira, portanto chega a ser ainda mais chocante a atitude extrema que ele tomou, sem conseguir levar na esportiva. Qualquer pessoa adulta percebe a bobagem da brincadeira no vídeo, mas a internet transformou a brincadeira em sua sentença de morte. 
 
Quem tem filhos deve ter muito cuidado. Deve ensiná-los a não usar a internet para dar vazão aos demônios que encarnam quando veem algo que julgam diferente do que eles interpretam como o correto ou ideal. E não aceitam o que é diferente, seja na sexualidade, na política, no time de futebol, no estilo de vida etc. E o mais curioso é que em pleno século XXI vermos uma ‘inquisição’ sobre a imagem gay. Como se quem o fosse, fosse também bandido, assassino, traficante, pervertido, nocivo etc. 
 
Confesso que eu supunha que isso era quase coisa do passado, até porque, como o meu pai dizia “esse tempo não é mais nosso, é dos outros”, querendo dizer que não podemos interferir nos novos comportamentos humanos, pois estamos encerrando as nossas vidas, e eles estão iniciando e jamais serão iguais às gerações passadas. Jamais. Mesmo que o adolescente fosse gay - que não era o caso - não merecia a inquisição dos internautas. O martelo foi tão pesado que custou a vida do menino que quis apenas brincar. Perverso demais! O pior é que isso está na moda. Os mais impensáveis gestos de violência no uso da palavra estão banalizados na internet.
 
É momento de os pais e avós chamarem os filhos pré-adolescentes e adolescentes para refletir sobre esse fato. É importante orientá-los a não serem inquisidores, e quando porventura postarem alguma brincadeira na internet, deverão 'tirar de letra' a possível inquisição dos demônios da internet. E que isso não seja maior que eles, portanto deverão relevar, interpretar como brincadeira, mesmo que seja uma saraivada de comentários ofensivos. A internet está assim, e quem se arrisca a caminhar nessa selva, sabe que lobos e demônios aparecerão de todos os lados junto junto aos cordeiros. Portanto deve estar preparado, já que quer trilhar essa selva. 
 
Creio que esse Inferno, esse rio de fogo e labaredas, essas legiões de seres humanos demonizados, carregando um tridente, cutucando os outros, ferindo, machucando e rindo da desgraça está em toda a internet. Não está nem tanto no mundo real dos contatos físicos, mas a partir do momento que vamos para o mundo digital o inferno é infinito, cheio de buracos, cavernas, choros e labaredas. Na realidade, como diz a minha mãe “o inferno é aqui mesmo”.
 
Só tenho a dizer que é uma pena tudo isso. Triste demais. Uma criança tão linda, bem educada, uma família do bem sofrer a dor que nunca cessará. E saber que quem faz isso são seres humanos de carne e osso dá medo do homem… dá medo do mundo…

 

domingo, 1 de agosto de 2021

A roupa dos filhos


Photography: Khaled Flehan

A ROUPA DOS FILHOS
 
É praticamente uma regra que todos os pais queiram o bem dos filhos. Isso é indiscutível. A humanidade é isso. Desde o momento em que os filhos nascem, os pais começam a preparar os caminhos que eles deverão trilhar. Tudo começa a partir de pequenas coisas: os brinquedos, os banhos de sol, os passeios, as roupas, os alimentos, a iniciação escolar, a religiosidade (para alguns), até mesmo o time de futebol (no caso dos meninos, principalmente), a inserção no mundo profissional através dos cursos iniciais, enfim tudo o que os pais sabem, ensinam, e assim seguem planejando e encaminhando os filhos, buscando sempre o que entendem como melhor.
 
A atitude dos pais e das mães funciona como uma costureira, ou um estilista que costura roupas por encomenda. Assim os pais costurarão as roupas que concebem com adequadas para cada filho. Essa primeira formação dos filhos, que acontece da infância até praticamente a adolescência, é o período em que os pais viverão um intenso costurar. A casa se torna um ateliê. Os filhos estarão as roupas escolhidas pelos pais. Os pais escolheram as cores, os tipos de tecidos, os botões e acessórios. Desse modo, os pais entendem que vestem nos filhos as roupas ideais, e no bojo dessas “roupas ideiais” estará muito do que o pai e a mãe são. E nesse “são” dos pais estará muito do que os seus pais foram. Via de regra, a vida é assim. O meu pai dizia que vemos o que somos. E nesse caso eu digo que vestimos o que somos.
 
A vida é assim, um grande ateliê de costura, e por ser assim, os pais pensam estar acertando em seus figurinos, no ponto da costura, nas cores, nos designs. Mas no caudal da costura das roupas dos filhos, se todo pai e mãe pensarem bem, não ficariam tão apegados aos moldes herdados dos pais, avós e até bisavós, pois muitos desses figurinos estão ultrapassados, ficaram pequenos, o tecido ficou puído. Embora muitos pais não percebam, mal os filhos saem das fraldas, começam a vestir as roupas encontradas nas vitrines do mundo, pois o mundo é feito de costuras plurais, e não precisa ir longe para se encontrar com estilistas plurais, que trabalham com as matérias primas inimagináveis, cores impensáveis, e seguem outras linhas, abertos a todos os tamanhos e tipos. Eles podem morar ao lado de nossa casa.
 
Você vestiu a sua filha com vestidinhos de babado chegando no joelho, sapatinhos bem femininos, fitilhos no cabelo, ensinou-lhes modos considerados ideais para viver bem na sociedade. Mas a sua menina está de olho nas roupas da vizinha, da mesma idade, que mora defronte à sua casa. A outra menina usa shortinhos e bustiês iguais àquela dançarina do programa de televisão, detesta sapatos e meia, só usa chinelinhos rasteiros. É despojada, parece mais adulta. Enquanto vocês criticam os pais da menina despojada, dizendo que eles vestem a filha como uma moça adulta e sem muito pudor, eles te criticam pelo exagero, vendo-os como caretas e retrógrados. O que aconteceu? Aconteceu que vestimos nos filhos as roupas que estaríamos vestindo em nós, ou que pensamos ser a ideal.
 
O pai quer que o filho seja o seu herdeiro na administração da empresa. A mãe sonha para a filha a bailarina que ela não conseguiu ser. O pai prepara o terreno para o filho ser um jogador de futebol ao estilo “Ronaldo fenômeno”, mas, aos poucos o menino vestiu as roupas de surfista, vistas com um grupo de amigos na escola. A mãe operou milagres para a filha ser advogada, mas as roupas do Magistério apeteceram a filha já na escola, debaixo do nariz da mãe.
 
O menino que o pai lhe vestiu com roupas de administrador de empresa se tornou um administrador medíocre, faliu os negócios do pai, pois dentro dele sempre habitou a roupa de filósofo que nunca pode ser. Ou o foi por dentro. Não teria sido melhor permitir ao filho a realização da sua vontade? Hoje ele seria um filósofo, quem sabe renomado, quem sabe um respeitável mestre...
 
Aquela menininha de bustiê e shortinhos sumários, hoje é uma respeitável médica, autora de uma infinidade de livros. Ela escolheu as roupas que quis. Nunca foi podada em seu pensar e agir. A menina vestida com vestidinhos pomposos e bem femininos não avançou muito, sufocada pelos figurinos que os pais lhe impunham como único dogmas do bem. Então ela não teve tempo para alçar voos solitários e ver o mundo lá de cima, junto às nuvens, contemplando os mais impensáveis ateliês, vendo as mais diferentes roupas.
 
Também conheci a história de uma menina que cresceu cercada de cuidados. Eram tantos que não tinha vida própria. Os pais, ambos advogados, a vestiam como uma boneca. Ela vivia sob atenção constante e cheia de acessórios. Roubava a cena onde passasse. A possessão desses genitores sobre essa criança era tão ferrenha que, se pudessem, estudariam por ela e iriam aos lugares por ela. Até os seus livros e músicas que traziam para ela, obedeciam o gosto deles, enfim formavam uma menina-espelho. Essa criança cresceu e percebeu que ela não era ela porque os pais não a deixavam existir plenamente, e que o mundo não era uma clausura. Então, já deixando a adolescência, bateu o pé e se despiu essa terrível roupa da opressão e da projeção dos pais sobre ela. Hoje é uma renomada artista plástica conhecida internacionalmente. Hoje, usa roupas próprias, que ela escolheu, pois a vida pertence a ela.
 
Meus vizinhos são católicos praticantes. Há um casal cuja esposa é ministra da eucaristia. Eles fazem parte de um movimento católico e coordenam todos os eventos católicos na vizinhança. Eventualmente a rua é fechada e ocorrem celebrações defronte à casa deles, onde se reúnem os católicos da vizinhança. Mas chama a minha atenção um detalhe digno de reflexão: os três filhos desse casal (duas moças e um rapaz) saem todas as vezes que ocorrem celebrações de missas e terços. Eles demonstram claramente não se identificarem com as coisas do catolicismo, mesmo tendo crescido dentro de tais ensinamentos.
 
Curiosamente a nossa rua tem uma única família evangélica. Mora numa casa grande, cujos filhos, casados, habitam com os pais, de maneira que é uma parentela imensa. Tem bebê, tem pré-adolescentes, adolescentes, universitários, genros, noras e cunhados. O avô tem o hábito de andar sempre de calças sociais e camisas de mangas compridas. Tem uma aura polida. A avó está sempre metida em vestidos abaixo dos joelhos.Os mais novos fogem completamente da roupagem dos mais velhos. Dia desses o avô ralhava com o adolescente que chegou da Rio center com uma camiseta do Harry Potter. A universitária foi chamada a atenção por chegar em casa com uma rapaz que não é da igreja da família. Embora frequentadora de uma igreja evangélica pentecostal, a jovem usa vestidos e saias agarradas ao corpo e bastante curtos. Nada lembra a avó. O garoto do meio adora os filmes de ação e dentre os seus livros traz A Cabana, A vontade de ser invisível, Outlander, o viajante do tempo, Beijada por um anjo, A guerra dos tronos, Harry Potter, Fortaleza Digital, Anjos e Demónios, Código da Vinci dentre outros nessa roupagem. Há uma reprimenda terrível sobre essa biblioteca, mesmo que a Bíblia a integre também. Na realidade, há uma condenação constante aos mais novos, mas eles vestem essa roupa e dão sinais de que não a tirarão. Estão distantes dos estilistas dos pais e avós. 
 
Nos dias atuais, parece bastante difícil aos filhos acompanharem essas coisas de religião com a profusão dos pais, independente de que doutrina seja. Muitos vão à igreja força. Outros, batem o pé e não vão mesmo. Mas esse é outro assunto. Essa roupagem religiosa é algo complexo, até porque religião não define o caráter. Fosse assim não veríamos cada notícia assustadora proveniente dos templos. A internet traz toneladas desse tipo de material. Religião não define o caráter de ninguém, e torná-la uma obrigação afugenta.
Há lares nos quais os pais oferecem as piores roupas para os filhos, mas eles cresceram e se vestiram com as melhores roupas porque se inspiraram nos figurinos de um bom vizinho que se fazia modelo de bom caráter, e por si perceberam que o essencial é a índole do bem. Há pai - ou mãe - que por problemas mentais, pelo alcoolismo e outra mazela não ofereceu boas roupas aos filhos, mas tenha certeza que até mesmo no meio desse tipo de pai pode ter existido uma alma nobre e cheia de caráter. E essa roupa terá valido a pena.
 
Não perca tempo costurando roupas que os filhos não querem usar. Nem toda roupa serve para todos. Não desperdice energia impondo-lhes figurinos, cores de tecidos, tipos de acessórios, botões etc pois eles são eles. Eles não são vocês. Cada pessoa é um mundo. Deixem eles serem eles. Gaste o seu tempo com exemplos bons, priorize a melhor das roupas, que é o amor, a bondade, o respeito ao próximo, o amor aos estudos, o senso de justiça, a ética, a honestidade e o trabalho. Não sonhe o sonho dos outros. Não queira estar no lugar dos filhos. Não queira ser para os filhos. Deixe os filhos serem para eles. Eles decidirão qual a moda, o estilo, o jeito retrô, ultramoderno e outros mais. Não imponha-lhes o modelo que você considera ideal. Prioriza e roupa do bem. Prioriza a honestidade o trabalho e os valores. Ninguém é perfeito, mas persiga a roupa da perfeição para si e para eles. Essa roupa cabe em todos. Ninguém nunca será perfeito, mas perseguindo a perfeição com naturalidade e sem paranoias se obterá o melhor. Esqueça as outras roupas. Elas não soam mais atrativas para esse século.