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CONTATO: (Whatsapp) 84.99903.6081 - e-mail: luiscarlosfreire.freire@yahoo.com. Este blog - criado em 2008 - não é jornalístico. Fruto de um hobby, é uma compilação de escritos diversos, um trabalho intelectual de cunho etnográfico, etnológico e filológico, estudos lexicográficos e históricos de propriedade exclusiva do autor Luís Carlos Freire. Os conteúdos são protegidos. Não autorizo a veiculação desses conteúdos sem o contato prévio, sem a devida concordância. Desautorizo a transcrição literal e parcial, exceto breves trechos isolados, desde que mencionada a fonte, pois pretendo transformar tais estudos em publicações físicas. A quebra da segurança e plágio de conteúdos implicarão penalidade referentes às leis de Direitos Autorais. Luís Carlos Freire descende do mesmo tronco genealógico da escritora Nísia Floresta. O parentesco ocorre pelas raízes de sua mãe, Maria José Gomes Peixoto Freire, neta de Maria Clara de Magalhães Fontoura, trineta de Maria Jucunda de Magalhães Fontoura, descendente do Capitão-Mor Bento Freire do Revoredo e Mônica da Rocha Bezerra, dos quais descende a mãe de Nísia Floresta, Antonia Clara Freire. Fonte: "Os Troncos de Goianinha", de Ormuz Barbalho, diretor do Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte, um dos maiores genealogistas potiguares. O livro pode ser pesquisado no Museu Nísia Floresta, no centro da cidade de nome homônimo. Luís Carlos Freire é estudioso da obra de Nísia Floresta, membro da Comissão Norte-Riograndense de Folclore, sócio da Sociedade Científica de Estudos da Arte e da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência. Possui trabalhos científicos sobre a intelectual Nísia Floresta Brasileira Augusta, publicados nos anais da SBPC, Semana de Humanidade, Congressos etc. 'A linguagem Regionalista no Rio Grande do Norte', publicados neste blog, dentre inúmeros trabalhos na área de história, lendas, costumes, tradições etc. Uma pequena parte das referidas obras ainda não está concluída, inclusive várias são inéditas, mas o autor entendeu ser útil disponibilizá-las, visando contribuir com o conhecimento, pois certos assuntos não são encontrados em livros ou na internet. Algumas pesquisas são fruto de longos estudos, alguns até extensos e aprofundados, arquivos de Natal, Recife, Salvador e na Biblioteca Nacional no RJ, bem como o A Linguagem Regional no Rio Grande do Norte, fruto de 20 anos de estudos em muitas cidades do RN, predominantemente em Nísia Floresta. O autor estuda a história e a cultura popular da Região Metropolitana do Natal. Há muita informação sobre a intelectual Nísia Floresta Brasileira Augusta, o município homônimo, situado na Região Metropolitana de Natal/RN, lendas, crônicas, artigos, fotos, poesias, etc. OBS. Só publico e respondo comentários que contenham nome completo, e-mail e telefone.

terça-feira, 18 de junho de 2019

O encontro de Nísia Floresta com o Papa Pio IX - 1858


O ENCONTRO DE NÍSIA FLORESTA COM O PAPA PIO IX - 1858

PIO IX SENDO CONDUZIDO DURANTE SOLENIDADE - 1870

       
As páginas da história de Nísia Floresta, por vezes se assemelham àquele casarão palaciano antigo e abandonado, permeado de tesouros intocáveis que você deduz existir ali, mas não tem acesso. Ei-la adiante. É uma página apenas. Mas de grande interesse histórico. E essa página aparentemente despretensiosa nos instiga a estudar mais e mais a história dessa brasileira notável, que adiantou-se no tempo. Em 2012 um amigo, professor da UFRN, conhecedor dos meus estudos sobre a nossa Nísia, me perguntou se era verdadeira a informação de que ela esteve com um Papa. Então decidi escrever e postar no meu blog, estendendo a informação a todos. Reuni todas as informações desse encontro, anexando comentários meus e contextualizando esse momento com a História da Itália naquele instante. 
Na realidade, Nísia Floresta fazia uma espécie de "tour" por algumas partes da Europa, acompanhada por sua filha Lívia Augusta. E exatamente no dia 6 abril de 1858 ela visitou o Papa Pio IX, acompanhada de sua filha Lívia Augusta. A mãe contava 48 anos de idade. A filha, 28. Esse encontro é curiosíssimo e nos permite várias reflexões. Uma delas é a inquestionável condição católica da nossa ilustre potiguar. Digo isso porque estando na Itália, e se referindo ao seu encantamento diante do palácio de São Pedro, ela disse que o local era a “morada do humílimo representante do Cristo sobre a terra”. Leia o trecho ipsis literis:

“(...) Ali estava eu, não dentro de um templo antigo ou de um palácio de imperador romano, enriquecidos e embelezados com preciosos despojos da Grécia artística ou de poderoso e maravilhoso Egito, mas sob as abóbadas da morada do humílimo representante do Cristo sobre a terra (...)”.

Sobre esse mesmo encontro ela escreveu que:

“Qualquer veneração que o Sumo Pontífice sempre me tenha inspirado, ele que libertou oitocentos oprimidos, em 1848, para a grande causa da independência italiana, não tivera jamais a ideia de, vindo a Roma, procurar ser recebida por Sua Santidade”.

Constata-se igualmente ao presente, que ela tinha veneração pelo Papa como ocorre aos católicos. Na realidade, Nísia Floresta trazia uma característica interessante em sua escrita: sua obra revela praticamente sua biografia. Você a descobre, lendo-a, mesmo que ela não tenha escrito sua própria biografia. Ela externa a sua opinião, despercebidamente, à medida que aborda assuntos pessoais diversos, comparando sempre, ou se lembrando de algo aqui e ali. Sobre a sua religião, posso garantir ao leitor que era católica fervorosa. Mas era altamente crítica. A exemplo disso, bem atrás, no seu “Um Passeio ao Aqueduto da carioca” ela faz severas críticas às freiras enclausuradas, entendendo que as mesmas deveriam usar o seu tempo para atividades concretas diante dos pobres e doentes, e jamais para ficarem entre quatro paredes. Em outras obras, ela critica severamente a vida pomposa e nababesca na qual viviam os padres, em detrimento da miséria do povo. Se viva, hoje, se envolveria em muitas polêmicas! Não seria uma católica muito católica. Diferente daqueles que mesmo vendo arbitrariedades dos religiosos se aquietam e os favorece para não desagradá-los, ela os alardearia sem receio algum, a favor da justiça pertinente. Curioso é que uma das perguntas que mais ouço é “qual era a religião de Nísia Floresta”? Há uma tendência a considerá-la atéia, agnóstica, ou alheia às questões espirituais. Interessantemente disso tudo é o fato de Nísia Floresta pincelar grande parte de sua obra com considerações tipicamente católicas. Leitora voraz, conhecia a bíblia profundamente. Sabia decorada a história de quase todos os santos. E esse seu conhecimento religioso amparava grande parte de suas reivindicações e críticas.
       Na sua visita ao Papa, Nísia Floresta estava acompanhada por uma princesa russa, uma condessa e uma marquesa italianas. Constata-se, como é óbvio, que a audiência fora tratada com bastante antecedência, pois ela trazia uma permissão escrita e timbrada com o Selo Papal. Então ela e as demais senhoras adentraram ao palácio permeado de guardas e funcionários, entregando o documento ao secretário direto do Papa Pio IX. Vencida essa etapa, foram convidadas a entrar numa ante-sala. Naquele exato momento saiam senhoras da alta sociedade europeia que acabavam de participar de uma audiência.



Nísia Floresta, Lívia Augusta e as demais mulheres trajavam roupa preta. O véu fora colocado sobre a cabeça e pendia até a cintura. Foram convidadas a sentar em grandes poltronas vermelhas. A sala era decorada por grandes quadros retratando episódios testemunhados pelo Vaticano. Nísia Floresta desaprovou a atitude das monarcas que estavam ao seu lado, as quais não se comportavam como tais. Mas ela não entrou em detalhes.
Ela nos conta que, junto havia uma americana de Boston. Após a audiência com o Papa, ela contou a Nísia Floresta que vinha de uma família evangélica e procurara Roma para abraçar a religião católica, contrariando a vontade do marido e da família. Essa senhora se emocionou muito, pois queria ter trazido a filha, assim como Nísia, mas o marido a proibiu. Ela temia jamais revê-la. 
Sobre esse detalhe singular da visita, Nísia Floresta escreveu: 

“(...) Escutei, em silêncio, aquela história tocante, e me perguntei qual das duas segue melhor os preceitos de Cristo, se a mulher que pratica de coração as virtudes de esposa e mãe no seio da família, ou aquela que a abandona, deixando no desespero uma filha e um marido que a ama e de cujo destino ela jurou participar. Essa reflexão naturalmente nos conduziu a muitas outras que o assunto e o lugar onde me encontrava me sugeriam largamente (...)”.




PIO IX DISCURSANDO EM 1863

As palavras acima, escritas de próprio punho, nos oferecem reflexões preciosas. Sabemos que Nísia Floresta, aos 13 anos, se juntou a um homem escolhido por livre e espontânea vontade. Manuel Alexandre Seabra de Melo, mipibuense com pés fincados num engenho, cujo seu mundo era limitado por muros de cana-de-açúcar. Resultado: a “união” não durou um ano. Ela viu no casamento o presídio de seus sonhos. Nísia era uma mulher universal. Almejava conhecer outros países, visitar universidades, museus, estudar, aprender outras línguas, escrever livros enfim. Mas os grilhões tão comuns às pernas dos escravos negros lhe pesaram também. O marido “ultrajado” a perseguiu durante toda a vida. As leis da época permitiam coabitação à força. Mas ele nunca a reencontrou. Com certeza a experiência que ouviu dessa infeliz mulher lhe tocou profundamente, pois ela sabia, por experiência, o que era ser tratada com autoritarismo.Nísia Floresta detestava formalidades, e sobre esse encontro  com o Papa, mesma escreveu:
          
“Antipatizando-se sempre com as formalidades, não me submeto a elas senão com esforço e quando espero ser útil ou agradável a alguém”.
Nota-se que ela se esforçava para lidar com ambientes com formalidade. Nesse ponto somos levados a lembrar dos saraus organizados por ela, em Paris, onde recebia os mais notáveis cérebros, anunciados aos demais presentes, sem formalidades e com grande festividade. Diferente do momento no qual se encontrava. O fato de ela ter ido espontaneamente ao vaticano e marcado audiência com o Papa, deixa claro a sua condição católica, e o quanto o Sumo Pontífice significava para ela. Na realidade esse encontro teve influência do arcebispo do Rio de Janeiro, que, conversando com Nísia Floresta, anos antes, tanto enalteceu o representante supremo da Igreja Católica que Nísia Floresta inspirou-se a conhecê-lo. E pessoalmente.



Se o leitor estranha um casamento aos 13 anos, é importante saber que foi muito comum no passado. No caso de Nísia, seu casamento não foi algo arranjado por seus pais e os pais do marido. Foi um caso de amor entre uma adolescente e um homem maduro. Hoje seria pedofilia, mas à época era comuníssimo. A diferença está no fato de não ter sido algo forçado. Tanto Dionísio Lisboa quanto Antonia Freire tinham uma mentalidade que diferia das vizinhanças, talvez por isso que parte da família de Nísia (que morava em Goinainha), não gostou desse casamento e se sentiu ultrajada com a separação. Mas no caso dos demais casamentos arranjados, normalmente duravam a vida inteira. Assim surgiram famílias que muitas vezes geravam vinte filhos. Boa parte das mulheres se calava a todo tipo de maltrato e adultério do marido – muitas fezes com escravas e até parentas – na tentativa de não ficar falada nem “desonrar” a família. Abandonar um casamento era um misto de crime e pecado. A infeliz que incorresse a tal “loucura” ficaria desonrada. Isso explica o fato de muitas moças de família, até mesmo até a metade do século XX, quando se separavam, viam nos prostíbulos a única alternativa, pois toda a sociedade já lhe impingia o rótulo de puta e repiputa pelo simples ato de se separar do marido. A mulher era indesejada pela família e amigos. Restava-lhe ser calhandeira. Sem opção.
Mas vamos voltar ao diálogo entre Nísia e a mulher. Quando Nísia Floresta critica a ex-evangélica por ter “abandonado o marido”, soa contraditório, pois ela também abandonou o seu. Qual autoridade para a crítica? Mas a crítica de Nísia procede e tem fundamento, pois ela se refere ao pecado da quebra de um juramento feito no altar, diante de Deus. A mulher de Boston era uma mulher casada oficialmente. Fato que não aconteceu a Nísia Floresta. Ela “era junta”, como se diz no Nordeste.





Nísia, que era católica, via no juramento feito no altar, um preceito sagrado e inviolável. Nesse, e em muitos pontos – para estranheza de muitos – Nísia era até conservadora. Diferente do que tantos comentam. É outra história, afinal ela oscilava algumas de suas interpretações. Umas se lapidaram ao longo do tempo, outras não. A sua primeira união não teve juramento, teve adolescência à flor da pele e hormônios explodindo. Os pais acreditaram nessa união, e para surpresa de todos, também acreditaram na separação. Eram liberais. Por essas modernidades se tornaram tema de conversas nas casas e engenhos da Papari mergulhada em tabus e preconceitos diversos como já tratamos.


PRAÇA SÃO PEDRO DURANTE A BENÇÃO PAPAL DE PIO IX
Retomando o encontro com o Papa Pio IX. Enfim, chega a hora de as visitantes serem anunciadas. A primeira foi a americana. Sobre essa mulher, Nísia Floresta também escreveu suas impressões:

“(...) Pobre mãe! Pensei, que nunca tenhas de te censurares por ter abandonado tua filha em uma idade em que a prudência materna seria seu melhor guia do mundo! (...).

Quando anunciam o seu nome e o da filha, ela sentiu o coração pulsar forte e se emocionou. Lívia Augusta estava extasiada, como se não acreditasse naquele encontro. Enfim, elas caminharam até a porta da espaçosa sala de audiências, e lá estava Pio IX. Ele estava em pé, trajava uma túnica branca, ao fundo da sala, a mão esquerda se apoiava em uma mesa onde havia um crucifixo, um livro e uma tabaqueira.

Esse encontro é tão revelador que vale a pena ser transcrito:

“(...) Sua fisionomia irradiava uma expressão de celeste bondade e unção, que eu vira em alguém. Apenas chegamos perto dele, estendeu-nos a mão: beijei-a respeitosamente, e minha filha seguiu meu exemplo. Depois ele me perguntou com certa dificuldade, em minha língua materna, se fazia muito tempo que havíamos deixado o Brasil e se eu tinha a intenção de fixar-se em Roma, acrescentou, logo, em italiano.
As primeiras palavras em português e a doce bondade com que foram pronunciadas pelo Chefe da Igreja, diante de quem eu trazia todas as recordações da família e da pátria, produziram, em meu coração, uma emoção profunda e, em meu espírito, um efeito maravilhoso. Acreditei, um momento, perceber, através de uma nuvem pura e diáfana, a imagem dos queridos autores de meus dias: um excelente pai, vítima de seu devotamento, uma terna mãe, resignada na dor suavizada pela religião católica, que lhe derramava n’alma o mais alutar consolo: um, morrendo por um pobre oprimido de quem patrocinara a causa; a outra, sobrevivendo-lhe alguns anos para consolar quem sofria em torno dela. A visão se dissipou... Eu estava diante do Papa. “A senhora viaja com sua filha”, perguntou-me, “e não tem outros filhos?” Respondi-lhes mostrando a miniatura de meu filho. (Nísia Floresta se refere a um camafeu com a fotografia do filho Augusto Américo de Faria Rocha). Tomando-a às mãos, aplaudiu meu cuidado materno, e acrescentou que pela primeira vez uma mãe lhe trazia, assim, a efígie do filho, não podendo conduzir o original. Depois, perguntou quem era a jovem representada ao lado dele. Ao saber que era a esposa, disse: “tão jovem ainda e já casado”. E deu-lhes a benção.
Contei-lhes em poucas palavras a minha dor, causada pela morte de minha mãe, bem como a finalidade de minhas viagens. Dos lábios de Pio IX escaparam palavras consoladoras e cheias de unção. Em sua indulgente bondade, dignou-se louvar os meus sentimentos de filha. Aconselhou-me escolher Roma para fixar residência. A permanência em Rora, no seu entender, conviria à situação moral em que meu espírito se encontrava. Algumas considerações que acrescentou fizeram-me melhor apreciar a pureza de seu coração e me convenceram mais ainda do seu desconhecimento relativamente ao que ocorre nesta cidade. Seu olhar doce e calmo brilhava como um raio divino, à medida que falava. Eu me sentia subjugada sob a influência desse olhar, daquelas palavras que ele tirava da sua verdade suprema. Ali estava, realmente, o digno e venerável chefe da Igreja, o Pontífice reluzente da luz da caridade. Ali estava o verdadeiro e grande poder espiritual, mais capaz de convencer e mais digno triunfar do que toda e qualquer outra potência humana (...)".

Esse diálogo nos permite tratar sobre diversos bastidores, como por exemplo o casamento de Augusto de Faria Rocha, filho de Nísia. Observe que o Papa estranhou o fato de ele, tão novo, já ser casado. Anos antes, no Brasil, Nísia Floresta teve uma das grandes decepções de sua vida quando, inesperadamente, o filho Augusto Américo a comunicou, por carta, que estava casado. Ela sofreu tanto que quase tentou desmanchar a decisão do filho. A decepção a fez adoecer. Creio que podemos entender a sua decepção a partir de sua própria história. Nísia Floresta era uma intelectual que buscava todas as formas de conhecimento possíveis. Seja qual for o local que estivesse, procurava imediatamente freqüentar bibliotecas, cursos, escolas, museus, ruínas, lugares históricos enfim, não perdia tempo. Sua sede de conhecimento era insaciável. Com certeza ela vislumbrava outros universos para o filho. Na realidade ele não a decepcionaria nesse sentido, mas isso é outra história.
Enfim, após uma boa conversa ela e a filha se despedem do Papa, recebem a benção e saem. Sobre esse encontro Nísia também escreveu uma observação curiosa. Como sabemos, ela era muito crítica, e não esqueceu de comentar sobre a riqueza desmedida em que viviam o Papa e todos os religiosos que se abrigavam na corte papal.

“(...) Escutando aquelas palavras, esqueci o fausto da corte papal que choca todos os espíritos versados nas grandes lições do Evangelho; esqueci também todos os abusos de que esta corte se cercou. Na verdade, vi um coração repleto de grandes virtudes, que poderia fazer à felicidade a uma parcela da humanidade, se não lhe faltasse energia! E lamentei que o espírito do grande reformador de 1848 não estivesse em harmonia com o seu coração. Deplorei ainda que atos de injustiça e tirania, praticados em seu nome, tivessem diminuído a simpatia generalizada que até bem pouco tempo inspirava e fizessem com que seu poder se confundisse com o das potências políticas do mundo (...)”.


As reflexões abaixo, também escritas por Nísia Floresta são impressionantes. Ela não cita exemplos, mas divaga coisas fortes, facilmente captadas por espíritos inteligentes. Leia:

“(...) Quando temos acesso a esse pontífice e o ouvimos, é impossível não sofrer a influência quase celeste de sua bondade. Encontramo-nos em uma atmosfera bem diversa daquela que subjuga o espírito de seus subordinados! “Subordinados”, digo. São Pedro, o humilde servidor de Jesus Cristo, jamais se arrogou o direito de ter subordinados? Oh! através de que labirinto de contradições os pomposos sucessores do santo apóstolo, do simples pescador,  conduziram sua grande obra? Junto de Pio IX, esqueci tudo isso. Mas, tornei a me aperceber, ao me despedir dele e ao lançar um olhar sobre essa Roma moderna!

É tão impressionante o texto acima que julga-se refletirmos sobre alguns trechos. Quando ela diz :

“Eu me sentia subjugada a influência desse olhar, daquelas palavras que ele tirava da fonte da verdade suprema”.

Essas palavras reforçam o catolicismo que já falamos. Para ela o Papa era o intermezzo da verdade suprema. Revejam:

“Ali estava, realmente, o digno e venerável chefe da igreja, o Pontífice reluzente da luz da caridade. Ali estava o verdadeiro e grande poder espiritual, mais capaz de converncer e mais digno de triunfar do que toda e qualquer outra potência humana”.

Enfim, Nísia Floresta e Lívia deixam o Palácio de São Pedro, maravilhadas com a experiência. Próximo dali Nísia Floresta vivenciou uma experiência muito constrangedora, mas será contada n’outra oportunidade, acaso o leitor insista nessa página de memórias velhas. 
Apenas para esclarecimento, o Papa Pio IX foi o primeiro a ser fotografado na história dos Papas, e praticamente o seu acervo de fotos faz parte do primeiro do mundo, pois não existiam máquinas fotográficas, nem as imagens eram obtidas já com a perfeição que se vê. 



FUNERAL DE PIO IX - 1872

VEJA, ABAIXO, INFORMAÇÕES SOBRE PIO IX, RETIRADAS DA WIKIPÉDIA


TÚMULO DE PIO IX NA BASÍLICA DE SÃO LOURENÇO


Pio IX, nascido Giovanni Maria Mastai-Ferretti (Senigália13 de maio de 1792 - Roma7 de fevereiro de 1878), foi Papa durante 31 anos, 7 meses e 22 dias, entre 16 de junho de 1846 e a data de seu falecimento. É o segundo pontificado mais longo da história depois de São Pedro. Foi beatificado em 3 de setembro de 2000, pelo Papa João Paulo II. Foi o primeiro Papa da história a ser fotografado.
Giovanni Mastai-Ferretti nasceu em Senigália (Itália) e estudou no Colégio Piarista em Volterra, e em Roma. De origem nobre, por sofrer de epilepsia não conseguiu seguir uma carreira militar, tendo seguido teologia e sendo ordenado sacerdote em 1819. Trabalhou nos primeiros anos do sacerdócio no Chile, regressando ao seu país em 1825. Nomeado arcebispo de Spoleto em 1827 e cinco anos depois para a diocese de Imola. Elevado a Cardeal em 1840.
A sua eleição para Papa sucessor de Gregório XVI foi o resultado de uma divisão no conclave entre conservadores e reformadores. Mastai-Ferretti era tido por candidato liberal, e, ao quarto escrutínio, foi eleito. Tomou o nome de Pio IX como homenagem ao Papa Pio VIII, seu antigo benfeitor. Foi coroado em 21 de Junho de 1846.
Apesar de ser considerado no início como um liberal, o seu pontificado passou a ser considerado como uma mudança no sentido do conservadorismo por seus críticos. Pio IX iniciou uma campanha contra o que chamou de falso liberalismo. Na encíclica Quanta Cura de 8 de dezembro de 1864, condenou dezesseis proposições que contrariavam a visão católica na época. Esta encíclica foi acompanhada pelo famoso Syllabus errorum, que condenava as ideologias do panteísmonaturalismoracionalismoindiferentismosocialismocomunismofranco-maçonariajudaísmoIgrejas dadas como Cristãs a tentar explicar a Bíblia e vários outras formas de liberalismo religioso tidos por incompatíveis com a religião católica. Antes, em 8 de janeiro de 1857, já havia feito a condenação dos escritos filosófico-teológicos de Günther e em muitas ocasiões insistiu em que se deveria seguir a filosofia e a teologia de São Tomás de Aquino.

Durante toda sua vida foi muito devoto da Virgem Maria . Em 1849, quando se encontrava no exílio, em Gaeta, consultou o ponto de vista dos bispos da Igreja a respeito da Imaculada Conceiçãoenviando-lhes cartas, e em 8 de dezembro de 1854, na presença de mais de duzentos bispos proclamou o dogma da Imaculada Conceição da Virgem Maria como sendo um dogma de fé da Igreja através da encíclica Ineffabilis Deus.
Promoveu a devoção ao Sagrado Coração e em 23 de setembro de 1856 estendeu esta festividade a todo o mundo católico, em 16 de junho de 1875 consagrou o mundo ao Sagrado Coração de Jesus. Promoveu a vida interna da Igreja por meio de muitas normas litúrgicas e reformas monásticas e um elevado número de beatificações e canonizações, sem precedentes para a época.
Em 29 de junho de 1869 publicou a Bula Aeterni Patris com a qual convocou o Concílio Vaticano I, cuja cerimônia de abertura contou com a presença de setecentos bispos no dia 8 de dezembro de 1869. Na quarta sessão solene do concílio, em 18 de julho de 1870, a infalibilidade papal foi declarada um dogma de fé. Criou os cardeais Wiseman e Manning da InglaterraCullen da IrlandaMcCloskey dos Estados UnidosDiepenbrockGeisselReisach e Ledochowski da AlemanhaRauscher e Franzelin da ÁustriaMathieuDonetGousset e Pita da França.
Em 29 de setembro de 1850 restabeleceu a hierarquia católica na Inglaterra erigindo a Arquidiocese de Westminster com as sedes sufragâneas de BeverleyBirminghamCliftonHexhamLiverpoolNewport e MeneviaNorthamptonNottinghamPlymouthSalfordShrewsbury e Southwark. Este ato provocou uma ampla comoção por parte de ingleses intolerantes, fomentada pelo Premier Russel e pelo London Times que quase resultou em perseguição aberta contra os católicos na Inglaterra. Em 4 de março de 1853restabeleceu a hierarquia católica na Holanda, erigindo a Arquidiocese de Utrecht e as sedes sufragâneas de HaarlemBois-le-DucRoermond e Breda.

Foi em seu pontificado em que houve o cisma ente o Papado e o Império do Brasil. Pio IX estabeleceu uma série de documentos condenando as novas ideias, entre elas a Maçonaria. No Brasil havia, instituição herdada da monarquia portuguesa, chamado padroado. Ele determinava que qualquer determinação da Santa Sé, no Brasil, somente seria válida com a autorização do Imperador. Uma delas foi a proibição de casamento entre católicos e maçons. D. Pedro II não assinou e gerou problemas na atuação dos padres brasileiros. Os bispos D. Vital e Macedo Costa seguiram as determinações do Papa e gerou uma crise do País com o Vaticano. Os bispos foram presos e condenados a prisão. O caso somente foi resolvido quando o império mandou um diplomata a Roma.
Pio IX aboliu leis que forçavam os judeus a viver em áreas específicas, os impediam de praticar certas profissões, e os obrigavam a ouvir sermões quatro vezes por ano em tentativas de conversão. O Judaísmo e o Catolicismo eram as únicas religiões permitidas por lei (o Protestantismo era permitido aos estrangeiros mas não autorizado a italianos). Mesmo assim, o testemunho de um judeu em tribunal contra um cristão era inadmissível aos olhos da lei.
Em 1858, num caso altamente divulgado na época, uma criança judia de seis anos, Edgardo Mortara, foi levado de sua casa pela polícia para os Estados Papais. Foi referido que havia sido batizado por uma empregada cristã da família quando estava doente, por temer que não fosse para o Céu. Naquele tempo os cristãos não podiam ser criados por judeus, mesmo se fossem seus pais. Pio recusou os apelos de numerosos chefes de estado, incluindo o Imperador Francisco José I da Áustria e o Imperador Napoleão III de França para o retorno da criança a seus pais.
Estabelecimento da República Romana[editar | editar código-fonte]
O ano de 1848 foi muito agitado na Europa, tendo-se iniciado com revoltas na Sicília. Em 14 de Março, a desordem pública forçou Pio IX a conceder uma constituição e um parlamento. O Rei Carlos Alberto da Sardenha declara guerra à Áustria nove dias depois. O levantamento popular continuou e um dos ministros que tinham sido nomeados pelo Papa para tentar agradar aos revolucionários foi assassinado em 15 de Novembro.
O Papa foi cercado por uma multidão no Quirinal mas escapou com um disfarce em 24 de Novembro para o Reino de Nápoles, ficando a cidade de Roma nas mãos dos revoltosos. Só em 12 de Abril de 1850 retornaria a Roma, após intervenção diplomática da França e da Áustria. Crê-se que Pio IX tenha regressado afetado por esta violência e convertido para o lado conservador. Os revolucionários ainda estavam no terreno e a manutenção dos Estados Papais, sujeita à pressão de nacionalistas como Victor Emanuel II de Itália só se conseguiu com a ajuda de tropas francesas e austríacas.
Unificação italiana
Em 1858 Napoleão III e o Conde de Cavour declaram em conjunto guerra à Áustria. Na sequência da Batalha de Magenta (4 de Julho de 1859) as forças da Áustria retiram-se dos Estados Papais, precipitando assim a sua queda. Em Fevereiro de 1860, Victor Emanuel reclama a Umbria e a região das Marches; ao serem recusadas, toma-as pela força. Ao derrotar o exército papal em 18 de Setembro, em Castelfidardo, e em 30 de Setembro em Ancona, Victor Emanuel toma todos os territórios papais excepto Roma.
Em Setembro de 1870 cerca Roma, tornando-a capital da nova Itália unificada. Concede a Pio a "Lei das Garantias" (15 de Maio de 1871) que dá ao Papa direitos de soberania, uma quantia anual fixa e a extraterritorialidade dos palácios papais de Roma. Pio IX nunca aceitou a oferta oficialmente, mantendo a pretensão sobre os territórios conquistados. Embora não tenha sido preso ou impedido de viajar à sua vontade, declarava-se prisioneiro no Vaticano. Além disso, proibiu os católicos italianos de votar nas eleições do novo reino italiano. Essa incômoda questão de disputas entre o Estado e a Igreja fica conhecida com o nome de Questão Romana e só termina em 1929, quando Benito Mussoliniassinou com o Papa Pio XI a Concordata de São João Latrão.
Pio IX escreveu algumas encíclicas a condenar determinadas teorias recém-surgidas como o comunismo e as ações anticristãs. Em 8 de Dezembro de 1864, Pio IX escreve a encíclica Quanta Cura cujo Syllabus lista 80 dos "principais erros do nosso tempo". O 80º erro era que o Pontífice Romano tem de se reconciliar e acordar com o liberalismo e civilização moderna. Esta encíclica criticava abertamente aquilo que na altura era conhecido como americanismo.
Praça de São Pedro durante a benção papal no dia 25 de Abril de 1870.
Num balanço do pontificado, pode ser considerado um conservador. Como curiosidade o seu nome (Pio Nono) - era referido pelos italianos antipapistas como Pio No No.
O seu túmulo está na igreja de San Lorenzo fuori le mura. A sua controversa beatificação iniciou-se em 11 de Fevereiro de 1907 e foi relançada por três vezes antes de Pio IX ser declarado Venerável (6 de Julho de 1985). Ele foi finalmente beatificado em 3 de Setembro de 2000, juntamente com João XXIII, por João Paulo II. Sua festa litúrgica é comemorada no dia 7 de fevereiro, data de seu falecimento. Sobre ele afirmou o Papa João Paulo II:
Ao ouvir as palavras da aclamação ao Evangelho: "Senhor, guia-nos pela recta via", o pensamento dirige-se espontaneamente para as vicissitudes humana e religiosa do Papa Pio IX, João Maria Mastai Ferretti. Perante os acontecimentos turbulentos do seu tempo, ele foi exemplo de incondicionada adesão ao depósito imutável das verdades reveladas. Fiel em qualquer circunstância aos empenhos do seu ministério, soube dar sempre a primazia absoluta a Deus e aos valores espirituais. O seu longuíssimo pontificado não foi deveras fácil e teve que sofrer muito no cumprimento da sua missão ao serviço do Evangelho. Foi muito amado, mas também muito odiado e caluniado.[1]
Mas precisamente no meio destes contrastes brilhou mais resplandecente a luz das suas virtudes: as prolongadas tribulações mitigaram a sua confiança na divina Providência, de cujo soberano domínio sobre as vicissitudes humanas ele jamais duvidou. Nascia aqui a profunda serenidade de Pio IX, mesmo no meio das incompreensões e dos ataques de tantas pessoas hostis. Gostava de dizer a quem lhe estava próximo: "nas coisas humanas é necessário contentar-se em fazer o melhor que se pode e no resto abandonar-se à Providência, que curará os defeitos e as insuficiências do homem".[1]
É conhecida a profunda veneração que o Papa João tinha pelo Papa Pio IX, do qual desejava a beatificação. Durante um retiro espiritual, em 1959, escrevia no seu Diário: "Penso sempre em Pio IX de santa e gloriosa memória, e imitando-o nos seus sacrifícios, desejaria ser digno de celebrar a sua canonização" (Jornal da Alma, Ed. S. Paulo, 2000, p. 560).[1]
Descrição: Escudo eclesiástico esquartelado: o 1º e o 4º de blau com um leão coroado, apoiado sobre uma arruela, tudo de jalde – Armas dos Mastai; o 2º e o 3º de argente com duas bandas de goles – Armas dos Ferretti. O escudo está assente em tarja branca. O conjunto pousado sobre duas chaves decussadas, a primeira de jalde e a segunda de argente, atadas por um cordão de goles, com seus pingentes. Timbre: a tiara papal de argente com três coroas de jalde. Quando são postos suportes, estes são dois anjos de carnação, sustentando cada um, na mão livre, uma cruz trevolada tripla, de jalde.
Interpretação: O escudo obedece às regras heráldicas para os eclesiásticos. Nele estão representadas as armas familiares do pontífice, os Mastai, de Crema, e os Ferretti, condes em Ancona. No 1º e no 4º, o campo de blau (azul) representa o firmamento celeste e ainda o manto de Nossa Senhora, sendo que este esmalte significa: justiça, serenidade, fortaleza, boa fama e nobreza. O leão, símbolo de soberania, força e poder, sendo de jalde (ouro), simboliza: nobreza, autoridade, premência, generosidade, ardor e descortino. No 2º e no 3º, o campo de argente (prata) simboliza: inocência, castidade, pureza e eloquência e as bandas de goles (vermelho) simboliza: o fogo da caridade inflamada no coração do Soberano Pontífice pelo Divino Espírito Santo, que o inspira diretamente do governo supremo da Igreja, bem como valor e o socorro aos necessitados, que o Vigário de Cristo deve dispensar a todos os homens. Os elementos externos do brasão expressam a jurisdição suprema do papa. As duas chaves "decussadas", uma de jalde (ouro) e a outra de argente (prata) são símbolos do poder espiritual e do poder temporal. E são uma referência do poder máximo do Sucessor de Pedro , relatado no Evangelho de São Mateus, que narra que Nosso Senhor Jesus Cristo disse a Pedro: "Dar-te-ei as chaves do reino dos céus, e tudo o que ligares na terra será ligado no céu, e tudo o que desligares na terra, será desligado no céu" (Mt 16, 19). Por conseguinte, as chaves são o símbolo típico do poder dado por Cristo a São Pedro e aos seus sucessores. A tiara papal usada como timbre, recorda, por sua simbologia, os três poderes papais: de Ordem, Jurisdição e Magistério, e sua unidade na mesma pessoa.



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