O HISTÓRICO “VOTO DE
CARBONO” EM NÍSIA FLORESTA
Tudo na vida
evolui a partir de erros e acertos comandados pelo tempo. As transformações
positivas são lentas porque são lapidadas pelo crivo de múltiplos fatores. Herdamos
o autoritarismo e o mandonismo dos antigos reis de Portugal. Depois veio o
coronelismo. Veio a ditadura militar e só muito tempo depois surgiu a
democracia.
Passamos séculos
só recebendo ordens, sem o direito de questionamentos. Foi tanto tempo subjugado
que até hoje muita gente têm medo dos “novos coronéis”. As pessoas perdem a sua
dignidade sem perceber. Há um medo no ar. Algumas pessoas votam em crápulas,
mesmo sabendo, mas temerosas de uma retaliação, de algo que possa lhe fazer
mal. Triste!
No Rio Grande do
Norte o coronelismo deu lugar à politicagem que está dando – embora vagarosamente
– lugar à política. É uma coisa meio acanhada e troncha, mas há mudanças
positivas. Isso é bom, até porque, do contrário, seria um caos.
Quando cheguei em Nísia Floresta, conheci um
procedimento incrível chamado “Voto de Carbono”. Era assim: no “escondidinho”
de uma casa o eleitor recebia um “sanduíche” que consistia em duas cédulas de
papel (espécie de cópia que obedecia o modelo oficial). No meio delas ficava um
carbono.
Quando a pessoa
escrevesse algo na cédula superior, preenchia-se automaticamente a cédula
debaixo. Por incrível que pareça, isso não era feito de forma muito
“segredosa”. Pelo menos na dita casa não notei cuidado extremo, tendo em vista
tratar-se de um crime. Mas explicar isso fica para depois!
Quando o pobre
eleitor chegava no local de votação, recebia a cédula oficial e, na cabine de
votação (bem escondidinho!), refazia o “sauduíche oficial” (do mesmo modo
explicado acima). Sem esquecer que deveria colocar na urna a cédula oficial. Em
seguida corria até a casa de origem e entregava o “sanduíche”.
Normalmente isso
acontecia na residência de algum candidato, parente ou aderente.
Ao entregar o
restante do “sanduíche”, estava “provado” – ou aparentemente provado – que o eleitor
realmente havia voltado no “cabra” que lhe pediram. Aí, só depois disso, ele
recebia dinheiro em espécie. Era o “pagamento” pelo voto.
Isso era o voto
de carbono!
Curioso é que
houve vários casos de votos anulados. O eleitor se atrapalhava na hora de
separar a cédula oficial da cédula não oficial. E assim as urnas recebiam
vários votos não oficiais. Após votar, o eleitor entregava a cédula oficial na
casa do “coronel” local – dono do curral. Normalmente ninguém percebia, pois o
furdunço era grande.
Há quem me
narrou ter conseguido driblar o voto de carbono da seguinte forma: conseguia
uma porção de cópias de cédulas (que ficavam espalhadas pelas ruas – aos
montes), adquiria pedaços de carbono e passava o dia visitando as casas de
diferentes “coronéis”, fingindo ter cumprido a ordem, “devolvendo” a cédula com
os nomes de interesse dos dito cujos. “Na porta de um esperto, um esperto e
meio”.
Por mais que
hoje se vejam situações enojantes, naquela época os atrasos eram maiores. Os
“coronéis” reinavam de forma escancarada. Prova maior é essa experiência que vi
“ao vivo e em cores”, em pleno ano de 1992.
A
responsabilidade por tais mudanças está na abertura política ocorrida no Brasil
nos últimos tempos, e o fato de os órgãos receberem dinheiro direto na conta.
Atrelado a isso existe o Portal da Transparência em âmbito federal, estadual e
municipal, o qual permite que qualquer pessoa veja a liberação dos recursos e
acompanhem tudo.
O Ministério
Público tem grande contribuição nessa mudança, pois fiscaliza quando é
provocado pelo povo e dá os rumos convenientes. Desse modo, muitos ladrões são
cassados, processados e, em últimos casos, presos.
Ultimamente é
grande o número de pessoas que passaram a estudar e ler mais, “abrindo suas
mentes”. Essas, têm papel importantíssimo, pois ajudam a formar opinião e dificultam
aos novos coronéis tanger os gigantescos “rebanhos” d’outrora para dentro de
seus currais.
O tempo passou,
surgiu a urna eletrônica e a legislação eleitoral deliberou punições mais
rígidas para a bandidagem que adentra o terreno político. Dificultou mais. Há
registros, em Alagoas de uma forma diferente do “voto de carbono” praticado na
urna eletrônica. A ideia é colocar um papel especial em branco frente à urna
após votar. Uma lâmpada fluorescente irá revelar se o eleitor teria votado ou
não no candidato. Se a imagem do voto computado na urna eletrônica surgir no
papel, o eleitor recebe o dinheiro prometido do candidato. O que caracteriza a
compra do voto.
Ainda existe
compra de voto nas forma tradicionais – obviamente – mas aparentemente menor.
Dia desses soube
que um candidato passeava pelas ruas no dia do pleito, entregando um tipo
diferente de “sanduíche”: eram cédulas de R$ 20,00 envolvidas em “santinhos”.
Sem dúvida,
ainda existem “candidatos” e “lideranças” comprando votos durante os pleitos,
mas não igual ao passado. Eles não têm a mesma cara de pau de antes. Tem muita
gente de olho.
O voto de
carbono continua existindo com roupagem diferente, mas o cerco vem se fechando
aos poucos!
Ainda estamos
longe de ser um país plenamente civilizado, apesar dos avanços positivos em
diversas áreas, mas sigamos mudando, conscientizando, reeducando aqueles que
aprenderam desde os avós a vender o seu voto.
O povo é tão
corrupto quanto aos candidatos desonestos.
A corrupção só
existe onde encontra terreno!
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