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OBS. Todas as imagens aqui postadas dizem respeito a essa reportagem. Não se tratam das igrejas mencionadas no texto. |
Antes de ontem assisti
a uma reportagem sobre roubo em igreja. O fato se deu no Rio de Janeiro. O ladrão é pessoa conhecida naquele espaço, pois costumava decorar o templo, portanto tinha total liberdade para transitar ali sem despertar suspeita. O criminoso é colecionador de
obras de Arte e tem um acervo impressionante (se não fosse tão ladrão).

Ter obras de Arte sacra de 300/400 anos não significa ser ladrão. Os livros contam histórias de homens que, há mais de 100 anos,
empreendiam longas viagens pelas províncias do Brasil comprando oratórios,
santos de madeira (folheados a ouro) e peças sacras dos engenhos falidos e em
decadência.
Esses homens eram justamente colecionadores e comerciantes desse
tipo de obra de Arte. Isso não se resumia aos engenhos e fazendas, mas às casas
da cidade, onde os fazendeiros residiam e mantinham verdadeiros museus sacros.
Esses homens, no caso, eram meramente oportunistas e espertos. Não eram
ladrões. É certo que eles pagavam valores irrisórios, trocavam por outras coisas,
mas, enfim, não havia ilegalidade naquela aquisição. Por mais que nos admiremos com o fato de um colecionador possuir objetos sacros de 200/300 anos ou mais, os mesmos não devem ser vistos como criminosos, mas é necessário os olharmos com reservas, pois, infelizmente, entre os honestos há os ladrões.

Isso explica o porquê de
encontrarmos tantos tesouros em galerias de obras de Arte sacra principalmente
nas capitais brasileiras, até porque os donos morrem, os filhos vendem, trocam,
doam, até jogam no lixo (por ignorância). Dia desses um homem estranhou certa peça numa galeria de arte Sacra. Ele achou muito parecida com uma obra roubada na igreja de determinado estado há mais de 40 anos. Então ele fotografou-a. Na mesma hora recebeu o retorno de um especialista confirmando se tratar da peça roubada. A polícia federal baixou no local instantes depois. Isso acontece eventualmente, pois muitos especialistas visitam essas galerias com tal finalidade.
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Há pouco mais de um ano, vi uma postagen no no Instagran, em que uma figura muito conhecida e respeitada no Rio Grande do Norte mostrou um medalhão com a imagem de Nísia Floresta em bronze. É uma peça no diâmetro de um LP. Ele a adquiriu numa galeria de Arte no Rio de Janeiro. Identifiquei aquela peça no mesmo instante, bastou bater os olhos. Ele, no caso, não cometeu nenhum crime, mas digo com certeza absoluta que é uma peça roubada. Creio que pertencia ao Centro Norte-Rio-Grandense, pois tenho fotografias de uma exposição sobre Nísia Floresta que ocorreu ali em 1954 e esse medalhão está sobre uma mesa envolta por figuras potiguares notáveis, dentre elas o ex-presidente Café Filho. Esse medalhão foi confeccionado na França em 1851. Entrei em contato com a pessoa, expus o fato e o orientei a doá-la ao Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte, mas a pessoa me ignorou. Nunca respondeu.
Excetuando esses
colecionadores e comerciantes de obras de Arte Sacra, o único local que possui
grandes acervos são as igrejas e, infelizmente, é o local preferido de colecionadores
criminosos. Uns pagam para roubarem. Outros vão em pessoa. Há, inclusive,
ladrões de obras de Arte em cemitérios também.

Na década de 70 houve
um furto milionário na Igreja Matriz de São José de Mipibu, cidade da região
metropolitana de Natal. Até hoje, lá pelas bandas do Pantanal, minha mãe guarda
uma carta com o recorte de jornal dando notícia do episódio.
Foram várias
imagens portuguesas do século XVIII, em madeira, folheadas a ouro. Por sorte a
Polícia Federal encontrou as peças muito tempo depois.
O maior acervo de obras
de Arte Sacra no Rio Grande do Norte – na minha opinião – se encontra na Igreja
Matriz de Nossa Senhora do Ó, em Nísia Floresta, município integrante da região
metropolitana de Natal. Há um ostensório em prata pura e um relicário em prata
e ouro puros, imagens portuguesas do século XVIII em madeira folheada a ouro,
um lampadário de 20 kg em prata portuguesas maciça, crucifixos em madeira e
Jesus Crucificado, crucifixos solitários – todos em madeira do século XVIII,
candelabros de bronze, escultura em tamanho natural de Jesus Morto em madeira
do início do século XIX, roupas clericais centenárias com galões de ouro e
prata, toalhas, cálices, bandeiras de procissões da época que o município se
chamava “Papary”, grandes móveis em madeira de lei (cômodas e roupeiros),
livros manuscritos e uma infinidade de pequenos assessórios sacros.
Sabemos que a Igreja
Matriz de Nossa Senhora já sofreu vários furtos (não é segredo para ninguém).
Alguns atribuídos a determinados padres – ditos a boca de siri – e outros
supostamente furtados a pedido de colecionadores. Particularmente, sinto falta
de algumas imagens e peças valiosas e até móvel que conheci em 1992 e que fui
percebendo estarem sumindo ao longo do tempo. “Quem disso usa disso cuida”,
portanto, sem intimidade com aquele templo, pensava que a exposição dessas peças oscilava, de acordo com alguma orientação dos padres, numa espécie de reserva técnica como fazem nos museus. Muito tempo depois
percebi que eu estava tremendamente enganado.
O fato de a igreja
ainda não ter sido tombada nos impede de termos uma lista com todos esses
elementos sacros, portanto só quem conhece a igreja de longas datas sabe sobre
esses furtos. Vale ressaltar que esses furtos não se resumem apenas a obras de
Arte de grande valor, mas até mesmo a peças em gesso (a exemplo do “Anjinho
Deus lhe Pague”), uma peça aparentemente sem valor, mas só aparenta, tendo em
vista que ela e outras que foram furtadas têm valor histórico pelo tempo que
ali estão.
Pois bem, vendo essa
reportagem, me voltei para a Igreja Matriz de Nossa Senhora do Ó, tendo em vista
a dimensão do seu acervo e a falta de um esquema de vigilância eletrônica.
Entendo que lugares
como Nísia Floresta, com um patrimônio dessa monta deve haver uma politica
pública de proteção diferenciada, não por privilégio, mas por dever de
salvaguarda. O verdadeiro privilégio é saber que a Igreja Matriz de Nossa Senhora
do Ó, em Nísia Floresta, é um museu vivo, um elemento singular, inigualável, um
tesouro da História da Arte e da Arquitetura Sacra.
A Prefeitura Municipal de
Nísia Floresta e a Câmara Municipal de Vereadores devem ao povo de Nísia
Floresta a proteção desse tesouro. É hora de criar uma lei com edital para
concurso, providenciando uma guarda especializada pela proteção 24 horas desse
templo. Não se trata de privilégio, pois estamos falando da História do Brasil.
Estamos falando de precaução.
Fica a reflexão e a
sugestão.
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