ADEUS PASTOR “NECO”
Cada pessoa, cada igreja possui sua forma de reverenciar seus mortos. Esses costumes assumem uma dimensão maior quando o morto foi em vida pessoa da mais alta respeitabilidade. A morte das pessoas com tal perfil – por mais que supostamente suas igrejas não entendam dessa forma – não deve passar despercebida quando a história do morto se confunde com a história de um município, justamente por ser essa pessoa parte de um patrimônio.
A pessoa do Sr. “Neco” representa tudo isso.
A morte não pode consistir meramente num enterro sem reflexão quando quem está sendo devolvido à terra é um pedaço da história daquela própria terra.
Não pude estar presente no seu enterro por necessidade extrema, tendo em vista ter sido a data da minha posse enquanto presidente do Conselho do FUNDEB em Parnamirim, e essa data tinha sido postergada a meu pedido, tendo em vista minha esposa ter sido acometida de uma dengue quase hemorrágica, exatamente na mesma época que o Sr. “Neco” também a contraiu.
Mas estive em seu velório e em seu enterro em pensamento, pois recordei-me muito do horário e imaginei o quanto Nísia Floresta sentiu essa morte.
Fiquei pensando sobre a dor que acometeu seus filhos, esposa, netos, parentes e amigos quando viram seu ataúde depositado na terra quente do pequeno espaço que guardará seus restos mortais.
É meio inexplicável jogarmos terra sobre a sabedoria e sepultá-la. É complexo entendermos que enterramos tanto conhecimento, tanta capacidade, tanta história. É estranho nos despedirmos de um baú de riquezas, deixando-o no cemitério, sob a terra, enquanto saímos para a vida. É um choque muito forte. É rompimento que custa-nos aceitar. Em questão de poucos dias uma pessoa tão atuante e dinâmica, mesmo idosa, sai de cena, deixando-nos sem explicação humana.
Sinto tudo isso numa dimensão muito mais forte quando reflito a morte do Sr. “Neco”,homem a qual nutri admiração por sua integridade enquanto cidadão íntegro, pai sábio e cristão autêntico.
Lembro-me quando eu morava no centro, há poucos dias, e assistia diariamente a uma cena que me fazia sentir-se bem. Entre às 04h30 e 05h00 ele chegava de carro, às vezes a pé, estacionava, descia com uma bíblia às mãos, camisa e calça social, ora de sapato, ora de sandália, checava se estava bem posicionado o automóvel defronte a uma espécie de extensão da Igreja Evangélica Assembléia de Deus ao lado da rodoviária. Ele entrava nesse local para rezar, creio que sozinho, em silêncio profundo, ao som apenas de alguns pássaros que despertavam no baobá.
Sinto que ele rezava também para mim, pois sentia que ele pedia a Deus proteção para a humanidade. Eu gostava de ver essa cena, pois reconhecia sua importância.
O Sr. “Neco” foi aquela pessoa que eu gostava da existência. Gostava de saber que ele estava em ação, seja onde quer que estivesse, pois fazia o bem, levava a boa nova, educava, tentava reverter quadros ruins para bons, enfim vivia concretamente sua condição de pastor.
Era homem que reunia por excelência rebanhos e se fazia ouvir com palavras simples, mas significativas. Afirmo com convicção que o Sr. “Neco” foi um pastor na mais pura acepção da palavra.
Foi pastor com P maiúsculo.
Vejo no Sr. “Neco” o homem que deixou um legado cristão, digno de despertar eternamente reverência e inspiração.
Vejo-o como um construtor. Mas um construtor em várias nuanças dessa acepção.
Como cristão reconstruiu a história de muitas pessoas, retirando-as da escuridão da vida pregressa, portanto um construtor da família, um construtor da felicidade.
Enquanto muitos cristãos passam com os vidros dos carros levantados, alheios à miséria humana, ele se comportava diferente, preocupando-se quando via pessoas trilhando caminhos ruins.
Sou testemunha disso, pois o presenciei algumas vezes dando as mãos para pessoas que estavam na sarjeta. Uns não entenderam e se desviaram depois, mas a grande maioria levantou das cinzas para uma vida de amor à Deus, tornando-se cidadãos respeitáveis, úteis à sociedade e cultivadores do que aprenderam com ele.
Ele também inspirou outros construtores do amor à vida e a Deus. Esse foi seu ofício. Trabalho difícil, mas como pastor incansável o vivenciava com amor e abnegação.
O Sr.“Neco” também foi construtor de Igrejas. Comprava terrenos e empreendia verdadeira saga para vê-las em atividade. Lugares onde existiam terrenos baldios e escuros viam surgiam por sua iniciativa templos de luz e amor a Deus, sejam em prédios de arquitetura simples aos de arquitetura mais rebuscada.
Recordo-me há alguns anos, quando faleceu sua primeira esposa. Fui ao enterro acompanhado por Fábio, o qual fazia parte, comigo, da gestão da Escola Municipal Yayá Paiva.
Ele contou-me da doença de sua mãe, das dores violentas que ela sentia e do amor incondicional do Sr. “Neco” pela esposa, a qual debruçava-se horas a fio dando-lhe absoluta assistência sem reclamar da vida, sem criticar pessoas, sem lastimar contra Deus ou qualquer coisa. Mesmo cansado pelas madrugadas sem dormir, dava glória a Deus por tudo. Somente pessoas detentoras de tamanha compreensão das coisas de Deus são capazes de fazer do sofrimento felicidade.
Fábio falou-me da dedicação do Sr. “Neco” aos filhos, dos conselhos, dos exemplos que dava, e desde então fui percebendo a grandiosidade desse homem. Verdadeiro sábio. Retrato do bem. Sinônimo de cristão.
O tempo passou e o Sr. “Neco” casou-se com uma senhora respeitável, séria, chamada D. “Lurdinha”, de família antiga da cidade. Mulher culta, dona de uma história admirável, inclusive rompeu as paredes do preconceito e da injustiça social e tornou-se uma das primeiras mulheres nisiaflorestenses – se não foi a primeira – a estudar em Natal, na UFRN, formando-se em Letras, numa época de dificuldades inimagináveis.
Filha mais velha da admirável D. Yayá, matrona forte e abnegada, que sozinha edificou uma família de pessoas destacadas socialmente.
D. Lurdinha perdeu o pai ainda moça e tornou-se junto com a mãe o alicerce da família, amparando os irmãos menores e ensinando-lhes os ensinamentos deixados pelo pai, reforçados coragem da mãe.
Foi essa mulher que Deus colocou no caminho do Sr. “Neco”, casal unido e amável.
Juntos viajaram para Israel, onde ele próprio me contou das perambulações que fizeram pela terra onde Cristo andou. Foi um sonho realizado. Sonho que aumentou sua fé – se é que posso assim dizer.
Esse casal externava amor, respeito, cumplicidade, simpatia, bondade e envolvimento com as coisas de Deus. A casa onde viviam destoava das demais. Não pela cor ou pelo aspecto arquitetônico, mas pela presença constante de ambos, juntos, enquanto casal dedicado a Deus. Havia uma aura diferente nessa casa. Era a presença constante do Criador.
Hoje esse homem amável deixa-nos sem despedir-se.
Confesso que enquanto pessoa acostumada a pesquisas a história das pessoas, os tipos humanos e seus legados, sinto-me também uma espécie de orfandade, pois sei que Nísia Floresta perdeu um pedaço difícil de ser recomposto, pois ninguém é igual ao outro.
Morre um pai que não sabia que tinha outros filhos.
Morre um pastor que inspirava pessoas sem perceber.
Hoje ele descansa no paraíso dos santos. E aguarda o toque das trombetas para ser arrebatado com todos aqueles que durante a vida respeitaram as coisas de Deus.
Hoje ele descansa no paraíso dos santos. E aguarda o toque das trombetas para ser arrebatado com todos aqueles que durante a vida respeitaram as coisas de Deus.
Hoje, sábado, 5 de maio de 2012, às 20h00, tendo sentido inspiração, deixo essa homenagem ao admirável Pastor “Neco”, o homem que, juntamente com seus irmãos trouxe a Igreja Evangélica Assembléia de Deus para Nísia Floresta há pouco mais de meio século.
Vai-se o homem. Fica a sua história.
História que precisa ser contada e documentada para continuar despertando homens de bem em nossa sociedade.
Em homenagem a esse pastor fiel e leal ofereço-lhe uma linda e antiga música, a qual admiro muito "Eram cem ovelhas".
Obrigado Sr. Neco por sua história.
História linda!
História que jamais morrerá.
Luís Carlos Freire
Mais uma vez quero parabenizas ao Senhor professor Luiz Carlos pelas palavras sobre o nosso querido Pastor Neco um homem maravilhoso o qual tive o prazer de dividir o Altar como sacerdote e aprender com um homem que era uma historia viva no que tange a proclamação do evangelho através da palavra de Deus em Nísia Floresta e região pois era incansável levando a palavra de Deus em varias regiões do nosso Estado através dos Gideões,um verdadeiro desbravador que fara muita falta, mas pra nos Cristãos por um lado ficamos tristes mas ao mesmo tempo felizes por saber que ele esta com o Senhor nosso Deus em um lugar de honra pois combateu o bom combate e guardava a sua Fé com certeza tinha ainda vários planos e objetivos para a Igreja de Nísia Floresta mas como Deus é soberano o recolheu para o descanso dos Justos ,mas seu legado continua e seus sucessores estão ai pregando o evangelho e levando a boa semente como assim fizera o nosso querido e agora saudoso Pr Neco.
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ResponderExcluirObrigada Sr Luis Carlos Freire pelas lindas palavras dirigidas ao meu pai. Mesmo de longe sinto o peso da falta de suas orações ao amanhecer, da fé forte e inabalável, sinto falta das suas conversas ao telefone, ao repetir sempre as mesmas histórias.,, você pai me faz faz falta em tudo todos os dias! Guardarei seus ensinamentos e também os colocarei em prática todos os dias que viver! Te amo!