Imagem: Williams Rocha |
Todo dia é dia de tudo, por isso, ao longo do ano, gasto os meus verbos com homenagens a Nísia Floresta e aos povos indígenas, principalmente, dentre outros assuntos que priorizo sempre. Faço textos que edificam e conscientizam, pois acredito que quem gosta da palavra deve sempre ter a palavra... Ontem, percebendo que outubro dava os últimos suspiros, e é o mês de Nísia Floresta, meu juízo latejou pensamentos de sino, badalando texto como se tivesse domínio sobre o meu cérebro… Eu estava muito cansado mentalmente e não obedeci. Eis que hoje pego do lápis e do papel, e passo a gastar grafite, desenhando o que você lê. Só insisto que não vejam o resultado como garatuja, mas como a homenagem que faltam fazer a Nísia Floresta Brasileira Augusta daqui adiante. Não é nada extraordinário. É respeito. É civilidade...
A situação em que se encontra o monumento em homenagem a Nísia Floresta
(1909) e o túmulo de Nísia Floresta (1955) no Sítio Floresta, é um fato que não
pode ser exaurido pelo incômodo que causam.
A relevância da intelectual Nísia Floresta Brasileira Augusta para o
mundo, exige, por excelência, a garantia de um espaço digno, que contenha
atributos que combinem com o estado de pessoa visionária que ali está. O local,
mesmo simples deve ser um cartão postal, e jamais um local macabro e sem zelo
como se encontra.
O atual estado desses dois
elementos reflete desprezo e desrespeito. Refiro-me às condições em que se
encontram, sufocados por construções de alvenaria, e o silêncio de todos, como
se não enxergassem isso. A impressão que tenho é que há uma intenção de
esconder o túmulo e o monumento. As fotografias antigas revelam que
originalmente havia um espaço maior que separava a cerca (inicialmente de varas
e depois de arame farpado) e túmulo; bastante diferente do que vemos hoje. Cabe
à Prefeitura de Nísia Floresta localizar o documento antigo de doação do
terreno. E reivindicar o que foi avançado, até porque o terreno não foi doação
da família Gondim. A história desse detalhe está no meu blog.
Nísia Floresta deixou de
presente no seu município ter nascido ali. Mas muitos parecem não dar conta
disso. O povo e as autoridades devem tratar esse bem como a mesma modernidade
que ela coroou as suas ideias. Falta uma ação visionária a esse espaço. Uma
cidade tem vereadores, secretários e prefeitos para vigiar e constatar os
fatos, portanto todos viram quando teve início a construção do prédio que hoje
sufoca o túmulo. O prédio não foi colocado ali, mas construído ali.
Houve tempo para as
autoridades negociarem com os donos, com civilidade e respeito, propondo
indenizar os gastos feitos com o alicerce, pedindo que eles construíssem de
maneira a deixar uns cem metros afastado do túmulo, enquanto buscariam
parcerias para levantar o devido valor do terreno, comprando-o, demolindo o
prédio e construindo ali o que se deve. É simples. Não há nada de
extraordinário. Não acredito que alguém seria contra algo tão necessário. Não
se trata de reivindicar a proteção de um curral, mas proteger um espaço genuíno
onde a semente Nísia Floresta nasceu. O local simboliza a memória de uma
pensadora que atrai gente do mundo inteiro. Vale dizer que do outro lado está a
residência da família Paulino, a qual também precisa ser revista com
civilidade.
Confesso que sinto vergonha
quando vejo, principalmente estrangeiros chegando ali. Recordo-me, em 2016,
quando uma professora universitária sueca esteve no local, depois entrou em
contato comigo, por rede social, e indagou horrorizada, questionando se eu
sabia o porquê tratavam o espaço com tanto desprezo. Ela estudou a obra de
Nísia Floresta e veio só conhecer o local. Saiu perplexa. É o que sinto. Quantos
turistas saem dali revoltados sem que nada possam fazer?
As autoridades Rio Grande do
Norte (do passado) são responsáveis por esse imbróglio. Quando ainda existiam
os restos das ruínas da casa onde Nísia Floresta nasceu e viveu até a
pré-adolescência, o Estado deveria ter comprado uma grande área, pois era só
mata. Mas nem comprar, compraram. Ganharam. Foi doação do fazendeiro que, anos
antes, comprou por procuração da mãe de Nísia Floresta.
Foi um vacilo muito grande, e
o mesmo vacilo o Estado repetiu três anos depois, quando Henrique Castriciano
localizou Lívia Augusta de Faria Rocha, filha de Nísia Floresta, na França e,
novamente o Estado teve uma visão medieval sobre o episódio, ignorando a
grandiosidade de Nísia Floresta. Ela já era a Nísia que vimos hoje – renomada –
mas passaram por cima de tudo. Se o Estado tivesse olhado aquele momento como
um ‘achado arqueológico’ (praticamente), teria presenteado o Rio Grande do
Norte com um museu com móveis de Nísia Floresta. Aliás, como roupas,
passaportes, documentos, canetas, cartas, livros, objetos pessoais de todo
tipo, enfim, o que Nísia Floresta deixou.
A vida de Nísia Floresta teve
muitos percalços e obstáculos. A morte também. Começou com a odisseia para
descobrir onde estava o seu túmulo que, graças a Orlando Dantas houve a
localização. Depois veio o traslado com o ataúde confundido com “mercadoria” pela
alfândega. Imbróglio resolvido por Café Filho. Depois veio o velório com o episódio
visionário de Chicuta, que peitou autoridades e pais conservadores para render
homenagens devidas à ilustre defunta em sua escola. Depois, tendo o cortejo se
deslocado ao município berço do nascimento da falecida, não havia túmulo para
repousar o caixão. Não bastasse tudo isso, o município não cumpriu a palavra de
construir o túmulo e sobrou para a Academia. E o percalço atual é o estado
deplorável do monumento e do túmulo.
O povo nisiaflorestense
precisa perceber que o monumento e o túmulo de Nísia Floresta pertencem - em
primeiro lugar a cada nativo - em seguida, ao mundo. Essa consciência continua
em falta. Não adianta apenas meia dúzia de pessoas terem essa consciência, se
boa parte não se compromete com
anecessária profusão. A consciência deve ser ainda maior por parte das
autoridades, pois eles têm o poder nas mãos, eles têm o poder de fazer
milagres, se quiserem. Mas algo é certo: Nísia Floresta deixou uma mina de ouro
ali onde está o seu túmulo e o seu monumento. É só pensar. L.C.F. - 31.10.2021.
EM
2018 ESCREVI A SUGESTÃO ABAIXO E A REPRODUZO AQUI COMO CURIOSIDADE... ESTÁ
VALENDO!
O QUE PODERIA SER CONSTRUÍDO
AO REDOR DO MONUMENTO E DO TÚMULO DE NÍSIA FLORESTA?
Desde que ocorresse a compra
dos terrenos laterais, é possível construir um ambiente de sociabilidade para o
mundo. A primeira ideia é um projeto arquitetônico. O engenheiro faria uma
réplica da casa onde morou Nísia Floresta para abrigar o museu que falaremos
logo abaixo, e que essa construção ficasse em torno de uma réplica do “Jardim
de Luxemburgo”, compatível com o tamanho da área total. Um bom paisagista enriqueceria
o espaço com árvores locais, tipo abricó, gameleira, samaúma, baobá e outras
espécies interessantes, sem esquecer uma alameda matizada com mangueira,
abacateiro, coqueiro, como ela descreveu a sua “Floresta”.
O “Museu de Nísia Floresta”,
diferente de ser “desomenagem”, seria um poema de respeito a ela, um sinal de
agradecimento por ela ter sido luz numa época de escuridão. Ela deixou fogo
para nós, e sua chama arde. O museu ficaria no centro desse complexo, de
maneira que fosse construído uma réplica da casa que existiu ali, onde ela
viveu com os pais e seus irmãos. Nesse espaço deveria estar apenas a sua
família, e jamais quem quis destruí-la gratuitamente (como acontece no “museu”
que existe no centro da cidade), pois assim seria um museu do horror, como se
até nós a desonrássemos.
Penso na reconstituição de um
ambiente antigo, característico ao tempo de Nísia Floresta em termos de
mobiliário, com escrivaninha, biblioteca, sala, quarto num primoroso estudo de
especialistas, de maneira que, conforme o grupo de visitantes passeasse pelos
cômodo - acolhido por pessoas caracterizadas com vestimentas de época - visse
os retratos de Nísia Floresta, fotografias de lugares onde ela andou, réplicas
das capas originais de suas obras expostas sobre os móveis etc. Tudo isso
primorosamente permeado com riquezas de detalhes de época. Como se a casa
estivesse congelada no tempo. A cozinha teria uma réplica original de fogão a
lenha com os mínimos detalhes de uma cozinha.
A sala teria livros antigos
que fizesse desaparecer as paredes, significando que só os livros nos podem nos
elevar aos patamares que elevaram Nísia: “ver adiante do tempo”. No alpendre
estariam pedaços de pedra sabão, destacando-se a réplica da peça que o pai de
Nísia Floresta fez na sacristia da Igreja Matriz de Nossa Senhora do Ó.
Ao lado da casa-museu, haveria
uma edificação moderna, com auditório e salas amplas, de maneira que o
visitante interagisse com Nísia Floresta, assistisse documentários, filmes,
ouvisse o hino em homenagem a Nísia Floresta, conhecesse a letra, dentre outras
músicas e poemas afins, numa proposta de inclusão. Uma sala especial contaria
com hologramas https://olhardigital.com.br/2016/06/10/noticias/cientistas-criam-holograma-em-3d-capaz-de-conversar-com-pessoas/ permitindo
que os visitantes estivessem cara-a-cara com Nísia Floresta, ouvindo-a declamar
parte de seus poemas, frases clássicas e suas principais ideias, além de
dialogarem com ela. Esse espaço reuniria
tudo o que existe até o momento alusivo a Nísia Floresta seja no município ou
fora dele (uma imensa galeria de fotografias dos principais acontecimentos). Ou
seja, seriam dois museus, o da casa (no passado) e o atual.
O local abrigaria uma grande
biblioteca, onde os visitantes teriam acesso a todas as obras de Nísia Floresta
principalmente. Somaria-se ao acervo obras de autores norte-riograndenses (do
passdo e do presente) e franceses, como Auguste Comte, Flaubert, Victor Hugo,
Simone de Benvoir, Jean Paul Sartre, Alexandre Dumas, Exupery e Voltaire. A
biblioteca seria uma obra em parceria com o Governo Francês, cuja ponte seria a
Aliança Francesa.
Ao lado teria-se o Teatro
Municipal de Nísia Floresta com aulas de dramaturgia, cuja história de Nísia
Floresta seria a atração principal, exibida ao longo do mês de outubro, com
ampla divulgação em todo o país (tenha certeza absoluta que essa dramatização
assumiria patamares imprevisíveis, podendo se tornar uma das grandes atrações
do país). O teatro teria um anexo para aulas de dança em parceria com o balé de
Bolshoi (esse detalhe é um processo construído a longo prazo. Santa Catarina
conseguiu uma parceria com Bolshoi devido a muita qualidade; é a única extensão
de Bolshoi em todo o mundo. Por que não em Nísia Floresta?). Esse espaço seria
uma referência.
A área contaria com lojas que
disponibilizassem artesanato e lembrancinhas da cidade, com destaque a
cartões-postais com todos os retratos existentes de Nísia Floresta, dentre
folders com retrato e biografia de Nísia Floresta em português e inglês.
Haveria uma sala com a
reconstituição daquele retrato em que Nísia Floresta aparece de corpo inteiro,
segurando um livro, levemente encostada num pilar clássico. Teria-se disponível
réplicas do vestido e um livro, permitindo que pessoas do sexo feminino o
vestissem e se fizessem se fotografar em reconstituição ao retrato, além de
fazer fotografias em outros ambientes do complexo.
Os “Jardins de Luxemburgo”
teriam muitas esculturas: dos pais e irmãos de Nísia Floresta, além de “Pepé”
(uma espécie de ama, ou babá que Nísia Floresta teve), e de Augusto, o grande
amor da homenageada, além de esculturas de indígenas locais. Numa das alamedas
se perfilariam esculturas dos filósofos e escritores que Nísia Floresta
conheceu na Europa, como Castilho, Alexandre Herculano, Auguste Comte. O
complexo seria emoldurado por um estacionamento arborizado com Pau-Brasil.
O complexo abrigaria também
três réplicas que evocassem o passado, sendo uma casa de farinha nos moldes
originais (conforme tantas que existiram em Papary), um alambique (conforme
tantos que existiram em Papary) e um engenho de cana de açúcar (conforme inúmeros
que existiram em Papary).
O riozinho próximo poderia
garantir a água para uma pequena lagoa artificial que oferecesse curso de
mergulho e fotografias aquáticas para atrair turistas, aulas de natação para
crianças e fisioterapia e lazer para idosos. Esse espaço seria uma alusão à lagoa
Papary, reverenciada por Nísia Floresta. A partir do momento em que se criasse
dispositivos contraditórios dentro desse complexo, com certeza teria-se gente o
ano inteiro ali, considerando, também, que haveria uma política de cunho
turístico, interligada a todos os hotéis e ambientes de gastronomia do estado.
Dia desses eu conversava com
um nisiaflorestense, ocasião em que sugeri que ele apresentasse à Câmara
Municipal de Nísia Floresta um projeto para a construção de um coreto em estilo
francês na praça Coronel José de Araújo, de maneira que abrigasse a instalação
de uma escultura de bronze, em tamanho natural, que poderia ser feita por um
dos mais geniais escultores do mundo, que - pasmem! - é brasileiro, Ique
Woitschach. Uma peça desse tipo permite a interação das pessoas com a
escultura, ou melhor, com Nísia Floresta, pois se faz fotografias como se
estivesse, de fato, com Nísia Floresta. Poderia-se reconstituir aquele famoso
retrato de Nísia Floresta em que ela aparece de pé, segurando um livro. Vejam
um exemplo nesses dois links:
Pois então… o grande começa pequeno. É necessário o início. É necessário parcerias. É necessário lançar as ideias, comungá-las. O que posso, no momento, é oferecer esse projeto e enviá-lo para todas as autoridades mais significativas do Rio Grande do Norte, em caráter de provocação. As pessoas precisam ser provocadas para, depois, se sentar, discutir e colocar as ideias em prática. Nísia Floresta está à altura das coisas visionárias, pois somente nesses conformes as coisas se tornam referenciais. Como se diz… é o pulo do gato. Entenderam a mina de ouro que eu falei? Sou absolutamente contra arrancarem o monumento e o túmulo de Nísia Floresta do local original – como há quem cogite –, pois ali está a semente dela. Ali ela rebentou-se em choro natalício (L.C.F.2018)
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