Nísia Floresta, 20 de agosto de 2009
Exma. Sra. Promotora de Justiça da Comarca de Nísia Floresta
Na condição de cidadão comum, brasileiro, casado, professor, atualmente diretor de escola (em Parnamirim), residente e domiciliado em Nísia Floresta, ao lado da Igreja Matriz, dirijo-me a V. Excia. para denunciar e pedir as providências que forem cabíveis com relação a uma obra que está sendo construída próxima ao nosso município.
Como pode ser constatado, encontra-se em execução às margens da BR 101, exatamente no retorno de acesso aos municípios de São José de Mipibu e Nísia Floresta, uma obra de grande porte com o propósito de dar vazão a resíduos, e provavelmente ao esgoto mipibuense.
Pela dimensão do projeto, nota-se que o volume de esgoto in natura que será jogado no ecossistema da região, precisamente no Rio Mipibu e na Lagoa Papari é de milhares de litros diários. Verifiquei que o projeto, pelo andamento da obra, inexplicavelmente não contempla uma estação de tratamento de esgoto – prática inconcebível nos dias atuais a uma obra de tamanho porte –, considerando que diante de tantos problemas ambientais em nível mundial, tenta se criar – em massa – a cultura das idéias inovadoras – e mesmo visionárias – em prol da preservação do meio ambiente.
O mundo inteiro fala em preservação. Os países de Primeiro Mundo – que já destruíram quase tudo o que tinham – tratam suas reservas como verdadeiros santuários. Todos falam em ecologia, mas precisamos praticar tal política. Não é por que estamos no Terceiro Mundo – e no Nordeste – áreas injustamente discriminadas por muitos – que devemos ficar em silêncio.
O que preocupa é que esse resíduo será despejado num rio cujas águas, há séculos abastecem toda população de São José de Mipibu. O referido rio desemboca na Lagoa Papary, em Nísia Floresta, que por sua vez se encontra com as águas do Oceano Atlântico, através da Praia de Camurupim.
O que me entristece – e deve entristecer aos mipibuenses e nisiaflorestenses – é saber que uma catástrofe ambiental se instala mansa e “imperceptivelmente”, no ecossistema de São José de Mipibu e, PRINCIPALMENTE EM NÍSIA FLORESTA, pois a lendária lagoa Papary, d’antes Paraguaçu, amplo reservatório das águas do Trairí, berço das águas oriundas do inverno sertanejo, onde pequenos riachos correm dos tabuleiros arenosos, dando origem a uma imensidão de águas que se interligam com outras lagoas e rios, como o velho Cururu – está prestes a receber esgoto de toda a cidade de São José de Mipibu.
A Lagoa Papari, destacada há quase trezentos anos na cartografia de Marc Grave, elogiada por Henry Koster, em 1810, tendo a comparado ao Mercado de Billingsgate, na Inglaterra por suas águas piscosas; cantada em prosa e verso por autor anônimo que lhe dedicou bela poesia centenária, evocando a lenda de Jacy e Guaracy; citada por inúmeros viajantes europeus em documentos antiqüíssimos –, hoje caminha para uma possível condenação a morte. Exatamente a lagoa mais famosa do município e que durante séculos alimentou índios e brancos, o fazendo até os dias atuais a tantos nativos que precisam de sua pureza para sobreviver.
Sabemos que essa lagoa vem sofrendo sucessivos danos ambientais decorrentes do assoreamento, desde a cheia de 1974, e hoje é sacrificada por inúmeros viveiros que a circundam quase completamente, recebendo diariamente os produtos químicos utilizados como ração e manuseio de equipamentos.
É graças a essa lagoa que o município de Nísia Floresta recebe a alcunha de “terra do camarão”, permitindo-lhe ser conhecida internacionalmente por sua gastronomia.
Lagoa “Mãe dos Pobres” deveria ser mais uma alcunha, pois é dela que, apesar da diminuição de sua fauna aquática, centenas de nativos – muitos deles pobres de Jó – tiram o seu sustento.
É graças à lagoa Papary que ainda assistimos a um cenário antiqüíssimo, no qual famílias inteiras desfilam pelas ruas da velha cidade, levando covos (paris), puçás, cestos, choques, landuás e varas de pesca, os quais passam o dia em suas mansas águas, ora em canoas, ora nos mangues marginais, à cata do pão-de-cada-dia.
O vocábulo indígena “papary” é traduzido por Nestor dos Santos Lima como “salto de peixe”. É graças a esse mar de água doce que ainda não vimos pelas ruas nisiaflorestenses o vulto da mendicância nem ouvimos o ronco da fome.
É graças à lagoa Papary que, aos primeiros raios de sol, nativos embarcam rumo a Natal, percorrendo ruas, gritando “olha o camarão!” “olha o caranguejo!” “olha o goiamum!”. E assim, com orgulho, conservam a tradição e a certeza de que voltarão para Nísia Floresta com o dinheiro da “feira”.
É nesse “Lago Ness” que, há quase duzentos anos, quando a própria natureza o fazia distar a poucos metros do Sítio Floresta, se banhava, não o monstro-bicho, mas o monstro sagrado, chamado Nísia Floresta Brasileira Augusta, o qual, apesar de tanta divulgação em torno de sua memória, as águas de seu espírito político/visionário ainda não umedeceram a secura insensível de alguns nativos, os quais “olham mas não vêem”
O município de Nísia Floresta assiste, em silêncio, a construção dessa obra que dá sinais claros de ser um imenso sistema de esgoto, como se nada os incomodasse. As Secretarias Municipais de Educação e Cultura, de Saúde e de Turismo e Meio Ambiente (dos municípios de Nísia Floresta e São José de Mipibu) pelo menos até o momento – já muito adiantado – não têm desenvolvido nenhuma política de reflexão e conscientização. Não se vê panfletos. Não se vê artigos ou reportagens em jornais, enfim não há reação.
Nenhuma outra Secretaria, além das aqui referidas, tem mais autoridade para conscientizar a população quanto a esse problema. As mesmas, dentro das suas responsabilidades, deveriam estar orientando as escolas e o povo a pensar os danos que estão por vir – e que ainda podem ser evitados –, deliberando até mesmo uma movimentação pública, organizada de forma sensata e respeitosa, mas forte e sistematizada.
As próprias escolas, nas quais circulam professores (filhos ou netos de pescadores), funcionários e alunos (filhos ou netos de pescadores), por representar um ambiente pensante, deveria, por excelência, estar trabalhando o assunto (inclusive com aulas de campo). Para que isso aconteça não é necessário provocação, até porque a obra, por si, provoca (e como!).
É interessante uma caminhada ecológica – em massa – do centro de Nísia Floresta ao local da obra, com convidados ao estilo de IDEMA, IBAMA, FLONA e DENIT. As autoridades ligadas ao turismo, às obras públicas, à educação e mesmo a edilidade que nos representa, que deveriam se unir e convocar os responsáveis pela execução das obras, através de uma conferência ou reunião aberta à população, estão silenciadas.
É preocupante saber que essa inércia, que soa como permissividade, está proporcionando a continuação da construção dessa serpente oca, a qual desliza silenciosa, prestes a jogar seu veneno letal em nossos rios e lagoas. Faz-se necessária uma provocação dos órgãos públicos, pois sem ela não haverá intervenção.
Compreendo que uma andorinha só não faz verão. Mas o pensamento externado neste documento é o pensamento de muitos nativos – com certeza –; o que ocorre é que, com exceção àqueles que se silenciam por razões desconhecidas, há quem se silencie por uma espécie de ignorância ingênua, oriunda da idéia de que os “saltos dos peixes” serão eternos.
É inadmissível que uma obra desse porte, que está em execução em decorrência de uma obra federal – incorra a tamanho absurdo.
É incompreensível que o próprio DNIT, que tem como objetivo estudar os impactos ambientais das suas obras não perceba isso. É estranho que uma obra relacionada a uma obra federal, oriunda de um governo que tem dado uma dimensão exemplar no que se refere a campanhas de preservação do meio ambiente, incorra à falta tão grave –, até porque se trata de um projeto incompleto, pois como é que engenheiros federais, conhecedores da hidrografia e dos relevos contemplados pela BR 101, ignorem o grau de toxidade, a gigantesca quantidade de resíduos, a necessidade de uma estação de tratamento e o destino que esse material tomará.
Como pode aos engenheiros do DNIT ignorarem que estão ligados direta ou indiretamente, a uma obra que destinará, de forma irresponsável, esgoto numa ÁREA DE PROTEÇÃO AMBIENTAL (APA BONFIM/GUARAÍRAS).
Como pode aos engenheiros responsáveis por tamanho projeto, os quais estudam e pesquisam as mais modernas possibilidades de harmonizar obra e meio ambiente –, dentro de uma proposta ecológica – “esquecerem” da toxidade dos dejetos que correrão por tais galerias, rumo a um ecossistema de MATA ATLÂNTICA?
Como pode às autoridades dos Governos Municipal, Estadual e Federal – no caso os realmente responsáveis – no momento que autorizaram os primeiros rascunhos da duplicação da BR-101, ignorar aspectos geográficos sagrados – como a APA e a MATA ATLÂNTICA – integrantes do itinerário da rodovia, aos quais deveria ser reservada atenção especial?
Como pode estar acontecendo tamanha barbaridade dentro de um município que abriga a FLONA (berço de fauna e flora ameaçados de extinção) e uma extensão do IBAMA?
Como pode, numa época em que todos falam sobre a preservação das nascentes e dos recursos naturais – a questão da falta de água no futuro, o Governo Federal ou quem quer que seja, permitirem a construção de uma obra que despejará todo tipo de resíduos sobre um dos maiores aquíferos de toda essa região, onde se incluem 26 lagoas? Vale ressaltar que o lençol freático em Nísia Floresta é extremamente raso. Há lugares que aflora água há menos de um metro de profundidade.
A continuação dessa obra, da forma como está sendo desenvolvida – significará a morte de um patrimônio material e imaterial incalculável. Além da destruição criminosa de todo esse conjunto natural – que por si basta –, se extinguirão múltiplas faces da cultura de um povo, impressas em usos, costumes tradições, lazer, enfim na essência de uma história cheia de estórias.
É conveniente que os responsáveis revejam o projeto (ou até mesmo se certifique de forma mais detalhada das conseqüências da obra), pois, pelo que se percebe, não houve estudos para efetivar a avaliação de impactos ambientais, que é um dos instrumentos da Política Nacional do Meio Ambiente. Sabe-se que o Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA) tem por dever elaborar um estudo para licenciamento de atividades modificadoras do meio ambiente, acompanhado pelo IDEMA e IBAMA. Mas, a julgar pelo que se vê, esse estudo não foi feito.
É muito mais barato construir uma estação de tratamento de esgoto que gastar, futuramente, milhões de reais com assistência às inúmeras famílias de pescadores vitimas dos danos ambientais. Sem contar comas doenças que advirão, decorrentes da imundície que tomará conta do que antes era vegetação e da savanização, pois as conseqüências serão irreparáveis.
Diante de tais reflexões, peço a V. Excia, em nome da população de São José de Mipibu e de Nísia Floresta a gentileza de intervir nesse projeto criminoso, convocando os responsáveis e as demais instituições governamentais ligadas ao mesmo. Inclusive solicitando-lhes esclarecimentos públicos junto à população, a qual PEDE A CONSTRUÇÃO DE UMA ESTAÇÃO DE TRATAMENTO ou algo similar.
Na oportunidade, informo a V. Excia. que o presente documento também foi enviado, em caráter de informação e denúncia, ao MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE, ao IDEMA/Natal, ao IBAMA/Natal, às DRAS. GILKA DA MATA E ROSSANA SUDÁRIO – PROMOTORA DO MEIO AMBIENTE e a alguns órgãos ligados ao assunto, em nível estadual.
Na certeza da atenção de V. Excia externo os meus agradecimentos.
Respeitosamente,
Luís Carlos Freire
Professor
Identidade Nº 482.107-SSP/MS
Exma. Sra. Promotora de Justiça da Comarca de Nísia Floresta
Na condição de cidadão comum, brasileiro, casado, professor, atualmente diretor de escola (em Parnamirim), residente e domiciliado em Nísia Floresta, ao lado da Igreja Matriz, dirijo-me a V. Excia. para denunciar e pedir as providências que forem cabíveis com relação a uma obra que está sendo construída próxima ao nosso município.
Como pode ser constatado, encontra-se em execução às margens da BR 101, exatamente no retorno de acesso aos municípios de São José de Mipibu e Nísia Floresta, uma obra de grande porte com o propósito de dar vazão a resíduos, e provavelmente ao esgoto mipibuense.
Pela dimensão do projeto, nota-se que o volume de esgoto in natura que será jogado no ecossistema da região, precisamente no Rio Mipibu e na Lagoa Papari é de milhares de litros diários. Verifiquei que o projeto, pelo andamento da obra, inexplicavelmente não contempla uma estação de tratamento de esgoto – prática inconcebível nos dias atuais a uma obra de tamanho porte –, considerando que diante de tantos problemas ambientais em nível mundial, tenta se criar – em massa – a cultura das idéias inovadoras – e mesmo visionárias – em prol da preservação do meio ambiente.
O mundo inteiro fala em preservação. Os países de Primeiro Mundo – que já destruíram quase tudo o que tinham – tratam suas reservas como verdadeiros santuários. Todos falam em ecologia, mas precisamos praticar tal política. Não é por que estamos no Terceiro Mundo – e no Nordeste – áreas injustamente discriminadas por muitos – que devemos ficar em silêncio.
O que preocupa é que esse resíduo será despejado num rio cujas águas, há séculos abastecem toda população de São José de Mipibu. O referido rio desemboca na Lagoa Papary, em Nísia Floresta, que por sua vez se encontra com as águas do Oceano Atlântico, através da Praia de Camurupim.
O que me entristece – e deve entristecer aos mipibuenses e nisiaflorestenses – é saber que uma catástrofe ambiental se instala mansa e “imperceptivelmente”, no ecossistema de São José de Mipibu e, PRINCIPALMENTE EM NÍSIA FLORESTA, pois a lendária lagoa Papary, d’antes Paraguaçu, amplo reservatório das águas do Trairí, berço das águas oriundas do inverno sertanejo, onde pequenos riachos correm dos tabuleiros arenosos, dando origem a uma imensidão de águas que se interligam com outras lagoas e rios, como o velho Cururu – está prestes a receber esgoto de toda a cidade de São José de Mipibu.
A Lagoa Papari, destacada há quase trezentos anos na cartografia de Marc Grave, elogiada por Henry Koster, em 1810, tendo a comparado ao Mercado de Billingsgate, na Inglaterra por suas águas piscosas; cantada em prosa e verso por autor anônimo que lhe dedicou bela poesia centenária, evocando a lenda de Jacy e Guaracy; citada por inúmeros viajantes europeus em documentos antiqüíssimos –, hoje caminha para uma possível condenação a morte. Exatamente a lagoa mais famosa do município e que durante séculos alimentou índios e brancos, o fazendo até os dias atuais a tantos nativos que precisam de sua pureza para sobreviver.
Sabemos que essa lagoa vem sofrendo sucessivos danos ambientais decorrentes do assoreamento, desde a cheia de 1974, e hoje é sacrificada por inúmeros viveiros que a circundam quase completamente, recebendo diariamente os produtos químicos utilizados como ração e manuseio de equipamentos.
É graças a essa lagoa que o município de Nísia Floresta recebe a alcunha de “terra do camarão”, permitindo-lhe ser conhecida internacionalmente por sua gastronomia.
Lagoa “Mãe dos Pobres” deveria ser mais uma alcunha, pois é dela que, apesar da diminuição de sua fauna aquática, centenas de nativos – muitos deles pobres de Jó – tiram o seu sustento.
É graças à lagoa Papary que ainda assistimos a um cenário antiqüíssimo, no qual famílias inteiras desfilam pelas ruas da velha cidade, levando covos (paris), puçás, cestos, choques, landuás e varas de pesca, os quais passam o dia em suas mansas águas, ora em canoas, ora nos mangues marginais, à cata do pão-de-cada-dia.
O vocábulo indígena “papary” é traduzido por Nestor dos Santos Lima como “salto de peixe”. É graças a esse mar de água doce que ainda não vimos pelas ruas nisiaflorestenses o vulto da mendicância nem ouvimos o ronco da fome.
É graças à lagoa Papary que, aos primeiros raios de sol, nativos embarcam rumo a Natal, percorrendo ruas, gritando “olha o camarão!” “olha o caranguejo!” “olha o goiamum!”. E assim, com orgulho, conservam a tradição e a certeza de que voltarão para Nísia Floresta com o dinheiro da “feira”.
É nesse “Lago Ness” que, há quase duzentos anos, quando a própria natureza o fazia distar a poucos metros do Sítio Floresta, se banhava, não o monstro-bicho, mas o monstro sagrado, chamado Nísia Floresta Brasileira Augusta, o qual, apesar de tanta divulgação em torno de sua memória, as águas de seu espírito político/visionário ainda não umedeceram a secura insensível de alguns nativos, os quais “olham mas não vêem”
O município de Nísia Floresta assiste, em silêncio, a construção dessa obra que dá sinais claros de ser um imenso sistema de esgoto, como se nada os incomodasse. As Secretarias Municipais de Educação e Cultura, de Saúde e de Turismo e Meio Ambiente (dos municípios de Nísia Floresta e São José de Mipibu) pelo menos até o momento – já muito adiantado – não têm desenvolvido nenhuma política de reflexão e conscientização. Não se vê panfletos. Não se vê artigos ou reportagens em jornais, enfim não há reação.
Nenhuma outra Secretaria, além das aqui referidas, tem mais autoridade para conscientizar a população quanto a esse problema. As mesmas, dentro das suas responsabilidades, deveriam estar orientando as escolas e o povo a pensar os danos que estão por vir – e que ainda podem ser evitados –, deliberando até mesmo uma movimentação pública, organizada de forma sensata e respeitosa, mas forte e sistematizada.
As próprias escolas, nas quais circulam professores (filhos ou netos de pescadores), funcionários e alunos (filhos ou netos de pescadores), por representar um ambiente pensante, deveria, por excelência, estar trabalhando o assunto (inclusive com aulas de campo). Para que isso aconteça não é necessário provocação, até porque a obra, por si, provoca (e como!).
É interessante uma caminhada ecológica – em massa – do centro de Nísia Floresta ao local da obra, com convidados ao estilo de IDEMA, IBAMA, FLONA e DENIT. As autoridades ligadas ao turismo, às obras públicas, à educação e mesmo a edilidade que nos representa, que deveriam se unir e convocar os responsáveis pela execução das obras, através de uma conferência ou reunião aberta à população, estão silenciadas.
É preocupante saber que essa inércia, que soa como permissividade, está proporcionando a continuação da construção dessa serpente oca, a qual desliza silenciosa, prestes a jogar seu veneno letal em nossos rios e lagoas. Faz-se necessária uma provocação dos órgãos públicos, pois sem ela não haverá intervenção.
Compreendo que uma andorinha só não faz verão. Mas o pensamento externado neste documento é o pensamento de muitos nativos – com certeza –; o que ocorre é que, com exceção àqueles que se silenciam por razões desconhecidas, há quem se silencie por uma espécie de ignorância ingênua, oriunda da idéia de que os “saltos dos peixes” serão eternos.
É inadmissível que uma obra desse porte, que está em execução em decorrência de uma obra federal – incorra a tamanho absurdo.
É incompreensível que o próprio DNIT, que tem como objetivo estudar os impactos ambientais das suas obras não perceba isso. É estranho que uma obra relacionada a uma obra federal, oriunda de um governo que tem dado uma dimensão exemplar no que se refere a campanhas de preservação do meio ambiente, incorra à falta tão grave –, até porque se trata de um projeto incompleto, pois como é que engenheiros federais, conhecedores da hidrografia e dos relevos contemplados pela BR 101, ignorem o grau de toxidade, a gigantesca quantidade de resíduos, a necessidade de uma estação de tratamento e o destino que esse material tomará.
Como pode aos engenheiros do DNIT ignorarem que estão ligados direta ou indiretamente, a uma obra que destinará, de forma irresponsável, esgoto numa ÁREA DE PROTEÇÃO AMBIENTAL (APA BONFIM/GUARAÍRAS).
Como pode aos engenheiros responsáveis por tamanho projeto, os quais estudam e pesquisam as mais modernas possibilidades de harmonizar obra e meio ambiente –, dentro de uma proposta ecológica – “esquecerem” da toxidade dos dejetos que correrão por tais galerias, rumo a um ecossistema de MATA ATLÂNTICA?
Como pode às autoridades dos Governos Municipal, Estadual e Federal – no caso os realmente responsáveis – no momento que autorizaram os primeiros rascunhos da duplicação da BR-101, ignorar aspectos geográficos sagrados – como a APA e a MATA ATLÂNTICA – integrantes do itinerário da rodovia, aos quais deveria ser reservada atenção especial?
Como pode estar acontecendo tamanha barbaridade dentro de um município que abriga a FLONA (berço de fauna e flora ameaçados de extinção) e uma extensão do IBAMA?
Como pode, numa época em que todos falam sobre a preservação das nascentes e dos recursos naturais – a questão da falta de água no futuro, o Governo Federal ou quem quer que seja, permitirem a construção de uma obra que despejará todo tipo de resíduos sobre um dos maiores aquíferos de toda essa região, onde se incluem 26 lagoas? Vale ressaltar que o lençol freático em Nísia Floresta é extremamente raso. Há lugares que aflora água há menos de um metro de profundidade.
A continuação dessa obra, da forma como está sendo desenvolvida – significará a morte de um patrimônio material e imaterial incalculável. Além da destruição criminosa de todo esse conjunto natural – que por si basta –, se extinguirão múltiplas faces da cultura de um povo, impressas em usos, costumes tradições, lazer, enfim na essência de uma história cheia de estórias.
É conveniente que os responsáveis revejam o projeto (ou até mesmo se certifique de forma mais detalhada das conseqüências da obra), pois, pelo que se percebe, não houve estudos para efetivar a avaliação de impactos ambientais, que é um dos instrumentos da Política Nacional do Meio Ambiente. Sabe-se que o Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA) tem por dever elaborar um estudo para licenciamento de atividades modificadoras do meio ambiente, acompanhado pelo IDEMA e IBAMA. Mas, a julgar pelo que se vê, esse estudo não foi feito.
É muito mais barato construir uma estação de tratamento de esgoto que gastar, futuramente, milhões de reais com assistência às inúmeras famílias de pescadores vitimas dos danos ambientais. Sem contar comas doenças que advirão, decorrentes da imundície que tomará conta do que antes era vegetação e da savanização, pois as conseqüências serão irreparáveis.
Diante de tais reflexões, peço a V. Excia, em nome da população de São José de Mipibu e de Nísia Floresta a gentileza de intervir nesse projeto criminoso, convocando os responsáveis e as demais instituições governamentais ligadas ao mesmo. Inclusive solicitando-lhes esclarecimentos públicos junto à população, a qual PEDE A CONSTRUÇÃO DE UMA ESTAÇÃO DE TRATAMENTO ou algo similar.
Na oportunidade, informo a V. Excia. que o presente documento também foi enviado, em caráter de informação e denúncia, ao MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE, ao IDEMA/Natal, ao IBAMA/Natal, às DRAS. GILKA DA MATA E ROSSANA SUDÁRIO – PROMOTORA DO MEIO AMBIENTE e a alguns órgãos ligados ao assunto, em nível estadual.
Na certeza da atenção de V. Excia externo os meus agradecimentos.
Respeitosamente,
Luís Carlos Freire
Professor
Identidade Nº 482.107-SSP/MS
Nenhum comentário:
Postar um comentário